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Exposições

Má conservação ameaça obras de Brecheret e Di Cavalcanti em São Paulo

O mural feito por Di Cavalcanti no térreo do edifício Triângulo, no centro de São Paulo, está deteriorado

FolhaPress

18/01/2023 8h58

Foto: Reprodução

Matheus Rocha
São Paulo – SP

Nas sedes dos Três Poderes, as obras de Victor Brecheret e Di Cavalcanti foram danificadas por golpistas, mas nas ruas de São Paulo é a falta de conservação que ameaça o legado de dois dos principais representantes do modernismo brasileiro.

O mural feito por Di Cavalcanti no térreo do edifício Triângulo, no centro de São Paulo, está deteriorado. A obra tem manchas de oxidação, faltam pastilhas nos mosaicos e há remendos que descaracterizam o desenho original.

Nos anos 1990, uma fogueira montada por pessoas em situação de rua atingiu a obra, motivo pelo qual pastilhas de vidro precisaram ser trocadas por peças de cerâmica. O mosaico retrata o cotidiano de operários, tema caro a Di Cavalcanti.

“A temática da maioria dessas obras é o trabalhador. A ideia dele era construir um tipo de arte que fosse acessível ao grande público e, ao mesmo tempo, tivesse relevância social e artística”, diz Marcelo Bortoloti, autor de uma biografia sobre o pintor que será lançada ainda neste ano pela Companhia das Letras.

Bortoloti diz que Di Cavalcanti começou a produzir murais a partir dos anos 1950 por influência dos muralistas mexicanos, como Diego Rivera. A ideia desse grupo de artistas era fazer uma arte que não estivesse restrita aos museus, mas que pudesse ser apreciada pela população em geral.

De acordo com o especialista, a falta de conservação atenta contra o caráter democrático das obras de Di Cavalcanti.

“Trabalhos em locais públicos são voltados ao povo. Esse aspecto popular acaba se perdendo por causa da falta de manutenção, o que é um prejuízo grave”, diz Bortoloti.

Sandra Brecheret faz coro a essa opinião. Filha do escultor Victor Brecheret, ela diz que as obras públicas de seu pai são uma herança que ele deixou à população.

“Essas obras não são da prefeitura. Elas são do povo brasileiro. Me sinto muito decepcionada ao perceber que as autoridades não fazem nada para preservar um patrimônio valioso desses,” diz ela, que é presidente da Fundação Escultor Victor Brecheret.

A maior preocupação dela é a obra “Depois do Banho”, que foi instalada no largo do Arouche. no centro paulistano, durante o governo do prefeito Prestes Maia, na virada da década de 1930 para os anos 1940. O temor da herdeira de Brecheret não é injustificado.

A escultura está cercada por fezes humanas e por roupas abandonadas. Na base que sustenta a obra, é possível ver manchas de urina. Os problemas, porém, não param por aí.

Ao lado da escultura, havia quatro bustos. No entanto, eles foram roubados e só restou o pedestal sobre o qual eles foram instalados. Funcionários de uma floricultura que fica em frente aos monumentos dizem que o policiamento na região é escasso durante a noite, o que facilita a ação de criminosos.

Sandra Brecheret diz, inclusive, que essa floricultura é um dos motivos pelos quais a peça ainda está de pé. “A loja fecha muito tarde, por isso a peça não foi furtada. Mas, se deixar, ela não dura uma semana e é roubada para ser vendida como uma bola de bronze.”

A mesma sorte não teve uma escultura das três graças, peça que foi furtada do cemitério da Consolação. “Eu havia falado para os proprietários preservarem a peça, mas não quiseram. O Brecheret não existe mais. Venderam, e outras obras vão se perder se deixarem.”

A cruzada de Sandra Brecheret contra a falta de cuidado com as obras de seu pai não é recente. Em 2016, ela acionou o Ministério Público de São Paulo para pedir que o monumento às Bandeiras fosse preservado. A obra é um dos símbolos de São Paulo e está localizada nos arredores do parque Ibirapuera. À época, a escultura havia sido pichada com tinta colorida. Depois do incidente, ela diz que a conservação da obra melhorou.

“É o único monumento público dele que está preservado, porque é uma obra muito popular. Aí pega mal”, diz ela. “Mas as outras viraram mictório da população em situação de rua.”

Em nota, a Secretaria Municipal de Cultura diz que realiza periodicamente a limpeza de todas as obras em espaços públicos da cidade.

A pasta diz que a escultura “Depois do Banho” é uma prioridade do Adote uma Obra Artística, iniciativa que estabelece parceria com pessoas físicas ou jurídicas para preservar obras de arte. No entanto, segundo a secretaria, não houve interessados.


Em relação ao mosaico feito por Di Cavalcanti no edifício Triângulo, a pasta diz que a obra está fora da jurisdição da prefeitura por integrar uma área privada. “Contudo, por ser um edifício tombado, há uma responsabilidade dos proprietários de preservarem o mosaico da fachada.”

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