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Teatro e Dança

Espetáculo leva ao palco o passado e o presente das lutas por inclusão

“Depois do Silêncio” une dança, teatro e Libras para contar trajetória da ativista surdocega e refletir sobre acessibilidade hoje; sessões gratuitas no Teatro SESC Paulo Gracindo, no Gama, até domingo

Alexya Lemos

03/10/2025 5h00

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Foto: Diego Bresani/ Divulgação

Com uma trajetória marcada por reconhecimento nacional e internacional, o espetáculo Depois do Silêncio, da Cia. Os Buriti, chega ao Teatro SESC Paulo Gracindo, no Gama, com apresentações gratuitas até domingo. A montagem, que já circulou por festivais no Brasil, Espanha e Paraguai, retrata a vida da escritora e ativista norte-americana Helen Keller (1880–1968) e propõe uma reflexão profunda sobre acessibilidade e inclusão de pessoas com deficiência, por meio de uma experiência cênica bilíngue em português e Língua Brasileira de Sinais (Libras).

Baseada em fatos reais, a peça acompanha a infância de Keller, que perde a visão e a audição ainda bebê, e a chegada da professora Anne Sullivan, que a ensina a se comunicar por meio da língua de sinais tátil. Em cena, as atrizes Camila Guerra e Naira Carneiro interpretam Anne e Helen, respectivamente, e compartilham o palco com a atriz surda Renata Rezende, que traz à dramaturgia um paralelo com sua própria trajetória como artista surda nos dias atuais.

“A peça não só pretende contribuir para a reflexão de jovens e adultos sobre a temática da acessibilidade e visibilidade das pessoas com deficiência, mas também ser um exemplo de inclusão a partir do encontro de atrizes ouvintes e surdas em cena”, afirma Naira Carneiro.

Inclusão que vai além do texto

A direção do espetáculo, assinada por Eliana Carneiro, buscou desde o início incorporar não apenas a história de Keller e Sullivan, mas também vivências contemporâneas de pessoas com deficiência. A escolha de ter uma atriz surda em cena, e não apenas tradutores ou recursos externos, foi central nesse processo.

“Quando eu entrei na direção do espetáculo, eu trouxe a necessidade de colocarmos uma atriz surda em cena, que eu acho que foi o que deu essa grande redimensionada para o trabalho”, afirma Eliana. “Não só ser um trabalho bilíngue, mas ter também os relatos dessa atriz surda, que também é uma atriz dentro do mundo do teatro para surdos.”

Segundo a diretora, o processo foi marcado por trocas intensas. “A Renata mesmo, no início, ficava: ‘Nossa, mas como seria isso possível? Eu, surda, no meio de ouvintes e fazendo um trabalho’. Então a gente lançou esse desafio para ela de também relatar a história dela. Porque aí a gente faria um paralelo entre Helen Keller e Anne Sullivan, que têm uma história ímpar, impressionante, e o que seria na atualidade você ser surdo e também tocar as pessoas, sensibilizar as pessoas para o que é você ser surdo hoje.”

A montagem é encenada de forma bilíngue, em português e Libras, pelas próprias atrizes, sem necessidade de intérprete. O resultado é um espetáculo que, além de acessível, convida o público a uma imersão em diferentes formas de comunicação.

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Foto: Diego Bresani/ Divulgação

Corpo e linguagem

A pesquisa para Depois do Silêncio também se aprofundou nas particularidades físicas da experiência da surdez e da cegueira. A atriz Naira Carneiro, por exemplo, estudou com pessoas cegas para entender como adaptar sua movimentação em cena, criando uma linguagem corporal que traduzisse a fisicalidade de Helen Keller.

“Os cegos têm uma fisicalidade completamente diferente da nossa. Eles não têm os parâmetros que a gente tem de sentar, de ouvir, de se portar. Eles têm uma movimentação corporal e gestos… é uma outra cultura corporal”, explica Eliana. “A Naira pesquisou muito essa movimentação dos cegos, também tendo contato com cegos.”

Esse cuidado com a linguagem não verbal se estende a toda a proposta da companhia, que trabalha com a intersecção entre teatro, dança e música desde sua fundação. Criada em 1995 por Eliana Carneiro, a Cia. Os Buriti é sediada em Brasília e formada por artistas que compartilham mais de duas décadas de estrada juntos, como Camila Guerra, Renata Rezende, e os músicos Jorge Brasil, André Togni, entre outros.

“Os Buriti têm essa coisa familiar”, conta Eliana. “A gente já está há mais de 20 anos juntos. Tem uma uma longa caminhada.”

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Foto: Diego Bresani/ Divulgação

Reconhecimento e trajetória

Depois do Silêncio estreou em 2021 em formato online no YouTube e participou de festivais como o Festival de Mujeres en Escena por la Paz (Colômbia), Funarte Acessibilidança e Mulher em Cena (DF). A estreia presencial ocorreu na Mostra Internacional de Dança (MID), no CCBB de Brasília, e desde então a peça percorreu importantes circuitos culturais no Brasil e no exterior, incluindo o SESC Copacabana, SESC Paulista, Circuito SESI SP, SESC Pulsar RJ e o festival Crear en Libertad, no Paraguai.

Com essa trajetória, a companhia tem conquistado não só plateias diversas, mas, principalmente, o público surdo, que se vê representado em cena. “O incrível é que a gente tem um público surdo impressionante, gigante”, diz Eliana. “E era exatamente isso que a gente queria. A gente se sente muito feliz de ter conseguido contemplar essa plateia e tê-los ali tão felizes e sendo representados de forma tão verdadeira. Eles ficam muito emocionados.”

Espetáculo “Depois do Silêncio” – Cia. Os Buriti
Onde: Teatro SESC Paulo Gracindo – Gama/DF
Quando: 3, 4 e 5 de outubro, sexta e sábado às 20h, domingo às 19h
Entrada gratuita

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