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Histórias da Bola
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O campeão da macumba

Pomba branca e número 13 ajudaram ‘Tricolor de Aço’ conquistar bi do Campeonato Baiano

Gustavo Mariani

06/08/2023 22h07

Atribui-se ao cronista/treinador João Saldanha a frase dizendo que “se macumba ajudasse a vencer no futebol, o Campeonato Baiano terminaria, sempre, empatado”. Pode não ser verdade, mas que rolam coisas esquisitas por ali, ah! isso rola! Por exemplo, a decisão do Estadual-BA de primeiro de agosto de 1971. Confira o que rolou:

O Bahia estava há 64 partidas sem vencer o seu maior rival, o Vitória, pelo Campeonato Baiano. Tentava acabar com o tabu e, de quebra, ficar bicampeão estadual, caso para o qual precisava só empatar. Enquanto a sua moçada ainda estava pelo vestiário, um macumbeiro adentrou ao gramado da Fonte Nova, portando uma gaiola que prendia uma pomba branca tendo em uma de suas pernas uma bandeirola com a tricolice do Bahia – vermelho, azul e branco. Das altura da intermediária de um dos lados do campo, ele libertou a ave que saiu voando em curva até se enroscar com a rede das traves fincadas do lado do Dique do Tororó. Assistindo aquele voo prendeu o fôlego de 84.785 torcedores pagantes – 11º maior de jogos já disputados pelo Nordeste -, o motorista do Bahia, Esmeraldo, empreendeu alucinada correria, desceu o túnel que ligava vestiários ao gamado e foi interromper a prelação do treinador Jorge Vieira, gritando:

“Zé Oto! Se você ganhar o cara ou coroa da moedinha escolha chutar pro lado do Dique. É recado de pomba branca”.

Jorge Vieira, carioca que já havia sido campeão baiano, pelo Galícia, em 1968, conhecia bem as manhas da terra e deixou o seu capitão Zé Oto, o mais chegado a contatos com o além, dentre todos os jogadores de futebol da Bahia, parar de ouví-lo para responder ao motorista:

“Pode deixar. Vamos atacar pra lá, pro gol da pomba branca”.

E não deu outra. O Bahia ganhou o cara e coroa e seu goleiro Renato foi pra debaixo das traves do lado da Ladeira da Fonte das Pedras, que os locutores de rádio chamavam por “meta da entrada” (do estádio). O juiz Garibaldo Matos (nas horas vagas, ator e teatro) e seus bandeirinhas Clinamute Vieira França e Bartolomeu Lordelo tiraram do gramado todos os que não eram atletas, conferiram tudo e a pelota rolou.

O Vitória fez a saída de jogo e, de início, ninguém colocava a cabeça fora d´água, todos muito cuidadosos, principalmente o “Leão da Barra”, que não era campeão baiano desde 1965 e nem queria perder a maior cota da arrecadação de Cr$ 478 mil, 845 cruzeiros, a moeda da época.

Rolava, então, o pega, devagar, devagarinho, quando, aos 13 minutos, porém, o artilheiro do “Tricolor de Aço”, o Carlinhos Gonçalves, lançou o Adílson, que não tinha muitas possibilidades de sucesso no lance, pois o goleiro Adílson Paredão e o veteraníssimo zagueiro Nelinho Canecão estavam mais próximos da bola. Só que um a deixou para o outro e o outro a deixou para o um, abrindo tempo para o camisas 9 do rival chegar. Então, um Adílson fez pênalti no outro.

Encarregado a batida do penal, o ponta-esquerda Arthurzinho (ex-Botafogo) pegou forte na bola, imprimindo nela o mesmo voo rasante da pomba branca rumo ao canto esquerdo defendido pelo goleiro Adílson Paredão, que teve o seu muro derrubado e ouviu a galera rivalizante gritar:

“Bahêa! Bahêa! Bahêa!”

Pelos 77 minutos restantes, o Bahia administrou o seu “bicaneco” e aprontou um migué”, aos 38 do segundo tempo, quando o seu goleiro Renato trombou com o André Catimba e este mandou-lhe uma porrada, gerando rebu que parou a pugna por 10 minutos. Malandro, o Bahia tirou seu time de campo, considerando-se campeão e alegando ter entendido que o jogo terminara quando torcedores invadiram o gramado. No meio daquele rolo todo, o governador da Bahia, Antônio Carlos Magalhães, botou moral na casa e mandando o juiz reiniciar a partida. Falou-se que as ordens do Toninho Malvadeza incluíram expulsões de campo para André Catimba e Nilo, este do Bahia, mas ele jamais confirmou e nem desmentiu isso – fato ficado no folclore do futebol brasileiro. No mais, após a canecagem, a torcida do Bahia fez carnaval até a Igreja do Senhor do Bomfim.

No jogo da pomba branca esvoaçante o “Bahêa” teve: Renato; Aguiar, Zé Oto, Roberto Rebouças e Sousinha; Amorim e Baiaco; Toninho (Nélson Cazumbá), Aílson, Carlinhos e Arthurzinho (Nilo).

Vitória: Adílson Paredão; Valtinho, Luís Carlos Nelinho Canecão e França; Osvaldo (Juarez) e Ademir; Mário Sérgio, André Catimba, Adãozinho e Ventilador (Kosilek).

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