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Saúde

Clonagem humana: barreiras éticas e legais que impedem em humanos o mesmo procedimento feito na ovelha Dolly

De acordo com Luciana Munhoz, no Brasil a clonagem humana é expressamente proibida justamente por essa lei

Redação Jornal de Brasília

23/07/2021 15h42

Foto: Jeff J Mitchell / Reuters

Após 25 anos do experimento de clonagem com a Ovelha Dolly, que revolucionou o mundo científico, ainda surgem questionamentos sobre o uso do mesmo procedimento em seres humanos. Se a nossa tecnologia avança a passos largos e se conseguimos clonar um animal há um quarto de século, por que até hoje não clonamos nossa própria espécie? A resposta, pelo menos no Brasil, está no nosso ordenamento jurídico e também em questões éticas.
Em 2005, 10 anos depois do experimento com a Dolly, entrou em vigor no Brasil a Lei 11.105/2005, chamada Lei de Biossegurança, que traz as normas de segurança e os mecanismos de fiscalização das atividades que envolvem os organismos geneticamente modificados. Entre eles, estão as diretrizes e as vedações no caso do uso das células tronco embrionárias, inclusive, envolvendo as questões de pesquisa.

De acordo com Luciana Munhoz, especialista em Biodireito e mestre em Bioética, sócia do escritório Maia & Munhoz Consultoria e Advocacia, no Brasil a clonagem humana é expressamente proibida justamente por essa lei, mas sendo permitido o uso das células-tronco em pesquisas em prol dos avanços científicos.

“É importante compreender que a finalidade da utilização dessas células é exatamente no sentido de avanços científicos ou de tratamentos de saúde, algo que já existe em clínicas. Logo depois que um neném nasce, as células tronco embrionárias são recolhidas, criopreservadas e podem ser utilizadas futuramente por essa criança. É um serviço que é ofertado no Brasil e no mundo, já acontece porque existe a possibilidade da utilização para questões de saúde”, explica Munhoz.

Jurisprudência

A advogada Thaís Maia, também sócia do escritório Maia & Munhoz Consultoria e Advocacia, conta que um pouco depois que a Lei de Biossegurança foi publicada, em 2008, o Supremo Tribunal Federal foi invocado para analisar a ADI 3510. A ação questionava a constitucionalidade da norma e tentava impedir que essas pesquisas acontecessem.

“O STF, naquele momento, com o relator, então ministro Carlos Ayres Brito, defendeu a constitucionalidade desta lei, permitindo que as células fossem usadas em pesquisas em prol dos avanços científicos, e afirmou que isso não infringiu nenhum princípio constitucional, incluindo o direito constitucional à vida”, ressalta Maia.

A especialista em Biodireito e Bioética também ressalta que uma decisão importante na 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça gerou jurisprudência no assunto, por considerar que uma empresa contratada para colher legalmente células tronco embrionárias causou danos a uma família, por não colher o material genético de uma criança. Conforme a decisão, houve dano extrapatrimonial ao bebê, que teve frustrada a chance de ter as células embrionárias colhidas e armazenadas para, caso preciso, serem utilizadas em tratamento de saúde.

Clonagem humana x ovelha Dolly

Ainda segundo a advogada Luciana Munhoz, o julgamento da ADI pelo STF foi algo que mudou a forma como enxergamos as pesquisas no Brasil. Para ela, é importante entendermos que há uma diferença muito grande entre a clonagem humana e a de animais, como ocorreu primeiramente com a ovelha Dolly, há 25 anos.

“A Dolly surgiu porque não existe nenhum tipo de regulamentação sobre clonagem de animais, mas elas acontecem e existem alguns pesquisadores que defendem, principalmente, a clonagem de espécies de animais que estão sendo extintas. No caso da clonagem humana, não, ela é realmente proibida. Isso não significa que não existam pesquisas que fazem isso. Esses estudos existem, mas eles estão em cima dessa corda sobre a possibilidade legal ou ilegal”, destaca.

Em grande parte do mundo, é proibida a clonagem humana. Mas, em 2013, cientistas da Universidade de Saúde e Ciência de Oregon, nos Estados Unidos, conseguiram, pela primeira vez, reprogramar células humanas adultas para que se tornassem células-tronco embrionárias.

A técnica de clonagem utilizada para isso foi a retirada de células da pele de um homem e inserindo o DNA dele dentro do núcleo de óvulos humanos. Na época, críticos disseram que o estudo poderia levar ao desenvolvimento de clones humanos e à morte injustificada de embriões. Mas, para evitar críticas, os pesquisadores de Oregon destacaram que o método usado por eles é conhecido como clonagem terapêutica, e é diferente da clonagem reprodutiva – usada para criar a ovelha Dolly.

Para Thaís Maia, especialista em Biodireito e mestre em Bioética, sócia do escritório Maia & Munhoz Consultoria e Advocacia, existem vários entraves e barreiras éticas, bioéticas e debates que podemos desenvolver em relação tanto à clonagem de animais quanto à humana.

“Temos que pensar sobre melhoramento humano. Isso é algo muito questionado quando pensamos em reprodução assistida. Aqui no Brasil, por exemplo, é proibida a escolha de fenotipicidade dos embriões, ou seja, não se pode escolher cor dos olhos e cabelo de futuras crianças, por exemplo. Já existem no mundo pesquisas envolvendo alterações genéticas, que revolucionaram a ciência, mas que acabam violando a declaração internacional que traz as determinações éticas de como esses estudos devem acontecer.
Precisamos lembrar que a ciência pode avançar, mas não se utilizando de seres humanos como meio. Pois o ser humano nunca pode ser um meio para que a gente consiga chegar a um fim”, concluiu Munhoz.

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