Neste sábado (1), às 15h, o Museu Vivo da Memória Candanga abre ao público a mostra fotográfica “Entre-Lugar: Trajetórias”, que reúne fotos de álbuns de famílias de origem japonesa e das artistas visuais Célia Matsunaga e Nilce Eiko Hanashiro. Com curadoria de Gladstone Menezes, a exposição recupera uma história da construção de Brasília que se mistura com a trajetória da imigração japonesa no Brasil e se manifesta na produção artística de Hanashiro. A mostra fica em cartaz até 20 de dezembro, de segunda a sábado, das 9h às 17h.

A exposição reconta a história da imigração japonesa para o Brasil e de como algumas dessas famílias ajudaram a construir Brasília, a partir dos acervos fotográficos das famílias Hanashiro e Matsunaga, pioneiras na região. As imagens seguem uma linha do tempo que mescla relatos históricos e afetivos dos álbuns de família. As trajetórias caminharam em paralelo até o encontro entre as duas artistas nos anos 1990. A obra de Nilce Eiko Hanashiro ressignifica memórias familiares por meio de performances, instalações e fotografias que abordam identidade, ancestralidade e pertencimento. Já o trabalho de Célia Matsunaga revela estruturas ocultas e propõe uma experiência estética feita de pausas, espaços e silêncios visuais.

O curador Gladstone Menezes observa que o registro da trajetória dos japoneses e de seus descendentes nipo-brasileiros, ao longo de quase 120 anos, é de valor inestimável para a compreensão da formação social e cultural do Brasil. “Entre-Lugar: Trajetórias propõe compartilhar um conjunto de lembranças que reafirmam a memória como uma das mais valiosas ferramentas de transformação e construção do futuro”, comenta.
A mostra é composta por fotografias, instalações e objetos. Entre os destaques está a instalação “Noivos”, primeiro trabalho de Nilce Eiko Hanashiro voltado ao resgate da memória, inspirado na tradição japonesa dos casamentos arranjados. A artista organizou em sequência fotografias de noivos e noivas, destacando expressões sérias e diferenças sociais entre trajes. As imagens originais, de 1994, foram ampliadas com fotos das famílias Matsunaga e de museus virtuais.

Outra obra em destaque é a videoinstalação “3×4”, ainda em processo de finalização, que reúne cem retratos de japoneses e descendentes sonorizados com canções e provérbios okinawanos gravados por Yoshiko Hanashiro. A obra funciona como um autorretrato coletivo, misturando identidades e reafirmando a diversidade cultural. Já em “Leques” (2000), Nilce utiliza o leque — símbolo tradicional japonês de feminilidade e delicadeza — e o incendeia, subvertendo sua função e questionando tradições e papéis de gênero.
As obras de Célia Matsunaga exploram a relação entre forma e ideia, tornando-as inseparáveis. Seus livros propõem percursos visuais e sensoriais, convidando o público à contemplação. Em “Véu de Noiva” (2012), a artista cria uma cascata translúcida de papel vegetal, transformada com o tempo. “Amazônia” (2017) simboliza a efemeridade da paisagem em imagens monocromáticas recortadas horizontalmente. Em “Re-encontrar” (2012), feita em parceria com Daniel Mira, combina tipografia digital ilegível e desenhos orgânicos, criando um diálogo entre geometria e pulsação. “A Casa” (2025) suspende páginas como bandeirolas de seda, convidando o público a revisitar as memórias da Brasília primitiva.

Ao falar sobre o processo de criação, Célia Matsunaga explica que revisitar a história da própria família foi um desafio. “Falar sobre a família nunca é um tema muito fácil. Especialmente para mim, que vivo atualmente em Vicente Pires, ao lado da residência de meus pais. Desde o início da pandemia da Covid-19, minha mãe foi diagnosticada com Alzheimer, e meu pai passou por uma série de diagnósticos de câncer. Lidar diariamente com as dificuldades da velhice tem sido, muitas vezes, insuportável”, relata. A artista comenta que a arte a ajudou a transformar a dor em algo mais leve. “A arte nos conecta com a história de uma forma mais lúdica, mais serena do que a realidade se impõe. Revisitar a história de minha família neste momento trouxe muita alegria e fez nascer de forma suave um sentimento sufocado: o amor”, afirma.
Questionada sobre a relação entre o visível e o invisível em sua obra, Célia observa que o conceito japonês do “MA” — o espaço entre — ajuda a compreender essa abordagem. “É a ideia relacional, um estado em suspensão. É a potência do vazio. Nesta proposição criada pela exposição, o MA opera de forma latente, traz à tona aquilo que não estava ali”, comenta.

Sobre o encontro com Nilce Eiko Hanashiro, Célia diz que ele foi decisivo para a exposição. “Nesta mostra, ela é consequência. O encontro produziu a obra. Ela não teria sido construída da forma como foi, se não fosse o encontro com a Eiko. As histórias das duas famílias se tornaram uma só”, explica. A artista ressalta ainda a relevância da obra de Eiko: “Ela era irreverente, excepcional. Sua qualidade como artista conceitual e sua potência como mulher descendente japonesa a colocam fora de seu tempo.”

Célia também fala sobre a materialidade de suas obras e o desejo de que o público pudesse experimentá-las fisicamente. “Não é uma exposição interativa, pena. Seria muito bom que o público pudesse tocar, sentir o cheiro, rasgar. E até, por que não dizer, queimar”, comenta.
Apresentar a mostra no Museu Vivo da Memória Candanga, segundo Célia, tem um significado profundo. “Acho que foi justamente o que deu sentido para tudo: as obras, as histórias vividas e narradas. É a história de Brasília e de seus candangos, daqueles que acreditaram no sonho”, conclui.
A mostra “Entre-Lugar: Trajetórias” é uma homenagem aos japoneses e descendentes que ajudaram a construir Brasília e formaram parte essencial de sua memória afetiva e social. Realizada com o patrocínio do Fundo de Apoio à Cultura do Distrito Federal (FAC-DF), a exposição reafirma a importância da arte como espaço de encontro entre passado, presente e futuro.
Serviço:
Entre-Lugar: Trajetórias
Fotografias, instalação e objetos
Obras de | Célia Matsunaga e Nilce Eiko Hanashiro
Curadoria | Gladstone Menezes
Abertura | 01/11, às 15h, com visita mediada à mostra pelo curador
Visitação | Até 20/12
De segunda a sábado, das 9h às 17h
Onde | Museu Vivo da Memória Candanga
Endereço | Lote D Setor Juscelino Kubistchek, Núcleo Bandeirante, Brasília-DF
Entrada | Gratuita
Classificação indicativa | Livre para todos os públicos
 
										 
									 
									 
									 
									 
									 
									 
                         
							 
							 
							 
							