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Política & Poder

Religião uniu Mendonça e Michelle, que influiu na indicação para o STF

Nos meios jurídico e político dizem que ela não só o defendeu para a vaga, como atuou junto ao marido para que ele não retirasse a indicação

FolhaPress

11/12/2021 15h03

Foto: Agência Brasil

Julia Chaib e Marianna Holanda
Brasília, DF

A cena da comemoração da primeira-dama, Michelle Bolsonaro, na aprovação de André Mendonça a uma das cadeiras no STF reflete uma amizade que começou no início do governo Jair Bolsonaro (PL) e teve como ponto de encontro a religiosidade.

Embora de denominações diferentes –Michelle é da Igreja Batista e André, pastor presbiteriano–, ambos são evangélicos.

Apesar de ter atuação discreta e ser pouco afeita a articulações políticas, de acordo com relatos, a primeira-dama teve papel fundamental na manutenção do ex-ministro da Justiça e ex-chefe da AGU (Advocacia-Geral da União) como indicado.

Nos meios jurídico e político dizem que ela não só o defendeu para a vaga, como atuou junto ao marido para que ele não retirasse a indicação.

Auxiliares palacianos dizem que a vaga no Supremo opôs alas do governo e até da família do presidente, muito pressionado para trocar de escolha durante os quase cinco meses de espera pela votação.

O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), inicialmente, indicava preferência pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, para a cadeira na mais alta corte do país.

Coube a Michelle o maior apoio a Mendonça na família. De acordo com aliados de Bolsonaro, caso o presidente decidisse retirar a indicação, ele corria o risco de se indispor com a primeira-dama.

Segundo relatos, Mendonça esteve em ao menos dois cultos no Palácio do Planalto acompanhado da família enquanto estava no governo e, na reta final de sua indicação, recebeu votos de torcida e orações da primeira-dama.

Após o resultado no Senado, Mendonça e a esposa voltaram a se encontrar com Michelle para agradecer o apoio.

Ainda que o empenho da esposa de Bolsonaro tenha sido fundamental, pastores e até mesmo Mendonça dizem que ele foi apenas uma parcela da mobilização que ocorreu entre lideranças evangélicas.

A ida do “irmão em Cristo” André Mendonça, como dizem, ao STF provocou uma das maiores uniões do segmento evangélico em décadas.

Inclusive, líderes evangélicos ouvidos pela Folha disseram ter exigido do presidente Bolsonaro mais empenho pela aprovação do indicado na reta final, sob pena de o presidente perder apoio do segmento. Isso gerou manifestações públicas de apoio de Bolsonaro na semana da sabatina de André Mendonça.

O pastor Silas Malafaia, da Assembleia de Deus, disse que André Mendonça foi “unanimidade no mundo evangélico”. Segundo ele, “se alguém fala contra o André, não tem representatividade nenhuma.”

Malafaia foi um dos que mais atuaram na linha de frente, mobilizando fiéis para cobrarem votos de seus senadores e, claro, pressionarem o presidente da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), Davi Alcolumbre (DEM-AP), a pautar a sabatina.

“Sabíamos que tinha um jogo pesado, inclusive de membros do governo, contra o André. E nós jogamos pesado, jejuamos, fiz vídeo, Twitter que saiu na imprensa, dissemos que Alcolumbre ia receber recompensa da maldade dele”, afirmou Malafaia.

O senador do Amapá segurou por mais de quatro meses a sabatina de Mendonça, que foi o segundo indicado de Jair Bolsonaro para o Supremo. Além disso, trabalhou contra até o último segundo.

Não à toa o próprio André Mendonça atribuiu a Deus, literalmente, a sua vitória na votação no Senado, pois disse só ter sido capaz de vencer a articulação contrária de pesos pesados, como Renan Calheiros (MDB-AL) e Alcolumbre, graças a uma força divina.

A crença de que foi a oração que mudou os ventos é compartilhada por pastores ouvidos pela reportagem. Eles relatam que, no momento em que o ex-AGU era sabatinado, centenas de fiéis oravam e jejuavam simultaneamente.

Da mesma forma, no dia que antecedeu a sabatina, cerca de 70 pastores de todo o país chegaram a Brasília e fizeram uma romaria nos gabinetes dos parlamentares para pedir apoio ao “terrivelmente evangélico”. Alternavam entre pedir votos e orar nos corredores do Senado Federal.

Pastor Guaracy Jr., da igreja Quadrangular do Amapá, foi um dos que fizeram o trabalho de formiguinha em Brasília. “Falei com mais de 30 senadores pessoalmente, por telefone, uns dez, e mandei mensagem a todos.”

De acordo com os cálculos do pastor, cerca de 50% dos retornos foram positivos, inclusive da bancada do PT.

O placar da votação da indicação de Mendonça ao STF foi o mais apertado entre os ministros do Supremo: 47 votos a favor e 32 contra. O mínimo necessário era de 41.

Para Guaracy, ainda que o jantar no Palácio do Planalto, na véspera da sabatina, tenha tido a presença predominantemente de pastores, muito mais do que de parlamentares, foi gesto importante de apoio a André Mendonça.

De acordo com relatos, o jantar só aconteceu por pressão de líderes evangélicos no Congresso sobre Bolsonaro.

Depois da sabatina de oito horas, o ex-AGU fez do gabinete do senador Luiz do Carmo (MDB-GO) um QG para acompanhar o desenrolar da votação no plenário do Senado.

De lá, acompanhavam líderes evangélicos, a primeira-dama e a ministra Damares Alves (Direitos Humanos).

Ainda que Damares não conte com a simpatia da bancada evangélica, por uma disputa ainda no período de formação do governo, que fez com que fosse escolhida em vez de Magno Malta, indicação da frente, a ministra também ajudou na caminhada de Mendonça rumo ao STF.

O ex-colega de Esplanada ligou para ela, depois que foi aprovado, para agradecer pelas orações e palavras de encorajamento durante os meses de espera, segundo pessoas próximas à ministra.

De acordo com relatos, ela o acompanhou em encontro com líderes evangélicos nos estados, mesmo antes de Bolsonaro anunciar seu nome.

Enquanto isso, no plenário, o deputado Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ) corria para garantir os apoios ao ex-AGU.

Quando o plenário anunciou os 47 votos, ele conta que chegou ao QG dos evangélicos um minuto e meio depois, a tempo para cantarem a música “Sou um Milagre”.

Coincidência ou não, o hit gospel não poderia ter um refrão mais adequado à saga de Mendonça: “Aquilo que parecia impossível/ Aquilo que parecia não ter saída/Aquilo que parecia ser minha morte/Mas Jesus mudou minha sorte/Sou um milagre e estou aqui”.

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