Vencedor de importantes prêmios no Brasil e no exterior, o espetáculo Tom na Fazenda retorna à Brasília para uma nova temporada no Teatro Unip, até a próxima terça-feira (30). Com direção de Rodrigo Portella e tradução de Armando Babaioff, que também protagoniza a montagem, o drama assinado pelo canadense Michel Marc Bouchard trata de temas como homofobia, repressão e as feridas abertas por uma estrutura patriarcal, tudo isso em meio a uma trama densa, ambientada em um cenário rural que se torna palco para conflitos profundos e violentos.
O texto original, adaptado para o português por Babaioff, gira em torno de Tom, um publicitário que viaja até uma fazenda para o funeral de seu companheiro. Lá, descobre que a sogra Agatha, interpretada por Denise Del Vecchio, desconhecia a relação do filho e acreditava que ele namorava uma mulher chamada Helen. A mulher em questão é, na verdade, Sara (Camila Nhary), parte de uma farsa montada para manter a ilusão de uma heterossexualidade jamais questionada pela família. No centro dessa estrutura opressora está Francis (Iano Salomão), o irmão truculento do falecido, que manipula e intimida Tom, criando uma atmosfera de crescente tensão.
Para o autor Michel Bouchard, uma frase resume o cerne do espetáculo: “Homossexuais aprendem a mentir antes mesmo de aprender a amar”. Um pensamento que, segundo Babaioff, ressoou fortemente desde o primeiro contato com o texto. “Logo nas primeiras páginas eu já fiquei impressionado. Acho que é uma observação de uma vida inteira nesse país onde a gente ainda precisa discutir muito sobre as liberdades individuais, sobre as minorias”, afirma o ator e tradutor.

Um palco instável para afetos instáveis
A encenação de Portella opta por um palco coberto por uma lona rústica, com lama e água, remetendo ao ambiente rural, mas também desestabilizando física e emocionalmente os intérpretes. “É uma provocação à estabilidade dos atores”, define a montagem. Segundo Babaioff, essa instabilidade reforça a atenção e a conexão entre os corpos em cena, criando uma experiência sensorial e imersiva.
“A gente se propõe, para além da história que estamos contando, a uma experimentação”, explica o ator. “É uma maneira de se contar a história em que o público vai assistir a uma peça que não tem cenário tradicional. O cenário é um plástico perto de argila seca. É um grande exercício de imaginação. O público é confrontado o tempo inteiro a participar da peça, a imaginar os elementos, a estar ali no teatro, não só num lugar passivo, mas ativo da observação.”

Teatro como experiência humana
Ao refletir sobre o impacto e a longevidade do espetáculo — que completou oito anos de apresentações ininterruptas e ultrapassou 160 mil espectadores — Babaioff vê no teatro uma resposta à saturação tecnológica dos tempos atuais.
“Sinto que as pessoas estão cansadas do consumo da tela. Estamos numa overdose de telas. E aí, de repente, o teatro ressurge como uma conexão do ser humano com ele mesmo, presencialmente. Como num clube, numa igreja, num lugar onde as pessoas se encontram sem combinar de passarem algumas horas juntas, ao vivo. O teatro é uma experiência humana, antes de mais nada.”
Com o apoio do Ministério da Cultura, da Petrobras e da Lei de Incentivo à Cultura, a montagem reafirma sua relevância e potência ao seguir circulando pelo Brasil e por países da Europa e América do Norte. “Estamos falando de uma peça que é um drama gay, que está há oito anos em cartaz. Isso já é muito significativo por si só”, pontua Babaioff.

Silêncio como maturidade
Ao longo dos anos dedicados ao espetáculo, Babaioff também reconhece mudanças pessoais profundas: “Acho que eu me tornei um ser humano melhor. Uma pessoa que tenta observar mais do que falar. Estar em cena, o esforço que é para produzir essa peça, já é o meu discurso. Já é a minha bandeira. E isso demanda muito trabalho.”
A peça vem colhendo reconhecimento internacional desde sua estreia, com prêmios como o da Associação de Críticos de Teatro de Québec (Canadá), e nacionais, como Shell, APCA e APTR. Em sua trajetória, já passou por países como Canadá, Suíça, Bélgica, além dos prestigiosos festivais de Avignon (França) e Edimburgo (Reino Unido). Nesta última, Tom na Fazenda teve 23 sessões assistidas por mais de 7 mil pessoas e foi destaque no jornal The Guardian, que descreveu a montagem como “impressionante estudo sobre a homofobia” e “tão cruel quanto hipnotizante”.
Espetáculo Tom na Fazenda
Onde: Teatro Unip (Brasília)
Quando: 26 a 30 de setembro
Classificação indicativa: 14 anos
Ingressos à venda no site