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Histórias da Bola
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Primeiro candangão

Disputa pioneira do futebol brasiliense foi muito mais amadora do que profissional

Gustavo Mariani

20/08/2021 10h48

1 – Nesta temporada, celebra-se quatro décadas de que foi disputado o primeiro campeonato brasilense de futebol profissional. A rigor, só mesmo Ceub, Brasília e Grêmio faziam o profissionalismo. Os demais – Taguatinga, Gama, Flamengo, Humaitá e Canarinho – ameaçavam ser.

O regulamento da disputa pioneira teve o primeiro turno chamado Taça Brasília, conquistada pelo Ceub, garantindo um ponto para a terceira etapa, que reuniria mais três equipes com mais pontos no somatório das duas fases iniciais. Caso o primeiro colocado na soma geral dos dois turnos fosse o mesmo, levaria dois pontos para a disputa final. No terceiro turno, os quatro times entrariam com a pontuação zerada, mas garantidos os pontos dos primeiros colocado dos dois turnos anteriores, caso fossem diferentes.

Mas o regulamento não foi cumprido. No meio do segundo turno, a então Confederação Brasileira de Desportos-CBD solicitou à Federação Metropolitana de Futebol (atual Federação de Futebol do DF) apressar o conhecimento do campeão, para a loteria esportiva programar os seus volantes do Campeonato Nacional, como era chamado o Brasileirão. Abandonaram o segundo turno e promoveram um quadrangular extra, com Ceub, Brasília, Taguatinga e Humaitá, os quatro melhores classificados. Resultado: rolou um festival de liminares, culminando com o Ceub abandonando o futebol e a CBD tirando a vaga de Brasília e repassando-a à Ponte Preta de Campinas, onde o oposicionista MDB vencia nas urnas o partido do governo, a ARENA.

Com a pancada aplicada pelo almirante Heleno Nunes, irmão do vice-presidente da república, Adalberto de Barros Nunes, o público desapareceu dos jogos. E o Brasília foi campeão, decidindo com o Humaitá, que já era o Guará Esporte Clube – nada a ver com o Clube de Regatas Guará, que não disputara a competição.

2 – O primeiro “cartola, cartola” do futebol candango foi Justo Magalhães Morais, presidente do Taguatinga Esporte Clube. Em 1977, ele levou o (chegante ao DF) sargento Ruy Telles para ser o supervisor do seu clube e, assim que pintou eleições na FMF, o lançou a candidato. Convenceu os filiados AABB, Desportiva Bandeirante, Sobradinho e Guadalajara a apoiá-lo e, com mais o voto do “Taguá”, Ruy saiu presidente, contra os votos de Gama, Guará e Brasília. Reeleito, em 1979, o sargento Ruy tornou-se um ferrenho oposicionista ao almirante Heleno Nunes. Depois, aliou-se a Giulite Coutinho, o primeiro presidente da Confederação Brasileira de Futebol-CBF. Inclusive, a FMF foi a primeiras filiada visitada pelo homem, após tomar posse.

Ruy mostrava-se um sujeito educadíssimo, agradável nos papos com a rapaziada e, politicamente, muito inteligente. Movimentou muito o futebol candango, gerando muitas manchetes para jornais rádios e TVs. Foi dele a ideia de colocar quadros na parede da sede da entidade, com as fotos de todos os presidentes. Se não fosse assim, estariam todos esquecidos pela história do futebol candango.

3 – Por ter disputado três Nacionais, o Ceub tinha uma torcida maior e, constantemente, trazia grandes clubes cariocas para amistosos no DF, a fim de faturar uma graninha, compensando o “nada no cofre” nos jogos do Candagão. Numa daquelas vezes, pelos finalmentes da década-1970, o Ceub acertou um amistoso com o Flamengo, que tinha Toninho Baiano, Rondinelli, Vanderlei Luxemburgo (lateral-esquerdo) e Luisinho Lemos, entre outros. Zico estava contundido. Como o Candangão teria rodada dupla, com Taguatinga x Brasília no jogo principal e mando de campo do primeiro, Justo Magalhães negociou mudar tudo para a noite de sábado, no Pelezão, para não atrapalhar a vida ceubense.

O Taguatinga perdeu o jogo e a rodada teve apenas 2.722 pagantes, rendendo parcos Cr$ 27 mil. 290 cruzeiros (moeda da época), que não pagavam as despesas da noitada. No domingo, Ceub x Flamengo levou um bom público ao (velho) Estádio Mané Garrincha, permitindo ao time (não era clube, mesmo!) da Asa Norte pagar a cota do Flamengo e ainda ficar com um bom lucro. Malandro, Justo pediu ao presidente ceubense, Adílson Peres, uma graninha emprestada, tirada da renda do amistosão, para pagar a folha salarial do Taguatinga. Sujeito de grande coração, Adílson emprestou. E Justo brincou: “Sou presidente do Taguatinga, mas torço pelo Ceub desde criancinha. Principalmente, quando o Adílson paga o salário dos meus jogadores” – cartola cartola! Movimento muito o futebol profissional candango dos inícios.

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