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Saúde

Dose única de vacina contra HPV não atinge mesma proteção contra principal forma associada ao câncer em meninas

Os dados estão em artigo da edição de dezembro (publicados online nesta semana) da revista The Lancet Infectious Diseases

Redação Jornal de Brasília

24/11/2025 8h32

vacina hpv

Foto: Sandro Araújo/Agência Saúde-DF

ANA BOTTALLO
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)

Um estudo comparou a aplicação de uma única dose da vacina bivalente contra o HPV (produzida com os subtipos 16 e 18) em meninas de 9 a 14 anos à aplicação de três doses da vacina quadrivalente (subtipos 6, 11, 16 e 18) em mulheres de 18 a 25 anos, e constatou que, para o subtipo 18, a dose única atingiu o mesmo limiar de proteção, mas para a forma 16 do vírus, que está ligada à maioria dos casos de câncer, o imunizante não atingiu a chamada não inferioridade (ter igual ou maior proteção).

Tanto nas meninas quanto nas mulheres, a taxa de soroconversão aos 36 meses, isto é, quantas pessoas apresentavam anticorpos específicos contra o vírus três anos após a vacinação, foi de quase 100% sendo, inclusive, maior após a vacinação com a dose única (98,9% contra 96%).

Isto indica que há uma forte resposta imune sendo produzida com os dois esquemas da vacina, mas o fato de o imunizante em dose única apresentar uma proteção contra o subtipo 16 menor do que o observado após três doses sugere que, pelo menos para este subtipo, são necessários reforços a fim de garantir a proteção total.

Os dados estão em artigo da edição de dezembro (publicados online nesta semana) da revista The Lancet Infectious Diseases.

Desde 2022, a OMS (Organização Mundial da Saúde) recomenda a vacinação contra o HPV em dose única como forma de aumentar a adesão, que é muito baixa, principalmente em países de renda baixa, onde ainda persistem diversas barreiras para a imunização.

Para avaliar a eficácia dos dois esquemas vacinais, foram avaliadas 539 meninas de 9 a 14 anos e 366 mulheres de 18 a 25 anos sem infecção prévia pelo subtipo 16 do HPV e 523 meninas e 373 que também nunca foram infectadas pelo subtipo 18 do vírus.

As participantes que foram incluídas no ensaio tiveram amostras de sangue colhidas antes da vacinação, com repetição 12, 24 e 36 meses após a aplicação da dose única, no caso das meninas, e com 2 (primeiro reforço), 6 (segundo reforço), 12, 24 e 36 meses após a primeira dose no esquema de três doses.

Era considerada uma proteção igual ou superior caso a concentração média de anticorpos (chamado GCM, em inglês) da dose única em relação ao esquema triplo fosse igual ou superior a 0,67.

Para o subtipo 18, as amostras de sangue 24 e 36 meses após a aplicação da dose única tiveram uma concentração igual ou superior àquele para o esquema de dose tripla (0,9 e 1,11, respectivamente).

Já no caso do subtipo 16 do vírus, que é o principal associado aos diferentes tipos de câncer de colo de útero, aos 24 e 36 meses foi metade daquela observada nas mulheres, que receberam três doses (0,42 e 0,5, respectivamente), indicando que não foi atingida a mesma proteção com apenas uma dose.

Após o término do ensaio clínico, os pesquisadores conduziram uma nova análise obtendo amostras de meninas que foram vacinadas segundo o programa nacional de imunização da Costa Rica e compararam as amostras destas com a de mulheres de 18 a 25 anos que receberam a vacina bivalente em dose única contra o HPV, estudo que serviu de base para a recomendação da OMS de 2022.

Nesta nova comparação, considerando só os subtipos 16 e 18, a concentração de anticorpos das meninas e das mulheres após a vacinação única foi praticamente a mesma, o que indica que, mesmo tendo apresentado uma proteção menor no primeiro estudo, ela não difere tanto assim quando comparada com um esquema completo usando o mesmo imunizante.

Segundo os autores, que incluem pesquisadores da Costa Rica e dos Estados Unidos, os dados ainda são ambíguos. Embora outras evidências corroborem a adoção de um esquema de dose única, faltam informações de ensaios clínicos randomizados, duplo-cego e controlados que demonstrem qual seria a concentração esperada de anticorpos anti-16 necessária para proteger contra este subtipo em meninas.

Outra hipótese é que a proteção contra as formas do vírus seria idade dependente, isto é, que em mulheres mais velhas, a proteção contra os quatro genótipos pode ser reforçada pelos contatos sucessivos destas ao longo de suas vidas com as formas mais comuns do vírus, criando uma resposta imune de memória, que é desencadeada por células B, e não apenas de anticorpos. É esperado que, ao longo de toda a sua vida, 80% dos adultos sexualmente ativos tenham contato com o vírus.

No entanto, esta hipótese não explica porque, para o subtipo 18, a proteção observada nas meninas que receberam uma única dose foi mais elevada do que nas mulheres que receberam o esquema completo.

Até o momento, a recomendação da OMS, principalmente em ambientes onde as barreiras sanitárias impedem o acesso de meninas à vacinação, continua sendo válida, sugerem os autores, mas mais estudos devem ser conduzidos para poder guiar diretrizes nacionais de proteção contra o HPV, inclusive com o rastreio de mulheres para os quatro subtipos do vírus e outras medidas de proteção.

No último ano, o Ministério da Saúde passou a incluir a vacinação em dose única no PNI (Programa Nacional de Imunizações) para meninas e meninos de 9 a 14 anos, além de pessoas vivendo com HIV de 15 a 45 anos, usuários de PrEP (profilaxia pré-exposição) de 15 a 45 anos, vítimas de abuso sexual e portadores de papilomatose respiratória recorrente (PRR) a partir de dois anos.

O imunizante ofertado no SUS é produzido pelo Instituto Butantan e protege contra as quatro formas do vírus (6, 11, 16 e 18).

Em 2024, entre as meninas, a primeira e a segunda dose tiveram, respectivamente, 95,36% e 79,75% de adesão.

Entre os meninos, os números são ainda menores: 68,69% na primeira aplicação e 51,57% na segunda. Os dados foram obtidos da plataforma VacinaBR, uma parceria da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunização) e o Instituto Questão de Ciência, a partir de repositórios do PNI obtidos via DataSUS.

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