Menu
Política & Poder

TCU cancela pregão do FNDE para compra de ônibus

Segundo denúncia, governo federal teria concordado em desembolsar R$480 mil em modelos que estão na faixa de R$270 mil

Redação Jornal de Brasília

05/04/2022 11h14

Foto: Divulgação/TCU

Nesta terça-feira, 5, o Tribunal de Contas da União (TCU) barrou o pregão do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), ligado ao Ministério da Educação (MEC), para a obtenção de ônibus escolares com previsão de sobrepreço nas operações. Com essa decisão, o pregão poderá serguir até a última fase. Entretanto, o FNDE será impedido de homologar a licitação e outorgar o objeto.

Foi o ministro Walton Alencar Rodrigues quem assinou a decisão. Ele deu ao FNDE o prazo de 15 dias para apresentar informações sobre o pregão, bem como detalhes do processo de captação dos preços referenciais e do cálculo da estimativa de preços utilizados.

“De fato, há toda uma série de fatores importantes, pendentes de comprovação, que podem ter influenciado no preço dos veículos, os quais precisam ser devidamente esclarecidos pelo FNDE. Desse modo, a oitiva do Fundo é imprescindível para o juízo de mérito da presente representação”, disse o ministro da Corte de contas.

Por meios eletrônicos, o pregão seria realizado nesta terça-feira, 5, apesar de uma reportagem do jornal O Estado de S. Paulo indicar indícios de sobrepreço nas negociações e o Ministério Público no Tribunal de Contas da União (TCU) pedir por sua suspensão.

Conforme o jornal O Estado de S. Paulo, responsável pela denúncia, o governo federal teria concordado em desembolsar R$480 mil em modelos que estão na faixa de R$270 mil. A licitação obteve parecer oposto de órgãos de controle.

No total, o MEC aguarda comprar 3.850 veículos para utilização exclusiva de alunos da rede pública em escolas situadas nas regiões rurais. A compra engloba o programa Caminho na Escola, financiado pelo FNDE.

Questionamento

A Controladoria-Geral da União (CGU) questionou os valores e emitiu um parecer que critica “a discrepância das cotações apresentadas pelos fornecedores em relação ao preço homologado do último pregão”.

O órgão também criticou, em outro parecer, o fato do FNDE não considerar o preço pago por outros órgãos públicos na compra de ônibus. Segundo afirma a controladoria, o órgão levou em consideração somente os valores informados pelos próprios fabricantes, e conclui: “Observa-se que os valores obtidos […] encontram-se em média 54% acima dos valores estimados”.

Dessa forma, o preço total da compra pode saltar de R$ 1,312 bilhão para R$ 2,082 bilhões.

O presidente Jair Bolsonaro (PL) manifestou-se sobre a licitação nesta segunda-feira, 4, e disse que o caso foi descoberto pelo governo.

“Como agora estão me acusando de ter armado na Educação compras superfaturadas de ônibus? Porra, nem a licitação foi feita ainda. Quem descobriu fomos nós. Nós temos compliance, temos gente trabalhando em cada ministério com lupa em contratos”, disse o presidente durante almoço com empresários, no Rio de Janeiro.

Como o Estadão revelou, há risco de sobrepreço de até R$ 732 milhões na licitação, reconhecido pela área técnica do FNDE, pela Procuradoria Federal e pela Controladoria-Geral da União, mas isso não impediu que homens de confiança do ministro Ciro Nogueira e do presidente do PL, Valdemar Costa Neto, que comandam o fundo educacional, dessem sinal verde para a concorrência.

“O fato descrito é grave e envolve a possibilidade do desvio de assombrosa importância em dinheiro. Mais de R$ 730 milhões em prejuízo ao erário, que podem se converter além disso em prejuízo à democracia, a depender da destinação que esses recursos venham a ter, como, por exemplo, a composição do chamado ‘caixa 2 de campanha’”, escreveu o procurador Lucas Rocha Furtado na representação que protocolou ontem no Tribunal pedindo suspensão do pregão 2/2022 do FNDE.

Para a área técnica, a situação é grave, mas precisa de uma análise antes de decisão que impeça a realização do pregão. Por isso, a defesa foi por deixar a concorrência ser feita hoje, mas proibir temporariamente a homologação e o resultado até análise completa do TCU.

A Diretoria de Ações Educacionais do FNDE, comandada por Gharigam Amarante, um apadrinhado de Valdermar Costa Neto – presidente do PL, partido do presidente Jair Bolsonaro -, deu aval para a licitação em valores globais de R$ 2,045 bilhões, o que representa 55% a mais do que os valores considerados adequados por técnicos do FNDE, R$ 1,31 bilhão. O presidente do órgão é Marcelo Ponte, que antes de ser nomeado em 2020 para o cargo era chefe de gabinete no Senado do atual ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira.

Como o Estadão mostrou, Ciro Nogueira se reuniu com Marcelo Ponte, no Palácio do Planalto, duas vezes antes da liberação do pregão, enquanto o procedimento esteve suspenso diante do risco de sobrepreço apontado pelas áreas técnicas terem apontado.

Em viagem ao Rio, nesta segunda-feira, Jair Bolsonaro tentou minimizar o caso, mas acabou admitindo que havia risco de sobrepreço, como revelou o Estadão. “Estão agora me acusando de ter armado a corrupção com compra superfaturada de ônibus, mas nem a licitação foi feita ainda. E quem descobriu fomos nós. Temos gente trabalhando em cada ministério com lupa no contrato. Por isso, não tem corrupção”, afirmou.

No documento em que pede a suspensão da compra dos ônibus escolares com preço inflado, o Ministério Público de Contas lembrou o recente escândalo de corrupção envolvendo pastores lobistas no Ministério da Educação, que, segundo prefeitos, teriam pedido propina, conforme revelou o Estadão.

“Se já não bastasse o escândalo do favorecimento, por afinidades políticas e pessoais, de lideranças religiosas que levou à demissão do ex-ministro Milton Ribeiro, o setor de educação do governo federal é agora novamente atingido por suspeitas de descalabros administrativos, se não também morais”, comentou o procurador Lucas Furtado.

Reação

O senador Alessandro Vieira (PSDB-SE), os deputados federais Tabata Amaral (PSB-SP) e Felipe Rigoni (União Brasil-ES) também solicitaram ao Tribunal de Contas da União (a suspensão, liminarmente, da licitação para a compra de ônibus escolares pelo FNDE, com valores suspeitos de superfaturamento, conforme revelou o Estadão.

Ao pedir a suspensão da licitação, o trio de parlamentares alerta para o “perigo em se permitir que recursos públicos sejam desviados ou utilizados em favor de agentes privados”. E pede que sejam determinadas ao presidente do FNDE, Marcelo Lopes da Ponte, e ao diretor Garigham Amarantes Pinto, as sanções cabíveis, “assim como a todos os envolvidos no caso”.

O senador Randolfe Rodrigues (REDE-AP) também pediu medidas para a anulação do pregão. “Ainda que haja possível redução dos preços estimados durante o transcorrer da fase de propostas e lances do Pregão Eletrônico, a estimativa viciada de valores a serem despendidos com a contratação em epígrafe já configura notória ilegalidade, pois o órgão público em questão admite pagar valores muito acima daqueles praticados no mercado”, afirmou. “A gravidade dos fatos e o montante dos valores envolvidos não tornam menos repugnante a forma como a presente contratação está sendo conduzida pelo FNDE”, disse.

O deputado Kim Kataguiri, do União Brasil-SP, também anunciou que entraria com pedido de suspensão do edital.

No sábado, o deputado Ivan Valente (PSOL-SP) havia protocolado pedidos no Ministério Público Federal do Distrito Federal e no Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União para suspender a licitação e abrir um procedimento para apurar a responsabilidade do presidente do FNDE, Marcelo Ponte, e do diretor da entidade, Garigham Amarante, no caso.

Com Agências

    Você também pode gostar

    Assine nossa newsletter e
    mantenha-se bem informado