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Ciência da Psicologia
Ciência da Psicologia

O que é psicofobia?

É preciso sermos responsáveis com as palavras, afinal, a linguagem desempenha um papel crucial na perpetuação da psicofobia e outras formas de preconceito

Demerval Bruzzi (CRP 01/21380)

12/12/2023 11h37

Foto: Getty Images

Este semestre foi recheado de bons trabalhos na faculdade onde dou aula. Me sinto honrado em ver meus alunos buscando cada vez mais a ciência ao invés da militância. Não que militar não seja importante, mas como sempre digo: psicologia é ciência, deixe a militância para o campo político.

Um dos destaques deste semestre foi o trabalho da aluna Sarah Melo de Almeida Miranda, que tratou de um tema de suma importância para a psicologia, mas que é pouco tratado nas universidades brasileiras, a psicofobia.

Fala-se muito em saúde mental, mas pouco se aborda o estigma, a marca física que a identifica — estigma tem suas raízes no grego antigo e significava “marca física”, que identificava criminosos ou escravos como inferiores.

Os séculos se passaram, mas a marca permanece, como uma perversa tatuagem para aqueles que a detém. Quem nunca ouviu ou foi chamado de “louco”, “retardado mental”, “paranoico”, “esquizofrênico”, ou mesmo “doente da cabeça”? O que poucos sabem, é que estes adjetivos têm algo em comum: todos são uma forma de psicofobia.

A psicofobia, ou o preconceito e a discriminação contra pessoas que sofrem de distúrbios mentais, é um fenômeno complexo que permeia diversas sociedades ao redor do mundo. Assim, homenageando minha aluna, a verdadeira responsável por este artigo, procurei analisar e desvendar as nuances desse problema, destacando sua presença na cultura, na linguagem e nas interações sociais de nosso país.

A psicofobia não se limita apenas a atitudes hostis ou discriminatórias, mas também se manifesta de maneiras mais sutis, como estereótipos negativos e falta de compreensão em relação aos desafios enfrentados por pessoas com transtornos mentais. É essencial reconhecer que a psicofobia contribui para a marginalização desses indivíduos, impedindo a busca por ajuda e a aceitação social. Ou vocês se esqueceram do “louquinho do estacionamento” que todo mundo conhece ou já ouviu falar?!

A cultura desempenha um papel significativo na formação da psicofobia. Muitas sociedades perpetuam estigmas em torno da saúde mental, associando-a à fraqueza, incapacidade ou até mesmo periculosidade. Essas percepções equivocadas criam barreiras para a aceitação e a inclusão de pessoas com transtornos mentais. Foi preciso muita campanha — e até mesmo novelas — para que a sociedade minimizasse seu tratamento hostil aos portadores da síndrome de down, por exemplo.

Muitas ainda são as famílias que, por vergonha, encarceram seus parentes por serem “diferentes”, mas Raul Seixas já considerava o “Maluco Beleza”, e Rita Lee fez um hino lembrando que “todo mundo que é genial nunca é descrito como normal”.

Infelizmente, a sociedade não trata como igual seus desiguais, criando barreiras muitas vezes intransponíveis para essas pessoas e suas famílias, já que a psicofobia não apenas afeta a autoestima e o bem-estar emocional dos indivíduos, mas também tem implicações diretas na busca por tratamento. O medo de julgamentos frequentemente leva à ocultação de problemas de saúde mental, resultando em diagnósticos tardios e agravamento dos sintomas.

Mas o que esperar de uns país que não sabe diferenciar o certo do errado?! Onde ‘caixa preta’ virou foco de discriminação racial?! Onde a primeira-dama classifica de “fascista” seu oponente político, minimizando de forma irresponsável o terror que foi o fascismo na história mundial?! Aliás, apenas para informação das amigas e amigos leitores que porventura desconheçam o tema, fascismo é uma ideologia política ultranacionalista e autoritária caracterizada por poder ditatorial, repressão da oposição por via da força e forte arregimentação da sociedade e da economia.

É preciso sermos responsáveis com as palavras, afinal, a linguagem desempenha um papel crucial na perpetuação da psicofobia e outras formas de preconceito. Termos pejorativos frequentemente associados a distúrbios mentais contribuem para a estigmatização. Uma abordagem mais cuidadosa e respeitosa na escolha de palavras pode desempenhar um papel fundamental na desconstrução desses estigmas.

É imperativo desafiar e desconstruir os mitos e estereótipos em torno da saúde mental. A educação pública desempenha um papel vital nesse processo, promovendo uma compreensão mais precisa dos distúrbios mentais e desencorajando atitudes prejudiciais. A promoção de uma cultura mais inclusiva, responsável e compreensiva em relação à saúde mental requer esforços coordenados. Campanhas de conscientização, programas educacionais e a representação positiva de personagens com transtornos mentais nos meios de comunicação, como foi feito no passado com os portadores da síndrome de down, podem contribuir significativamente para a redução da psicofobia.

A psicofobia é um desafio complexo que exige uma abordagem abrangente e colaborativa para ser superada. A conscientização, a educação e a promoção de uma linguagem respeitosa são passos essenciais na desconstrução dos estigmas em torno da saúde mental. Ao criar uma sociedade mais compassiva, responsável e inclusiva, podemos contribuir para um ambiente em que todos possam buscar ajuda sem medo de julgamento, promovendo, assim, uma melhor compreensão e aceitação da diversidade da experiência humana.

Afinal, de médico e “louco”, todo mundo tem um pouco, ou como diria Ney Matogrosso: “Louco é quem me diz… E não é feliz, não é feliz.”

Até a próxima…

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