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Brasília

Escola anuncia vaga de emprego e candidatas denunciam ‘limpeza grátis’

Arquivo Geral

30/01/2019 7h00

Imagem ilustrativa. Foto: Myke Sena/Jornal de Brasília.

Ana Lúcia Ferreira
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O relato de uma entrevista de emprego compartilhado na internet virou uma grande confusão. Tudo começou quando a estudante Lenilza Rodrigues, 26 anos, publicou em um grupo do Facebook que foi convidada a participar de um processo seletivo em uma escola particular de São Sebastião, na tarde do último domingo (27). No post, a aluna de Educação Física relatou que, para concorrer à vaga de auxiliar de serviços gerais, precisou fazer uma faxina durante três horas e não foi remunerada pelo trabalho.

A jovem detalhou que prestou o serviço com outras duas candidatas e que, de acordo com uma orientadora da seleção, era preciso fazer a tarefa para que, posteriormente, a responsável pelo processo escolhesse a candidata que apresentasse um melhor desempenho.

Pouco tempo após o desabafo, a publicação recebeu diversos comentários de mulheres que afirmavam ter passado pela mesma situação. Em um deles, uma internauta chegou a dizer que o procedimento era padrão da escola e se repetia sempre no início de cada semestre letivo.

 

Foto: Reprodução/Facebook

Condições

Desempregada há um ano e vivendo de bicos, Lenilza Rodrigues contou ao Jornal de Brasília que viu a vaga publicada também em um grupo na internet. Ela fez contato com a escola por WhatsApp e recebeu uma mensagem, no sábado (26), sendo convidada para a realização de um teste com duração de três horas e início às 14h do dia seguinte. Na convocação, ela foi informada de que seria um teste prático para verificar a agilidade da pessoa.

Ainda de acordo com  Lenilza, ao chegar ao local, ela e as outras candidatas foram comunicadas de que deveriam realizar as tarefas para uma posterior avaliação. Segundo a mulher, elas receberam baldes e produtos de limpeza e executaram atividades como organizar livros e limpar paredes. Ao final do serviço, uma moça teria se aproximado e apenas agradecido pelo serviço.

Sem entender o que estava ocorrendo, Lenilza contou que questionou sobre o pagamento, até mesmo, de vale transporte pelo deslocamento. Neste momento, ela disse que a mulher respondeu apenas que ligaria caso fosse necessário, porém, o currículo de nenhuma das candidatas havia sido recolhido pela selecionadora, tampouco um telefone.

 

Casos semelhantes

Assim como  Lenilza, uma moradora de São Sebastião que pediu para não ser identificada disse que também passou pela mesma situação com a escola. A mulher revelou ao JBr. que, no ano passado, no mesmo período, recebeu uma ligação para uma vaga similar. De acordo com ela, na época, eram seis candidatas no processo e que nenhuma delas teria sido selecionada para a vaga. A mulher afirma que as concorrentes trabalharam durante um sábado e domingo, durante todo o dia, e que limparam toda a escola, tiraram água da piscina com o balde e precisaram higienizar chão e paredes da instituição.

Já Denize Fernandes compartilhou no próprio post de Lenilza como foi sua experiência. “Fui ao primeiro dia da tal ‘seleção’.  Não recebi nem água para beber.  E quando fomos usar a mangueira para tal limpeza desligaram a torneira e falaram que tinha que ser no balde para não gastar água. Agora imagine limpar portas e janelas com a torneira no pátio, tendo que ir até as salas”, escreveu a mulher.

Após o episódio, uma advogada entrou no processo para auxiliar Lenilza e as demais candidatas. Segundo Joseni Santos, advogada trabalhista, o procedimento ao qual as mulheres foram submetidas é considerado trabalho análogo a escravidão. Ela afirma que  já pediu a manifestação do Ministério Público do Trabalho e da Delegacia Regional do Trabalho para que os órgãos fiscalizem a empresa. Joseni também pretende entrar com ação no Tribunal Regional do Trabalho.

Diretora promete pagamento

Em entrevista por telefone, Sandra Nery, diretora da escola Master, confirmou à reportagem a participação de Lenilza e das outras duas candidatas no processo seletivo. Segundo Nery, a vaga de  auxiliar de serviços gerais seria para início imediato, pois as aulas começaram nessa segunda. Ela confirmou que realiza os testes práticos para “avaliar a capacidade da pessoa em executar a função”. “É uma forma de saber se ela realmente ela é competente para assumir o cargo”, afirmou.

Ao ser questionada sobre a ausência de remuneração pelo serviço prestado, a diretora negou que a prática ocorresse. Ao Jornal de Brasília, a mulher disse que faz o pagamento de R$ 50 para cada candidata que participa do processo com duração de três horas e que, apenas nesse domingo, o procedimento foi diferente e o pagamento não foi realizado. Ainda segundo Sandra, as candidatas foram informadas de que deveriam passar na escola às 9h do dia seguinte para a retirada da quantia.

A escola ainda publicou uma nota de esclarecimento sobre o ocorrido na internet, após a confusão aumentar. No comunicado, a instituição afirma que “currículo diz sobre os dados da pessoa, mas não fala da competência” e que através dos testes é possível verificar se a pessoa realmente possui as habilidades necessárias para exercer a função.

 

Ponto de Vista

Para o doutor em Direito e processo do trabalho e previdenciário Cláudio Jannotti da Rocha, o caso específico precisa de uma avaliação mais profunda. O especialista ressalta que uma  entrevista de emprego não garante a contratação. Porém,  Jannotti destaca que, se for configurada fraude no processo seletivo, a instituição poderá responder juridicamente pelo ato.

“Caso seja comprovada a má-fé da instituição, ela poderá responder por dano individual material, danos morais coletivos e ainda por uso da tutela inibitória, que seria um pedido de mudança  comportamental da empresa feito em ação coletiva pelo Ministério Público do Trabalho e sindicato”, ressalta.

Cláudio Jannotti afirma que não caberia o pedido de indenização por danos morais individuais, mas sim coletivos. E que, caso seja configurada a fraude, a instituição deverá indenizar a sociedade conforme decisão em juízo. Já para os trabalhadores que entrarem com a ação por dano material, se ficar comprovado que não se tratava de um teste e sim de uso indevido de mão de obra, eles deverão receber pelo dia de trabalho acrescido das demais de despesas, como vale-transporte.


Recursos Humanos

Faz parte do processo seletivo das empresas a realização de testes práticos para verificar a aptidão dos candidatos. Segundo a mestre em psicologia e especialista em Recursos Humanos Rita Brum, o procedimento é correto, porém deve fazer parte de um conjunto de ações.

“Antes de o candidato ser submetido a qualquer etapa é preciso que ele seja comunicado de o que irá fazer. Por vezes, as empresas realizam o teste prático como forma eliminatória nos processos seletivos, entretanto, esta é, geralmente, a última etapa. Antes, é feito o contato com o  candidato, a análise curricular, a verificação de referências pessoais, entrevistas e por fim, o teste”, explica Rita.

A especialista ainda ressalta que é importante o candidato ser comunicado com clareza sobre o que compõe o processo. “Ter informações sobre salário, tipo de trabalho a ser executado, jornada e se haverá algum tipo remuneração no teste é essencial”, conclui.

 

 

 

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