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Política & Poder

Saúde ampliou condições especiais em contrato de entrega de vacinas infantis

O Ministério da Saúde, em nota, disse que não houve mudança de entendimento e que parecer jurídico usado na análise da contratação foi “enfático” ao afirmar a viabilidade do prazo de até cinco anos

FolhaPress

27/01/2022 9h44

VINICIUS SASSINE

Documentos internos do Ministério da Saúde mostram que a pasta estabeleceu condições especiais para a contratação sem licitação de empresa para o transporte de vacinas pediátricas contra a Covid-19 e, no curso do processo de dispensa de concorrência, ampliou as benesses previstas, que acabaram prevalecendo na versão final dos contratos.

A primeira versão dos contratos, de 7 de dezembro, previu um prazo de vigência de 12 meses, prorrogável por períodos sucessivos enquanto durar a declaração de emergência de saúde pública em razão da pandemia, uma definição a cargo do Ministério da Saúde.

A segunda minuta, inserida no sistema da pasta em 21 de dezembro, abriu a possibilidade de um prazo prorrogável para até cinco anos, mesmo sendo o caso de uma contratação emergencial, sem licitação.

O Ministério da Saúde, em nota, disse que não houve mudança de entendimento e que parecer jurídico usado na análise da contratação foi “enfático” ao afirmar a viabilidade do prazo de até cinco anos.

Segundo a pasta, a redação está em consonância com a lei de licitações e com o recomendado pelo jurídico, por se tratar de um serviço contínuo.

A vigência de até cinco anos prevaleceu nos dois contratos assinados com a IBL (Intermodal Brasil Logística) em 22 de dezembro. A empresa afirmou que os serviços de distribuição e acondicionamento das vacinas estão ocorrendo com altos padrões de segurança.

Um contrato é para o armazenamento de vacinas da Pfizer contra a Covid-19, e o outro, para o transporte, ambos numa temperatura de -90ºC a -60ºC. O valor dos serviços é de R$ 62,2 milhões.

Um parecer da AGU (Advocacia-Geral da União), elaborado por advogados que atuam na consultoria jurídica junto ao Ministério da Saúde, considerou temerário estabelecer um prazo de até cinco anos para os contratos, em razão da escolha de empresa sem licitação, como a Folha mostrou em reportagem publicada nesta terça-feira (25).

Mesmo assim, a vigência de cinco anos apareceu nas minutas pós-parecer jurídico e nos contratos definitivos. Num documento de outubro, que detalhou como se daria o convite a empresas interessadas no serviço, o ministério manifestou a intenção de permitir um prazo de 30 dias entre a assinatura dos contratos e o início das operações.

“Neste chamamento, procuramos saber se é factível para o mercado esse tempo para o início das atividades”, afirmou o DLOG (Departamento de Logística em Saúde) no documento.

Ao fim, a pasta dobrou esse prazo de adaptação, para 60 dias, como consta no projeto básico que ampara os dois contratos.

“Tendo em vista a singularidade da contratação, o Ministério da Saúde adota o prazo máximo de 60 dias corridos entre a assinatura do contrato e o início das operações”, cita o projeto. “Nesse interstício de tempo, a contratante realizará validação da operação a ser realizada pela contratada, tanto a de armazenamento quanto a de transporte.”

A IBL disse não ter usado os 60 dias de adaptação para o início das operações. “O prazo entre a assinatura do contrato e o início das operações foi ampliado de 30 para 60 dias levando em consideração os desafios levantados durante as visitas técnicas pelos fornecedores para entrar em operação em prazo tão curto”, afirmou o ministério, em nota. Segundo a pasta, a mudança ampliou a concorrência e forneceu isonomia na contratação. A empresa contratada, que não tinha experiência com transporte de vacinas no SUS, é a responsável pela entrega dos imunizantes da Pfizer para crianças de 5 a 11 anos.

As primeiras entregas foram marcadas por problemas como atraso de voos, falta de equipes em aeroportos, bate cabeça sobre quem deveria transportar os imunizantes até os depósitos dos estados, condições impróprias de armazenamento e supercongelamento de doses.

O parecer jurídico sobre o processo de contratação apontou falta de justificativa para a dispensa de licitação e defasagem nas quantidades de doses da Pfizer a serem transportadas -16,6 milhões de frascos, ou 100 milhões de doses.

Após o apontamento, o DLOG justificou que o rito de um processo de concorrência pública seria demorado, com necessidade de adoção de diversos procedimentos e consulta a diferentes instâncias. A legislação para compras na pandemia garante a dispensa, conforme o departamento.

O processo de dispensa de licitação durou quase cinco meses. Teve início em 3 de agosto e terminou com a contratação da IBL, em 22 de dezembro.

Já a defasagem nas quantidades de doses poderia ser resolvida por meio de um aditivo contratual, segundo o ministério.

Sobre os preços praticados, definidos unicamente a partir de consultas a empresas interessadas, o parecer da AGU afirmou que deveria ter havido uma análise dos custos das entregas de vacinas feitas antes dos novos contratos, além de uma avaliação sobre o que deu errado no contrato com a VTCLog, vigente desde 2018.

O general do Exército Ridauto Lúcio Fernandes, diretor do DLOG, encaminhou ofícios pedindo urgência na dispensa de licitação e na contratação e assinou os contratos logo em seguida.

Sobre os apontamentos do parecer da AGU, o Ministério da Saúde afirmou que a contratação seguiu os procedimentos legais necessários e que os contratos assinados estão de acordo com o que preconiza o parecer jurídico. “Todos os contratos deste ministério são acompanhados e fiscalizados por equipes designadas para tal”, disse.

A IBL ofertou o menor preço e houve análise dos custos de entregas anteriores, mas “não há preços para comparação”, por se tratar de doses de vacinas a serem mantidas e transportadas entre -90ºC e -60ºC, segundo o ministério.

“Utilizamos todos os parâmetros da instrução normativa de pesquisa de preços do Ministério da Economia, para a escolha da proposta mais vantajosa para a administração”, afirmou.

Um processo de fiscalização, ainda em análise, investiga as falhas ocorridas na entrega de vacinas pediátricas, conforme o ministério.

A IBL afirmou que os serviços atendem os altos padrões exigidos no chamamento público com dispensa de licitação. “Estamos mantendo, durante as operações, um contingente considerável de profissionais do mais alto gabarito, a postos para garantir o atendimento de quaisquer demandas. Todas as etapas sob a nossa responsabilidade foram cumpridas com excelência, sem qualquer prejuízo ou risco à qualidade das vacinas”, disse. Segundo a empresa, não houve comprometimento da integridade das vacinas por perda de temperatura.

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