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Brasília

Fercal, o berço da vida no DF

Região pode apresentar vestígios de animais que teriam vivido no local há milhões de anos

Redação Jornal de Brasília

23/02/2022 10h39

Gabriel de Sousa
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Com a fundação datada de 1956, a Região Administrativa da Fercal teve papel fundamental na construção de Brasília. Naquele período, a riqueza mineral da região possibilitou que se instalasse ali uma mineradora que forneceria calcário, matéria-prima para a empreitada de se erguer a capital federal no coração do Brasil. A Fertilizantes Calcários (Fercal) acabou por dar nome à pequena vila que surgia ao seu redor.

Outro marco importante em sua história foi seu desmembramento de Sobradinho II, em 2012. A data faz com que muitos considerem a RA uma das mais novas do Distrito Federal. Porém, foi lá que, há cerca de um bilhão de anos, surgiram os registros mais antigos de vida que temos no Planalto Central.

Fósseis

O que poucos sabem, no entanto, é que o calcário que deu nome à cidade possui um valor histórico muito mais abrangente do que os prédios que o minério permitiu edificar no centro do poder. Afinal, a sua riqueza não reside apenas no uso em edificações, mas também no fato de que o minério foi “carimbado” com vestígio da vida que existia por aqui há milhares de anos. É o que nos conta o professor de paleontologia Henrique Zimmermann. Ao longo da sua carreira, ele levou vários estudantes para conhecer os fósseis nas rochas da Fercal. “Um professor me trouxe para cá para conhecer, e depois eu vim trazendo meus alunos para verem um fóssil bem perto de onde eles moram”, afirma.

Zimmermann levou a equipe de reportagem do Jornal de Brasília para a uma pequena expedição na localidade do Catingueiro, a 20 quilômetros do centro da Fercal e a 50 do centro do Plano Piloto. O acesso ao local é possível apenas por uma estrada de terra.

Os fósseis são os chamados estromatólitos, e foram formados por colônias de cianobactérias que viveram há cerca de 1 bilhão e 50 milhões de anos, quando o Distrito Federal era o fundo de um grande oceano. Hoje, estas bactérias repousam no calcário das rochas da Fercal. “Muita gente passa todo dia por essas rochas e nem sabem que essas pequenas linhas são na verdade fósseis criados por seres muito antigos”, conta o especialista.

Como mostrado na edição de terça, na nossa série de reportagens, as cianobactérias são produtoras de oxigênio e, quando esses seres surgiram no Distrito Federal, foram autores de uma grande mudança nas características biológicas do planeta. Graças a elas, a nossa atmosfera se tornou apta para a nossa respiração, e possibilitou, milhões de anos depois, o surgimento dos primeiros seres humanos que habitariam o DF.

Projetos

Segundo Henrique Zimmermann, seria importante o governo local investir na divulgação do valor histórico da Fercal para os moradores. Através desse apoio, os moradores poderiam aprender sobre os seres que já viveram por lá e a importância da região. “Seria importante que a sociedade ajudasse os pesquisadores, para que eles possam investigar ainda mais o local”, afirma. Ele sugere que seja firmada uma parceria entre as mineradoras que atuam na Fercal e os paleontólogos, para permitir a análise das rochas que possam conter registros do passado. “Aproveitar as áreas de onde eles tiram o calcário para verificar os fósseis e coletar aqueles que forem importantes, mas sem atrapalhar a mineração. A nossa intenção nunca é a de atrapalhar a atividade do empreendedor”, explica o professor.

Vestígios paleontológicos

Na Fercal não existem apenas fósseis de cianobactérias. A RA guarda vestígios de outros moradores antigos que estão fossilizados nas matas da região. O professor Henrique Zimmermann conta que, em 2019, próximo ao Catingueiro, um amigo o levou para conhecer a mandíbula de um mamífero que viveu há no máximo 2,5 milhões de anos e que está intacto em uma caverna. “Ele está em uma caverna bem íngreme, o fóssil é fácil de encontrar porque ele está bem evidente no fundo da caverna. Mas se tivesse um esforço de fazer uma escavação por lá, com certeza apareceria mais coisas”, explica o paleontólogo.

Segundo Zimmermann, toda a Fercal é na verdade um grande sítio paleontológico. Porém, a Agência Nacional de Mineração (ANM), responsável pela demarcação dos sítios, nunca registrou uma área de pesquisa oficial no DF.
Outras evidências

Por mais que seja lá onde estão os registros mais antigos, a Fercal não é a única região do DF onde já se teve a descoberta de fósseis. Durante a construção da capital federal, foi encontrado um tigre-dente-de-sabre, da mesma espécie do personagem “Diego” da série de filmes A Era do Gelo, mas que infelizmente não podem ser conhecidos pela população. “Os achados estavam guardados na Universidade de Brasília, mas foram perdidos há décadas”, conta Zimmermann.

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