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Brasília

“As pessoas devem pensar que tenho um coração ruim”, diz ex-borracheiro em situação de rua

O Censo Demográfico do IBGE, que é realizado neste ano de 2022, não contabiliza pessoas em situação de rua

Redação Jornal de Brasília

30/09/2022 18h41

Carlos Roberto, dorme embaixo de construção no Gama. Foto: Milena Carvalho

Por Milena Dias
Agência de Notícias do CEUB/Jornal de Brasília

De atendente de posto a pedreiro. De pedreiro a borracheiro. De borracheiro a morador de rua. Essa é a vida de Carlos Roberto Alves, de 57 anos, que mora nas ruas do Gama e sonha em voltar ao seu ofício. “Minha sede é voltar a trabalhar como borracheiro. Essa é minha profissão”, afirma.

O Censo Demográfico do IBGE, que é realizado neste ano de 2022, não contabiliza pessoas em situação de rua. Por isso, a história de Carlos não é ouvida pelo levantamento.

Nascido em Fortaleza (CE) e criado em Araguaína (TO), Carlos Roberto mudou-se, na adolescência, para Brasília com a mãe. Depois, quando adulto, foi para Aparecida de Goiânia a fim de ter um emprego em um posto de gasolina. Mais tarde, tentou a vida em Alexânia a fim de trabalhar em uma borracharia.

Segundo ele, era lá que fazia o que gostava, mas a loja fechou. Mais tarde, voltou para Brasília sem dinheiro e também, em desespero, sem uma casa.

“Quando cheguei aqui, passei uns três dias na casa do pastor Willian. Lá é uma chácara e eu dormia dentro da igreja. Eu cuidava de todos os bichos e de tudo lá, mas eles se sentiram incomodados com o meu cigarro e me mandaram embora”.

Carlos diz que, antes de sair, chegaram a pedir que ele parasse de fumar, mas ele só conseguia pensar no vício e em como seria difícil se desfazer dele… “por mais que quisesse muito”.

Consequentemente, Carlos foi viver na rua e lutar para sobreviver. Hoje, a rotina inclui pedir comida ou dinheiro para comprar um pão.

Ele afirma que existem pessoas de coração muito bom, mas outras passam o discriminando ou o mandando trabalhar. “Se eu pudesse, eu realmente iria”, diz.

Esperanças

O sonho dele é voltar para a borracharia ou poder pintar casas novamente.

“Eu gosto do meu serviço, quando eu o pratico, parece que as forças vêm de volta”, considera.

Entretanto, ele diz que voltar seria difícil porque há muita discriminação pela sua idade e, principalmente, porque ele é um morador de rua.

Trabalhar é o que ele quer porque não acredita mais que possa estudar nessa idade. Carlos sabe ler e estudou até a quarta série, mas conta que “era moleque demais” para continuar na escola. Hoje, carrega uma Bíblia que lê todos os dias.

“As pessoas olham pra gente com medo porque estamos sujos. Mas elas não sabem do outro lado. Se você abre uma página do livro você não sabe o que tem escrito na outra”. Carlos Roberto, pessoa em situação de rua

O lugar que ele passa mais tempo é perto de um edifício em obras. “Eu fico olhando aqui para essa construção e para esses homens trabalhando. Eles estão fazendo o que eu gosto e o que eu sei. Hoje mesmo eles estão colocando o concreto ali. Já que eu não posso fazer, eu gosto de ficar vendo”, relat.

“Olha aquele homem. Com certeza já passou por dificuldades, mas deve ter uma profissão boa agora. Isso é porque alguém acreditou nele”, diz Carlos Roberto sobre um homem que passou ao seu lado de carro.

“As pessoas que me veem devem pensar que eu sou apenas um drogado, que não tenho nenhuma habilidade e um coração ruim”.

Carlos pensa que se conseguisse voltar a trabalhar talvez pudesse ter coragem de ir atrás dos seus três filhos que moram no Goiás e que provavelmente, segundo ele, nem sabem que o pai ainda é vivo. Apesar disso, reencontrar os filhos não é o maior desejo, o que ele quer mesmo é recomeçar.

“Eu pretendo sair dessa situação. Eu quero um emprego e um lugarzinho pra mim. Quero ganhar meu dinheirinho, pagar um aluguel e recomeçar tudo isso”, explica. E ainda conclui dizendo: “Agora eu vou caçar algo para comer e um lugarzinho para me proteger da chuva forte que vem aí”.

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