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Política & Poder

Reforma tributária: Governo e Congresso negociam três propostas

As duas Casas formaram uma comissão mista para buscar um consenso, mas os trabalhos ficaram paralisados por conta da pandemia

Redação Jornal de Brasília

09/08/2020 9h01

Eduardo Cucolo
São Paulo, SP

As discussões sobre uma reforma tributária para unificar e simplificar os tributos sobre o consumo ganhou força em 2019 com a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 45, elaborada pelo CCiF (Centro de Cidadania Fiscal) e apresentada pelo deputado Baleia Rossi (MDB-SP).

Conhecida como a proposta da Câmara, o texto unifica cinco tributos –três federais, um estadual e um municipal– em um IVA (Imposto sobre Valor Agregado), sistema utilizado na maioria dos países desenvolvidos para tributar bens e serviços.

Após ganhar o apoio de governadores, que concordaram em incluir o ICMS na reforma, desde que fossem feitas algumas mudanças no texto original, a tramitação da proposta foi atropelada pela apresentação de um outro texto pelo Senado, a PEC 110, que também previa um IVA, mas com regras diferentes, inspirada nos trabalhos do ex- deputado Luiz Carlos Hauly.

As duas Casas formaram uma comissão mista para buscar um consenso, mas os trabalhos ficaram paralisados por conta da pandemia.

No mês passado, o Ministério da Economia apresentou a sua proposta de um IVA, mas incluindo apenas dois tributos federais (PIS e Cofins), deixando estados e municípios de fora. O projeto vinha sendo prometido desde o ano passado.

O governo ainda pretende mandar outras propostas de reforma tributária, que tratam de Imposto de Renda, tributação da folha de pagamentos e um tributo sobre movimentações financeiras que o ministro Paulo Guedes (Economia) jura não ser uma nova versão da antiga CPMF.

A possibilidade de aprovação de um desses textos ainda é vista com ceticismo por especialistas, principalmente diante da resistência do setor de serviços, que avalia que as mudanças vão reduzir a tributação de bens e encarecer a dos serviços.

Igrejas aproveitam reforma para assegurar benefícios

Templos religiosos têm aproveitado as discussões em torno da reforma tributária para manter e até ampliar o alcance dos benefícios fiscais dessas instituições.

O projeto da primeira etapa da reforma tributária do governo federal, que substitui o PIS e a Cofins pela CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), por exemplo, mantém o benefício para as igrejas. Os templos, que atualmente estão isentos do PIS/Cofins, também não terão de recolher a CBS.

A Constituição Federal garante imunidade tributária a templos de qualquer culto, ve- dando cobrança de impostos.

No caso de taxas e contribuições, como a CBS, é necessário garantir o benefício por meio de lei. A imunidade, pelo texto constitucional, deve se restringir a impostos sobre “o patrimônio, a renda e os serviços relacionados com as finalidades essenciais das entidades”. A interpretação desse artigo, no entanto, é alvo de diversas disputas judiciais.

Alguns templos também têm sido autuados pela Receita Federal, que vê irregularidades no uso desse benefício. O Fisco não possui uma estimativa de quanto se deixa de arrecadar por conta desse dispositivo constitucional.

A imunidade para templos não é uma particularidade brasileira (alguns países até cobram tributo em nome de igrejas) e tem como objetivo garantir que o poder público não imponha restrição, por meio de impostos, ao exercício da atividade religiosa.

O mesmo artigo que garante imunidade aos templos lista também partidos políticos, sindicatos, livros, jornais e instituições de educação e assistência social sem fins lucrativos entre os beneficiados.

Ao interpretar esse artigo, o STF (Supremo Tribunal Federal) tem reforçado a necessidade de que a renda dos templos, para não ser tributada, deve se destinar exclusivamente às atividades finalísticas dessas instituições.

Em geral, no entanto, a Corte tem tido uma interpretação considerada por especialistas favorável a essas instituições.

O Supremo já permitiu que a imunidade de IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) se estenda a imóveis alugados a terceiros. E também que o ISS (imposto sobre serviços) não seja cobrado, por exemplo, sobre a renda com estacionamentos nos terrenos desses templos, para ficar em dois casos de repercussão.

“Desde que a sociedade fez uma dissociação, nos países ocidentais principalmente, de Estado e religião, a forma que se encontrou é, em contrapartida, que as entidades religiosas não seriam agredidas pelo Estado sob a forma de cobrança de impostos”, afirma Osmar Simões, sócio de Chediak Advogados.

“Mas você tem uma série de práticas derivadas dessa atividade religiosa que geram dúvidas, como exploração de estacionamentos, aluguel de imóveis para terceiros”, afirma.

No âmbito da Receita há uma polêmica em torno da CSLL (Contribuição Social sobre Lucro Líquido), que incide sobre a mesma base do IRPJ (Imposto de Renda Pessoa Jurídica), ou seja, o lucro dessas instituições. Entidades religiosas podem ter lucro, mas esse resultado precisa ser reinvestido nas suas atividades e não pode ser distribuído.

“Segundo a Receita, algumas entidades religiosas estavam se valendo de alguns meios, como contratos de empréstimos com funcionários, líderes religiosos, para tentar distribuir lucro de maneira disfarçada”, diz Ariel Möller, do Escritório Fux Advogados.

Alguns templos também são acusados de maquiar o lucro para reduzir o pagamento de CSLL, por meio de contratos superfaturados com frequentadores e líderes religiosos, segundo o advogado.

Möller afirma que algumas sugestões acopladas às propostas de reforma tributária de iniciativa da Câmara e do Senado, que alteram a Constituição, visam superar limitações impostas pelo STF.

“Houve um movimento para aproveitar a reforma tributária, sob o pretexto de deixar mais claro o alcance da imunidade, para que ela alcançasse integralmente, sem nenhum requisito ou restrição, como o STF vem impondo em relação à destinação da receita de outras atividades, para que ela fosse ampliada”, diz Möller.

Thiago Sorrentino, professor de Direito Tributário do Estado do Ibmec/DF, afirma que líderes religiosos, como pessoa física, são tributados normalmente. Daí a prática, em alguns casos, de manter recursos em nome de templos.

“O que às vezes acaba acontecendo, para que a tributação não ocorra, é deixar a propriedade e a renda concentradas na pessoa jurídica, que funciona como uma espécie de veículo para que a pessoa utilize esses bens. De quem é o carro, de quem é a mansão? É da entidade religiosa”, diz.

“Isso beira a fraude, mas é muito difícil comprovar que a limousine ou o jato estão na pessoa jurídica apenas para fazer essa proteção”, afirma.

Os templos também têm figurado entre os grandes devedores da Previdência. Isso ocorre porque muitos estão ligados a entidades de assistência social sem fins lucrativos. Estas são imunes ao pagamento de contribuições.

Os templos devem recolher esse tributo, para o qual há um código específico de identificação do contribuinte togado.

Reportagem da Folha mostrou que a Receita Federal vem sendo acionada pelo presidente Jair Bolsonaro para analisar pleitos de lideranças religiosas, que querem uma solução para deixar de pagar dívidas com a União. Somente no Fisco, o total de débitos pendentes de entidades religiosas é de cerca de R$ 1 bilhão.

Na PGFN (Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional), havia na mesma época outros R$ 462 milhões.

Uma proposta de iniciativa popular de 2015 sugere o fim da imunidade tributária para as entidades religiosas. O texto está parado desde abril do ano passado em uma comissão do Senado Federal.

As informações são da Folhapress

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