Nesta quarta-feira (29), Dia Nacional do Livro, Brasília encontra na Platô Livraria um símbolo vivo do que significa manter o hábito da leitura pulsando fora das telas. Em tempos de compras com um clique e recomendações guiadas por algoritmos, a livraria de rua da 405 Sul se tornou um espaço de resistência — um lembrete de que o livro continua sendo, acima de tudo, um convite ao encontro.
Sociedade de Marilia Santos, a Platô é um desses raros lugares onde o livro não é apenas comprado, mas vivido. “O mais bonito é quando o livro te encontra, e não o contrário”, diz Marilia ao Jornal de Brasília, quase como quem revela um segredo poético. No espaço, o tempo desacelera, e cada prateleira guarda a promessa de um achado inesperado.

Mais do que um ponto de venda, a Platô é uma casa de encontros. O cliente chega, conversa, ouve uma indicação, descobre um autor local e, muitas vezes, faz amizade. “A gente burla o algoritmo”, brinca a livreira. E, de fato, é isso que o espaço faz: subverte o automatismo das compras digitais e devolve à leitura o que ela tem de mais humano — o acaso. Ao atravessar a porta da livraria, o leitor se abre para o prazer de ser surpreendido por um livro que não estava nos planos.
Com apenas um ano de vida, a Platô já virou referência na cidade. Cresceu organicamente entre clubes de leitura, lançamentos, debates e uma programação que mistura literatura, teatro, cinema e artes plásticas. O jardim — parte essencial do projeto arquitetônico de Lúcio Costa — ganhou nova vida como uma extensão da livraria, uma praça literária onde o Quadradinho se encontra consigo mesmo. “Brasília tem esquina, sim. E a Platô é uma delas”, afirma Marilia.

Resistir, aqui, é verbo diário. Em meio à força das plataformas digitais e à lógica dos descontos, a Platô aposta na curadoria cuidadosa e na construção de uma comunidade leitora. O acervo é pensado a dedo por Lorena Martins, poeta e pesquisadora que seleciona cada título com o olhar atento de quem entende que o livro certo pode mudar um dia — ou uma vida. “O algoritmo não descobre o que a mão e o coração encontram”, diz Marilia, reafirmando a crença na escolha artesanal como um ato político.
E se é verdade que os gigantes dominam o mercado, também é verdade que as pequenas livrarias têm reencontrado força na coletividade. Marilia conta que tem se articulado com outras livrarias independentes do país para discutir políticas de preço justo e promover ações conjuntas. “Estamos nos organizando como comunidade do livro. Sozinhos é difícil, mas unidos, a gente fala mais alto.”

A Platô também nasceu da coragem de ocupar espaços. A ideia inicial era transformar uma antiga banca de jornal em uma pequena livraria-café — um gesto simbólico de reocupar o espaço público e ressignificar o projeto urbano da cidade. O sonho cresceu e encontrou morada definitiva na 405 Sul, onde o deck de madeira virou palco para saraus, leituras e até espetáculos de butô.
No fim, a Platô é mais do que uma livraria: é uma experiência sensorial, um elo entre cidade e leitores. Entre o concreto de Brasília e o verde do jardim, o espaço celebra o valor do encontro e a beleza do inesperado — aquele instante raro em que, por acaso, um livro olha de volta e te escolhe.