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Música

O TEU CABELO NÃO NEGA

Hino nacional do Carnaval brasileiro teve um “sambinha” na Justiça do Rio de Janeiro

Gustavo Mariani

12/02/2024 14h22

Não havia ninguém mais “bola murcha”, no janeiro do Rio de Janeiro de 1932, do que Francisco Alves, o cantor mais popular do Brasil. Culpa dele mesmo, que recusara gravar uma marchinha – O teu cabelo não nega – lhe oferecida por Lamartine Babo, preferindo uma outra – Marchinha de Amor – que não foi amada por ninguém.

Já que o Chico não botava fé na composição, o Lalá (como amigos o apelidavam), Lamartine propôs aos comediantes Castro Barbosa e Jonjoca grava-la. Os caras toparam e o Lalá falou com Pixinguinha, que levou para estúdio uma galera de velhos amigos que ele mesmo conduziu na gravação – Luís Americano e Sousa Aragão (saxofones); Bonfliglio de Oliveira (piston); Donga (banjo); Vantuil de Carvalho (trombone); João Martins (contrabaixo) e Elezar de Carvalho (tuba). Além destes, o Lalá formou um coro que reuniu, ainda, ele, a sua amiga Carmem Miranda, Murilo Caldas e o Jonjoca.

Amigo de diretores futebolísticos cariocas, Lamartine Babo conseguiu, com o Fluminense, autorização para lançar a marchinha em um dos bailes do clube, por aqueles dias em que se aproximava a o Carnaval. Chutou pra fora. Os refinados sócios do Flu, indignados com a presença na casa de 18 músicos, alguns negros, se retiraram.
Quando janeiro terminava, Carmem Miranda fazia show no Teatro Eldorado e deu uma forcinha pro seu amigo Lalá. Cantou a marchinha dele, que incendiou a Cidade Maravilhosa. Saída dali, “O teu cabelo não nega” tornou-se uma espécie de hino nacional do Carnaval. Era tocada e cantada onde houvesse Brasil. Quando o “Carná” chegou, no entanto, só quem se deu mal foi o Lalá.

O sucesso de “O teu cabelo não nega” rolava pelo país inteiro, não deixava ninguém sentado em um salão de festas. Em Recife, quando ouviram, os irmãos João e Raul Valença se espantaram. Foram à imprensa e garantiram que aquela marcha era deles e se chamava “Mulata”. Quem iria dar ouvidos a ele, se Lamartine Babo, que aparecia como autor era famoso, por dezenas de composições que todos os brasileiros haviam cantado? Mas eles resolveram encarar e o escândalo estourou no Rio de Janeiro. Como o Lalá poderia fazer aquilo? Era inacreditável – nem tanto!

Sujeito sempre duro, sem dinheiro, Lamartine Babo trabalhava para a gravadora Victor, que recebia centenas de letras para apreciação, e mandava-lhe arrumar a letra das que tivesse bom nível, pudessem ser gravadas. Ele gostou de “Mulata”, que tinha apelo totalmente popularzão pernambucano, e fez uma outra letra, a que começa com o que todos ainda hoje cantam – O teu cabelo não nega, mulata/Porque és mulata na cor/ Mas como a cor não pega mulata/Mulata eu quero o teu amor. No original dos irmãos nordestinos, os versos começavam com: Nestas terras do Brasil, aqui/Não precisa mais prantá, qui dá/Feijão muito doutô e giribita/ Muita mulata bonita.

Os irmãos Valença foram á Justiça e pediram có-autoria da marcha. Enquanto o barato rolava no barraco da “Dona Justa”, a “mulata” conquistava popularidade avassaladora. O Lalá que ficara sendo “o cara” dela, é o mesmo que compôs todos os hinos que a torcida carioca canta hoje em estádios lotados por milhares de torcedores. Não precisava chutar “bola fora”, Lalá! Como o seu amigo Chico Alves.

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