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Quinto Ato
Quinto Ato

Who is it in the press…

Theófilo Silva

07/12/2023 12h22

Reprodução

Quem diz essa frase é Júlio César, na peça homônima de Shakespeare. A citação em língua inglesa aqui se faz necessária em virtude do significado da palavra “press”, hoje, diferente. Andando com Marco Antônio entre a multidão, a caminho do Senado, Júlio César ouve alguém gritar por ele, e responde: “Who is it in the press that calls on me?”, traduzindo, “Quem me chama no meio da multidão?”. Sabemos que “press” em inglês significa imprensa, e que a imprensa ainda não existia no período em que Shakespeare viveu. “Press” naquela época entendia-se como povo, gente, multidão.

A relação entre a imprensa, o governo e a sociedade é um dos fenômenos mais complexos e ambíguos do mundo contemporâneo. Fernando Henrique Cardoso disse uma vez, quando era presidente da República, que precisava ler os jornais todos os dias para saber o que “ele estava pensando”. Não mentiu quando disse isso. O poder da imprensa, principalmente das redes sociais, é gigantesco, e distorções e manipulações podem alterar por completo todo um estado de coisas. A mentira sempre pode fazer grandes estragos. E mentira é algo que não falta nesse mundo novo. É comum, no Brasil, rotular os “formadores de opinião” jornalistas e escritores, que opinam sobre assuntos do dia a dia da nação e do mundo, obrigando-os a “ter um lado” – seja sobre políticas públicas ou questões de natureza moral ou ética – como se não houvesse parâmetros para análises isentas. E com as redes sociais, então, nem se fala. Um caos!

Os governos por intermédio do poder legislativo muitas vezes criam leis que geram mais confusão do que resultados, que atropelam essa ou aquela dimensão institucional, trazendo graves consequências para o futuro. No entanto, existe uma patrulha atuando para que jornalistas, escritores, especialistas silenciem diante dos descalabros diários do Estado. Achar que todas as pessoas que escrevem na Imprensa são vendidas, que o fazem por dinheiro ou por favores, que seus textos são de encomenda, ou ainda, que são opiniões ideológicas, partidárias e que não têm compromisso com a verdade é um grande erro. Existem opiniões isentas, sim. O grupo que age com isenção é pequeno, infinitamente menor do que aqueles estão comprometidos com seu próprio bolso, mas ele existe. Os homens públicos e o governo precisam ser permanentemente vigiados, pois são manipuladores.

O Estado é um monstro, é Thomas Hobbes quem nos alerta, em O Leviatã. Diz Hobbes, que o estado é um animal vaidoso. Eis próprias palavras: “no entanto, ele, o monstro (o estado) quer carinho”. O escritor sério busca a verdade, procura orientar o povo, a sociedade, pois esse é um dos papéis da Literatura, a arte de escrever. Embora sejam antípodas, a literatura orienta a política e a complementa, pois trabalha para consertar seus erros. Já fez e tenta fazer todos os dias o seu papel de antena da sociedade. É Hamlet na sua conversa com os atores quem afirma: “o papel da arte foi, e é oferecer um espelho a natureza”.

Shakespeare escreveu numa época onde ainda não havia ideologias e isso é ótimo, já que impede que ele venha a ser rotulado como se faz comumente com todos. Esquerdista, neoliberal, machista, sexista, racista, imperialista, e vários outros carimbos de igual tamanho. Leio Shakespeare porque ele não está contaminado por essas coisas.

A grande literatura só existe porque é honesta. Os grandes autores eram homens apaixonados pela humanidade. Os que não eram são exceções. E quando não o eram, procuravam sê-lo. Portanto, os bons, que são poucos, não podem ficar calados diante do difícil momento que estamos passando: epidemias, guerras, caos climático e outras pragas, todas elas causados pelos homens. Muito triste!

Repentinamente alguém grita: qual é seu papel na multidão?

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