Por Olavo David Neto e Petronilo Oliveira
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Sangue Azul
Cruzeirense, seu time é enorme. Em número de títulos, em grandes vitórias e com uma grande torcida. Mas, sinceramente, a “giganteza” que vocês se arrogam chega a ser ridícula. Desde a época do “time grande não cai” até esta temporada, enquanto a Polícia Civil cumpria mandados de busca e apreensão na Toca da Raposa. Sempre foram “grandes demais” para baixar a cabeça e reconhecer que o clube merecia disputar divisões inferiores apenas por esse fato, além, claro, dos salários atrasados, das contínuas trocas de comando e das estapafúrdias declarações proferidas por verdadeiros coronéis celestes.
Um dos vexames
Jogos com torcida única são chatos, enfadonhos mesmo. Ainda mais em rodadas finais de campeonatos, mesmo de pontos corridos. Ontem, porém, o alívio veio imediatamente após a torcida celeste ter a atitude vexatória que teve. A massa alviverde, por sorte, não se expôs à barbárie cruzeirense. E, se pensarmos que a Mancha Alviverde – tradicional aliada da Galoucura, do Atlético – estaria dentro daquele Mineirão, realmente, a escolha da diretoria do Cruzeiro foi acertada, mesmo que não tenha ocorrido com esta intenção. Mas vale a reflexão: falhamos a esse ponto enquanto sociedade? Lavamos as mãos e simplesmente admitimos a falta de condições para garantir a segurança de torcedores? O que mais enfurece é que as imagens como as do último domingo (8) logo viram veneno na boca de espíritos ruins, que bradam aos quatro ventos a ausência de famílias nos estádios de futebol graças à violência, clássico argumento de quem não frequenta estádios.
Não é o primeiro, mas é o mais “caro”
Vários clubes grandes já foram rebaixados para a Série B do Brasileiro. Vasco, Fluminense (foi até a C), Botafogo, Atlético-MG, Palmeiras, Corinthians, Inter, Grêmio. Enfim, apenas Flamengo, Santos e São Paulo não experimentaram ainda o gosto amargo da queda. Porém, todos esses grandes que já jogaram a Segunda Divisão, com exceção talvez do Colorado, tinham elencos medíocres e só não eram considerados como “favoritos” à queda por conta do peso da camisa. Diferentemente do Cruzeiro.
Em janeiro ninguém imaginava…
A Raposa começou ano como favorita a lutar pelo título de todas as competições. Lembrando que no início do ano, havia muita incerteza do Santos de Sampaoli, pois o excelente técnico argentino vivia cobrando a contratações de melhores jogadores em entrevistas coletivas e, normalmente, isso termina na demissão do “reclamão”. Não tinha também o efeito Jorge Jesus no Flamengo. O time carioca já era muito bom, mas Abel Braga era o técnico. Ele, famoso por se fechar ao primeiro gol de vantagem, disposto a tirar um atacante e um meia ofensivo, e colocar um volante e um zagueiro. Com isso, o Cruzeiro era o principal rival do poderoso Palmeiras, bancado pela Crefisa.
… os culpados
Estrelas do time mineiro, Thiago Neves, Dedé, Fred, Fábio, Edilson (contratado junto ao Grêmio logo depois de os gaúchos serem campeões da Libertadores), dentre outros, levaram o Cruzeiro a se classificar como melhor time da primeira fase da Libertadores da América. Porém, entrou polícia na jogada desvendando várias falcatruas, principalmente envolvendo o então vice Itair Machado. Houve diversas irregularidades, como transações ilegais de jogadores com empresários não cadastrados pela CBF, cessão de direitos econômicos de atleta de base abaixo da idade mínima – o que é proibido pela lei brasileira – e esquema de pagamentos para torcidas organizadas com o intuito de defender e divulgar a marca do clube.
E o salário, ó
Depois tem gente que diz que problemas fora de campo não interferem dentro das quatro linhas. Cruzeiro, cheio de rolo, vice-presidente recebendo muito dinheiro e em dia e os jogadores com salário atrasado. Nenhuma, nenhuma empresa pode exigir empenho dos funcionários se não estiver com as contas em dia. Como diria Vampeta, quando jogava num quebrado Flamengo: “Eles fingem que pagam e a gente finge que joga”. Assim, o Cruzeiro foi rebaixado. E para completar o Brasileirão trágico, torcedores do Cruzeiro destruíram o Mineirão, arremessaram cadeiras no gramado, quebraram banheiro. E em 2020 a conta será ainda mais cara.
Esperança mineira
O próprio Palmeiras, que desceu a espada de Dâmocles sobre o pescoço cruzeirense, viveu o drama duas vezes. Embora a primeira tenha sido infrutífera e tenha excluído o alviverde do primeiro Brasileirão de pontos corridos da história, a segunda visita ao segundo escalão do futebol nacional permitiu uma recuperação que, seis anos depois, já garantiu mais dois títulos nacionais ao alviverde. O Grêmio é, talvez, o mais simbólico dos casos. Rebaixado em 2004, o tricolor retornou à elite no ano seguinte, garantiu vaga na Libertadores e decidiu o título com o Boca de Riquelme em 2007. Enquanto os gaúchos jogavam a B, o Galo era rebaixado da A. Uma década depois, a metade de Minas Gerais ostentava títulos inéditos da Copa do Brasil e do maior torneio das Américas. Caso também do Corinthians, que cinco anos após o descenso erguia a sonhada taça em homenagem aos patronos do continente, além do Mundial de Clubes da FIFA. “Um degrau abaixo”, o Furacão do Paraná deixou a elite do Brasileirão em 2011, 15 anos após se estabelecer como potência nacional. No retorno, em 2013, garantiu vaga no torneio continental e o vice da Copa do Brasil. Hoje, é o maior campeão fora do Clube dos 13, venceu a copa que perdeu em 2013, é campeão sul-americano e se porta como um dos mais bem organizados clubes do futebol nacional.
Vamo, vamo, Chapê!
A despeito do dispositivo de “isenção de rebaixamento” recusado pelo clube quando do acidente que vitimou toda uma delegação, a Chapecoense, agora de forma oficial, encara um descenso também pela primeira vez na sua bela história. Caso fechasse acordo, o Verdão catarinense seria “café com leite” até 2020, ano em que jogará sua segunda Série B. Uma temporada frustrante do time Condá, que nos acostumou com vitórias à base de superação e planejamento. Agora na Segundona, a Chape ainda se vê às voltas com processos por indenização em decorrência do acidente com o avião da LaMia, em novembro de 2016. Força!
Tem coisas…
Além de ter inúmeros ídolos e ter revelado vários craques para o futebol brasileiro, porém há muito tempo, como Garrincha e Nilton Santos, o Botafogo mostrou, nesse Brasileirão, que a frase “tem coisas que só acontecem com o Botafogo” segue valendo. Desta vez, como um alento. Pois o clube de General Severiano foi o primeiro time na era dos pontos corridos a não ser rebaixado mesmo tendo perdido 21 vezes na competição.
Alerta para o bem do futebol
O Entrelinhas deseja que Vasco, Botafogo, Fluminense, Atlético-MG, Internacional e outras potências do futebol brasileiro se espelhem nesse Flamengo, que mesmo goleado pelo Santos, por 4 x 0, na última rodada, quebrou vários recordes e não pode ser tratado com desdém pelas diretorias rivais. Brincadeira de torcedor é sempre válida, mas o que é bem feito é pra ser imitado, servir como exemplo para que a desigualdade não seja tão grande, para clubes com muita tradição, mas que não conseguem patrocínio forte, pois a imagem não anda nada legal. E, nesse mundo capitalista que vivemos (é uma realidade e não um desejo), imagem é tudo. Ter fama de bom pagador no mercado ajuda e muito. E olha que estamos colocando um time que até seis, sete anos atrás era o maior devedor do futebol, nenhum jogador queria ir pra lá. Bastam três coisas: planejamento; pensar com a cabeça e não com o coração; e pagar o salário em dia. O nosso receio é que o Brasileirão, que se inicia com quase 10 times favoritos ao título, uma das coisas boas em comparação com os europeus, é a variedade de clubes que podem ser campeão, torne-se um certame chato, onde apenas três, quatro times brigam pela taça.
Seleção Entrelinhas
Tentamos ser justos e tiramos o maior número de jogadores do Flamengo para dar uma equilibrada, mas do meio para frente foi impossível: Santos (Athletico); Rafinha (Flamengo), Rodrigo Caio (Flamengo), Gustavo Henrique (Santos) e Jorge (Santos); Matheus Henrique (Grêmio), Sanchez (Santos), Everton Ribeiro (Flamengo), Arrascaeta (Flamengo), Bruno Henrique (Flamengo), Gabigol (Flamengo). Técnico: Jorge Jesus (Flamengo), com menção honrosa para Sampaoli (Santos); Craque: Bruno Henrique (Flamengo); Revelação: Michael (Goiás), com menção honrosa para Reinier (Flamengo). Ainda deixamos de fora Mari, Filipe Luís e Gerson. Mas é uma boa seleção. Concordam com a gente?