Menu
Brasília

‘Me chamava de mãe’, diz líder de seita acusada de cárcere privado

Arquivo Geral

07/01/2019 20h26

Atualizada 09/01/2019 16h47

Igreja suspeita de manter menina em carcere privado. Ana Vindoura Dias Luz. Foto: Raphael Ribeiro/Jornal de Brasília

Ana Karolline Rodrigues
[email protected]

Fiéis da Igreja Adventista Remanescente de Laodiceia, no Gama, consideram que caso de jovem de 18 anos que estaria vivendo há quatro meses em cárcere privado “é um conflito religioso”. Para eles, o envolvimento da Justiça na situação “não é cabível”. Na chácara Folhas de Palmeiras, onde se localiza a instituição, membros da igreja informaram ao Jornal de Brasília que a menina sofria de problemas psicológicos e que frequentemente xingava e agredia os integrantes da comunidade. “Ela era agressiva, queria violentar as pessoas”, disse um fiel. Quanto às acusações de cárcere privado, os moradores do local negam qualquer tentativa de prisão da menina.

Na comunidade localizada no Km 13 da DF-290, no Gama, Ana Vindoura Dias Luz, 64 anos, a líder da igreja, recebeu a equipe do Jornal de Brasília e mostrou a casa onde a jovem residia com a mãe. Segundo a presidente da instituição religiosa, a moça já vivia com a comunidade desde os 5 anos e também chamava a líder pelo nome de “mãe”. “Sempre morou aqui, me chamava de mãe. Nós cuidávamos dela, a função da igreja é cuidar do espírito. Não se pode dizer que alguém a mantinha presa”, disse Ana Vindoura.

De acordo com moradores do local, que preferiram não se identificar, a igreja “lida com muitos problemas espirituais de jovens”. Segundo eles, um ex- membro da igreja, quem teria feito a denúncia do caso, levou Mariane com ele para Goiânia após a polícia liberar a menina. No entanto, os membros da igreja disseram não saber mais do paradeiro dos dois atualmente. “Meu irmão entrou em adultério, fornicação, e agora está por trás disso tudo aí. Ele a levou e não deixou nem a mãe ver quando ela foi procurá-la em Goiânia”, relatou um homem. “Isso é um conflito religioso. Agora envolvem Justiça onde não é cabível”, afirmou.

Mãe da jovem mantida em carcere privado em comunidade religiosa do Gama. Foto: Raphael Ribeiro/Jornal de Brasília

Segundo o delegado Vander Braga, da 20ª Delegacia de Polícia, além dela, outras duas garotas foram encontradas vivendo em cárcere privado nestas últimas semanas.”Elas conseguiram sair em função de os pais que conseguiram intervir, mas essa menina acabou ficando lá”, disse.

Questionados sobre estas outras possíveis vítimas, moradores afirmaram que já existiram outros casos parecidos com o de Mariane, em que meninas teriam “problemas psicológicos”. Porém, teriam retornado à comunidade após um tempo antes de serem levadas pelos pais.

Mensagens de menina

Em defesa, a líder religiosa chegou a mostrar no local mensagens que supostamente foram enviadas pela própria jovem após o ocorrido. Nos textos enviados à presidente da igreja, a menina afirmou não saber “o que acontece comigo” e disse à mulher que a amava.

Versão policial

De acordo com o delegado Vander Braga, a menina “foi bastante sucinta ao dizer que não sofreu nenhum abuso sexual”. Porém, a mesma disse ser obrigada a prestar todos os serviços da casa onde morava e não poderia sair do local em nenhum momento. “Quando ela não tinha o que fazer, tinha que ficar lendo a Bíblia, estudando a Bíblia, porque foi imposto na cabeça dela que ela estava com o demônio no corpo”, afirmou.

O delegado ainda afirmou que a vítima queria ir para a casa do pai, que mora no Nordeste, mas os membros da igreja não teriam permitido. “O pai queria levá-la e eles não deixavam, falavam que ela tava endemoniada e que não poderia, não deixavam de forma nenhuma. Inclusive, quando conseguimos a liberação dela, foram amigos que ficaram com essa custódia, a guarda dela até localizar o pai”, disse. Segundo ele, estes amigos que teriam ajudado a menina irão levá-la até o pai.

Igreja suspeita de manter jovem em carcere privado. Foto: Raphael Ribeiro/Jornal de Brasília

Contando sobre a denúncia que levou os policiais à chácara, o delegado relatou também que dois dias antes de fazerem o flagrante, Mariane teria conseguido pegar o celular enquanto a líder estava dormindo, mandado uma mensagem para um colega de Goiânia e fugido. No entanto, fiéis “foram até a casa dela, a encontraram escondida no mato e levaram de volta”. De acordo com Braga, ali mesmo foi dada voz de prisão à líder. Ana Vindoura, que chegou a ser presa por cárcere privado, foi conduzida para audiência de custódia e liberada no dia seguinte pela Justiça.

Segundo Braga, a comunidade já atuou em Mato Grosso e Corumbá de Goiás antes de vir para Brasília. Na primeira localidade, porém, teriam sido multados por trabalho escravo, motivo que os levou a seguir para Goiás. Como as investigações relacionadas a instituição ainda seguem, a seita religiosa e a comunidade residente na chácara mantêm a rotina em normal funcionamento.

Troca de mensagens que expôs a questão. Foto: Raphael Ribeiro/Jornal de Brasília

    Você também pode gostar

    Assine nossa newsletter e
    mantenha-se bem informado