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Histórias da Bola
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CEUBA, CEUBÃO

Cearense Raimundo Linhares foi primeiro e último torcedor do Ceub

Gustavo Mariani

01/05/2024 12h02

Inaugurada em 1960, Brasília viveu a sua primeira década com o seu morador cultuando somente uma figura: a do construtor (e presidente da república) Juscelino Kubitschek.

Não era pra menos, pois os outros mais importantes do pedaço não eram da terra, e nela só ficavam enquanto durasse mandato parlamentar ou cargo em agência estatal. Ninguém deixava rastro. Só, em 1973, surgiu a segunda figura interessante para os candangos: um bêbado que vestia a camisa do Ceub Esporte Clube, batia um tambor e, com voz rouca, saía gritando: Ceuuubbba! Ceuuubããão!

Por aquela época, a Confederação Brasileira de Desportos (atual CBF), presidida por João Havelange, ultrapassou todos os limites da legalidade e convidou o Ceub para disputar o Campeonato Nacional. Não poderia fazê-lo, porque o clube candango não disputava nenhuma competição oficial regional, como os demais. Rolou, então, comentários de que a entidade tentava, com aquilo, puxar o saco do Governo, pois o presidente Garrastazu Médici ia a estádios e acompanhava jogos ouvindo a narração destes por um radinho à pilha.

Como o torcedor candango estava acostumado a assistir, pela TV, aos domingos, clássico entre os grandes times brazucas, o Ceub jogava sempre nas tardes dos sábados, quando tinha mando de campo nos finais de semana – no já demolido estádio Pelezão. Foi então que surgiu o personagem Ceuba que, logo, entrou nas graças do povão, explodindo o seu grito rouco à beira do alambrado do estádio. Encerrada a partida, ele arrumava uma carona e ia para a Estação Rodoviária exaltar o Ceub, bebadaço, soltando o seu grito de guerra. Não havia quem não parasse para curtí-lo.

Nos jogos do Ceub, este tinha a torcida dos brasilienses, mas só se não enfrentasse os “grandes” cariocas, paulistas, gaúchos, mineiros, goianos, os do coração dos que vieram para a cidade. Com aquilo, o Ceuba era o único torcedor do Ceub. Para conquistar aquela turma que desconsiderava o seu clube, o presidente ceubense, Adílson Peres, adotou política de contratar jogadores que haviam brilhado nas grandes equipes simpatizadas pelos corações saudosos dos imigrantes.

Atletas que já estavam na curva descendente, como, entre outros, Fio Maravilha (ex-Flamengo), Oldair Barchi (ex-Fluminense), Roberto Dias (ex-São Paulo), Dario Alegria (ex-Palmeiras), Rildo (ex-Santos de Pelé), Paíca (ex-Grêmio-RS) e Lauro (ex-Cruzeiro). Mesmo com eles, o show do estádio ficava do lado de fora do gramado, com os gritos e a batida do tambor do Ceuba. Nenhum desses antigos atletas citados acima ficou famoso na cidade, como o bêbado Ceuba.

Nascido no Ceará e registrado por Raimundo Pereira Linhares, o Ceub tinha 37 de idade quando tornou-se a segunda pessoa interessante para os brasilienses. Havia chegado por aqui, em 1958, no meio da leva de conterrâneos que vieram procurar emprego durante a construção da nova capital brasileira.

Arrumou uma vaga de garçom, juntou uma graninha, mandou o emprego pro alto e foi trabalhar como vendedor autônomo. Torrou tudo o que ganhou e, de repente, teve a ideia de ver se arrumava vida melhor em São Paulo.

Foi, voltou a trabalhar no setor bares&restaurantes, e até sendo servente na Casa de Detenção. Por não ver a vida melhorar, voltou para Brasília e se empregou como operário da construção civil.

Lá pelas tantas, pintou convite para ser vigia da sede do Ceub Esporte Clube. Pegou e ficou amigo dos jogadores. Mas começou a exagerar na bebida e terminou demitido. Os jogadores ceubenses, no entanto, não deixaram a sua bola ir pela linha de fundo. Arrumaram um cafofo pra ele morar, enquanto o Padre Zanatta (primo do craque Carlos Alberto Zanatta, do Vasco da Gama), que atuava em uma igreja próxima de onde o Ceub treinava, na Asa Norte de Brasília, lhe dava comida.

CEUBA não arrumou mais emprego depois da demissão. A Federação Metropolitana de Futebol cedeu-lhe um lugar para morar, dentro do estádio Pelezão. Mas ele já era alcoólatra. Um dia, depois de muito gritar “Ceuuubba”, em um jogo do Ceub, em 1976, de tão bêbado que estava, ao sair do Pelezão, ele “atropelou um ôibus”. Pouco depois, o Ceub encerrou as suas atividades no futebol profisisonal – e foi esta a história do primeiro e último torcedor do Ceub.

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