Jéssica Antunes
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As bolsas e mochilas descartadas pelos torcedores desatentos ou desavisados às regras de acesso ao Estádio Nacional Mané Garrincha são selecionadas e apropriadas por espertinhos que rondam a arena esportiva. Ao Jornal de Brasília, voluntários do Comitê Rio 2016 confirmaram a prática, mas eles também são alvo de denúncias. Uma estudante diz ter visto um carro da organização reunindo os objetos na carroceria de uma caminhonete no primeiro dia de jogos em Brasília.
Para não perderem as partidas, ainda há quem tente dar um jeitinho. Nos jogos de futebol olímpico recebidos na capital, a reportagem constatou que a copa das árvores que cercam o estádio é o lugar preferido para guardar os objetos, que nem sempre estão lá ao fim do confronto. Como alternativa, shoppings e hotéis nas redondezas, procurados para servir de guarda-volumes, têm lucrado com preços que variam entre R$ 10 e R$ 50.
Agora é meu
Dispensadas na entrada do Mané Garrincha, há quem se aproveite da disponibilidade dos itens e que pegue, para si, os objetos deixados para trás. A reportagem flagrou moradores de rua e garis pegando os objetos jogados no lixo. “Acontece de pegarem, sim, mas não nos responsabilizamos”, garantiu um dos voluntários.
A prática diverge opiniões. “Se as pessoas decidiram descartar as bolsas, estão livres, sem donos. Não vejo problema em pegarem”, acredita a comerciante Amanda Sales, de 46 anos. Para a empresária Márcia Bezerra, 32, porém, isso não deveria acontecer: “Em um país de honestos, as pessoas encontrariam seus pertences no local que deixaram”, acredita.
Saiba mais
Mesmo com os ingressos avisando que a lista de proibições deve ser conferida no site, muita gente ainda tenta acessar o estádio com itens vetados. Alguns conseguiram driblar a revista e foram flagrados pela reportagem com mochilas e bolsas dentro da arena. A maioria, no entanto, tenta argumentar.
“Estamos ofendidos com a proibição. Em momento nenhum alguém avisou que não poderíamos entrar de mochila”, reclamou Javier Perez, estudante argentino de 25 anos, após longa conversa com os guardas do estádio. Ele e os amigos chegaram na capital há seis meses, estudam na UnB e protestaram pelas restrições.
Desorganização, descaso e denúncia
Era quinta-feira e Brasília receberia os primeiros jogos de futebol olímpico. Ana Carolina Braz, 20 anos, chegou ao estádio usando uma bolsa fora do padrão permitido. “Entendo que é uma medida de segurança e não tentei furar o bloqueio, mas foi humilhante o jeito que nos trataram. Esperava que tivesse estrutura, já que o problema era previsível”, reclamou.
Com outros torcedores, a estudante diz ter procurado representantes da organização, que teriam juntado as bolsas em cestos grandes. Quando o jogo acabou, ninguém sabia dar informações sobre os itens recolhidos. “Tinha bolsas jogadas nos cantos das entradas, gente pegando objetos que não eram seus, outros indo embora sem seus pertences”, relatou.

Angelo Miguel
A organização então os teria encaminhado a uma caminhonete, onde estariam as bolsas: “Não tinha nada lá, mas um voluntário orientou o motorista uniformizado que levasse os itens que estavam jogados no chão supostamente para reunir em outro local, mas ninguém sabia o paradeiro dos pertences”. Foi revirando sacos de lixo que Ana Carolina Braz e os demais tentaram encontrar os objetos abandonados. “É um evento de proporção mundial e não tem uma divulgação eficiente, não tem estrutura, não tem organização. Com as vias fechadas, estacionamentos longes e incentivo ao uso de ônibus, deveriam ter pensado nisso”, opinou a jovem, que ficou sem a bolsa.
Procurado, o Comitê Rio 2016 se limitou a dizer que não se responsabilizam por nenhum objeto deixado no local e que as proibições estão listadas no site do evento. Não se pronunciaram, porém, sobre a denúncia da caminhonete até o fechamento da matéria.
Polêmica antiga
A proibição de entrar com bolsas e mochilas no estádio rende polêmicas desde o início da competição. No domingo, o JBr flagrou um homem batendo boca com guardas, voluntários e PMs que faziam segurança da área externa do estádio. A capitã Cristiane Caldeira, da PM, é quem tentou controlar os ânimos. Mais ousados, alguns ainda arriscaram um jeitinho de burlar a segurança passando bolsas e binóculos pelas grades externas. Funcionários ainda disseram ter flagrado pessoas escondendo objetos proibidos na roupa.