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Questão de Direito
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Importação de vacinas por estados e municípios

Para resolver os inevitáveis imbróglios quanto à possibilidade de Estados e Municípios adquirirem a vacina contra a COVID, o Congresso aprovou a Lei 534/21

Marilene Carneiro Matos

09/03/2021 18h10

Importação de vacinas por estados e municípios

O pacto federativo de cooperação desenhado pelo Constituinte de 1988 tem sido colocado à prova em muitas ocasiões, mas nada similar ao observado em todo o período da pandemia da COVID-19. Tal estado de coisas, além de afetar diretamente a prestação de serviços públicos à população, em sentido contrário à desejável colaboração que deveria potencializar o esforço dos entes cooperativos, acarreta insegurança jurídica e divide a própria população brasileira, que passa a assistir como expectadora e vítima a descoordenação entre União e entes federativos nos necessários esforços de combate aos efeitos da pandemia.

A despeito do paradigma constitucional do federalismo cooperativo, muitas dúvidas surgiram quanto à questão das competências federativas em relação às providências e políticas de combate à pandemia do coronavírus. Ou seja, quem é o “dono da bola”, União ou Estados e Municípios? Ouviu-se de parcela da população a queixa de que o Presidente da República “não manda em nada”. Então, antes de tudo é necessário que fique muito claro que não há hierarquia entre os entes federativos. O que existe são distribuições constitucionais de competência, dentro de cada área de atuação prevista constitucionalmente.

Nesse sentido, a competência para cuidar da saúde foi atribuída pela Constituição à União, aos Estados e Distrito Federal e aos municípios, segundo um critério de predominância do interesse de cada ente, segundo qual União irá tratar de interesses de âmbito nacional, os Estados de interesse regional e os Municípios cuidarão de temas afetos à população local. Esse tem sido o entendimento manifesto do STF desde o início da pandemia, quando deixou consignado que as providências para o combate da COVID-19 cabiam a todos os entes federativos.

Sendo coerente com o entendimento anteriormente externado pela Corte, o ministro Lewandowski, relator da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 770, ajuizada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), e da Ação Cível Originária (ACO) 3451, ajuizada pelo Estado do Maranhão, deferiu em dezembro do ano passado, liminar para autorizar os estados, os municípios e o Distrito Federal a importar e distribuir vacinas contra a Covid-19.

No seu voto, Lewandowski pôs em relevo que a gravidade da pandemia exige, “mais do que nunca”, uma atuação fortemente proativa dos agentes públicos de todos os níveis governamentais, sobretudo mediante a implementação de programas universais de vacinação, assinalando, ainda que o Sistema Único de Saúde (SUS), ao qual compete, dentre outras atribuições, executar as ações de vigilância sanitária e epidemiológica, é compatível com o “federalismo cooperativo” ou “federalismo de integração” adotado pela Carta de 1988.

Para resolver os inevitáveis imbróglios quanto à possibilidade de Estados e Municípios adquirirem a vacina contra a COVID, o Congresso Nacional aprovou no dia 02.03.2021, a Lei 534/21, de autoria do Senado Federal,ainda pendente de sanção, que autoriza Estados e Municípios a adquirirem a vacina, para os casos em que o governo federal não cumpra o Plano Nacional de Operacionalização da Vacina contra a Covid-19, ou quando a cobertura imunológica prevista pela União não for suficiente.

É louvável a medida legislativa, no sentido de evitar judicializações e disputas entre os entes da federação, em um momento delicado pelo qual passa a sociedade brasileira. Por outro lado, não há como deixar de lamentar a constatação de que o escopo do constituinte de 1988, quando estabeleceu as competências comuns e concorrentes, de tornar mais eficientes as prestações do Poder público aos cidadãos mediante a junção de esforços entre União, Estado e Municípios constitui, ainda, uma distante quimera.

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