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Psicanálise da vida cotidiana
Psicanálise da vida cotidiana

Um sentido da loucura

Redação Jornal de Brasília

04/07/2019 12h36

Atualizada 08/07/2019 12h39

loucura

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Quem disse que a loucura tem sentido, mesmo a loucura psicótica, além da loucura de todos nós, os normais? Pois bem, momentos de desorganização, de crises intensas de angústia, de desespero em momentos de solidão e sentimento de abandono, diante da consciência da mortalidade, às vezes determinando crises de pânico, lutos não feitos em que a pessoa acha que a solução é morrer com o morto, pesadelos diurnos, sensação de vacuidade, de estar-sem-sentido na vida, estados de iminência de enlouquecer, enfim, todas essas experiências psíquicas revelam “a loucura de todos nós”.

Viver não é fácil, a pessoa precisa aprender a viver, aprender a aceitar os meandros diabólicos da mente mesmo em momentos de suposta felicidade. Aliás, felicidade é um instante, um tempo pequeno e não a fantasia de uma internidade naquilo que os psicanalistas chamam de “permanência no princípio de prazer”. A existência é dialética, é de opostos, de amor e ódio, tristeza e alegria, idas e vindas, a existência se faz não na horizontalidade, mas numa linha helicoidal onde a cada momento expande-se a vida, abrindo-se ao prazer ou a trágica melancolia.

O mineiro Paulo Mendes tem uma das belas prosas poéticas da Literatura Brasileira, em seu livro de crônicas O amor acaba, traz um belo escrito que o denominou de Para Maria da Graça. Lá no texto ele escreve: “Quando ela chegou à idade avançada de quinze anos eu lhe dei de presente o livro Alice no País das Maravilhas. Este livro é doido, Maria. Isto é: o sentido dele está em ti. Escuta: se não descobrires um sentido na loucura acabarás louca. Aprende, pois, logo de saída para a grande vida, a ler este livro como um manual do sentido evidente de todas as coisas, inclusive as loucuras. Aprende isso a teu modo, pois te dou apenas umas poucas chaves entre milhares que abrem as portas da realidade. A realidade, Maria, é louca… Quem sou eu no mundo?” Essa indagação perplexa é o lugar-comum de cada história da gente.

No decorrer da crônica, o nosso querido Paulo Mendes transforma sua escrita em reflexões filosóficas, por exemplo: O que Alice aprendeu no fundo do poço foi o significado da sua “sozinhez”, e de lá elaborou que, ao conseguir abrir a porta e de lá sair, tinha um mundo pela frente para existir na direção de Ser, e não somente de existir. Poderia me alongar em várias metáforas do nosso escritor, mas prefiro deixar para outra hora e pensar: Vivemos numa sociedade ativa, movida por cifras, economias, pressa em realizações às vezes vazias, compondo uma sociedade consumista como se o dinheiro, o poder, fossem promessa de felicidade. Os nossos jovens hoje, precisariam de ter uma educação mais “contemplativa”, preocupada com seu eu interior, com a possibilidade de se humanizar mais nesse mundo selvagem. “Chamo de grandes ocasiões os momentos perigosos em que estamos cheios de sofrimento e vaidade, em que sofremos a tentação de achar que fracassamos ou triunfamos, em que nos sentimos umas drogas ou muito bacanas. Cuidado, Maria, com as grandes ocasiões”, termina sua crônica o meio mais mineiro que conheço!

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