JOSÉ MARQUES
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Entidades que atuam na defesa da liberdade de imprensa manifestaram preocupação com a aprovação, pelo STF (Supremo Tribunal Federal), da tese que trata da possibilidade de responsabilização judicial de empresas jornalísticas por entrevistas, mas destacaram que ela é um avanço em relação ao texto original que chegou a ser proposto pelo ministro Alexandre de Moraes.
Nesta quarta-feira (29), o STF decidiu que meios de comunicação podem ser responsabilizados civilmente no caso de publicação de entrevista que impute de forma falsa crime a terceiros, quando há indícios concretos de que as declarações são mentirosas.
O texto aprovado diz que “a plena proteção constitucional à liberdade de imprensa é consagrada pelo binômio liberdade com responsabilidade, vedada qualquer espécie de censura prévia, porém admitindo a possibilidade posterior de análise e responsabilização”.
“Na hipótese de publicação de entrevista em que o entrevistado imputa falsamente prática de crime a terceiro, a empresa jornalística somente poderá ser responsabilizada civilmente se: (i) à época da divulgação, havia indícios concretos da falsidade da imputação; e (ii) o veículo deixou de observar o dever de cuidado na verificação da veracidade dos fatos”, diz a tese aprovada pelo Supremo.
O presidente-executivo da ANJ (Associação Nacional de Jornais), Marcelo Rech, afirmou que a decisão é um avanço em relação à tese original de Moraes, que ele considerava “uma grave ameaça à liberdade de imprensa”.
Ainda assim, Rech disse que se mantém uma insegurança a respeito de como a imprensa poderá atuar, sobretudo por não definir o que são “indícios concretos de falsidade de imputação”. Outro ponto levantado pelo presidente da associação é que o STF não informou o que aconteceria, por exemplo, no caso de entrevistas ao vivo.
A entidade aguarda a publicação do acórdão (a decisão completa do caso) para que essas dúvidas sejam dirimidas.
Já a presidente da Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas), Samira de Castro, disse que a tese cria “um grau de responsabilização minimamente condizente com nossas preocupações da liberdade de imprensa e da liberdade de expressão”.
“Esse dever de cuidado que os ministros citam é, na verdade, o fato de você ouvir o outro lado e dar espaço para o contraditório na medida em que o seu entrevistado impute o que posteriormente for chamado de falso crime, [como] calúnia, injúria e difamação”, disse.
Segundo ela, isso “abre espaço para um jornalismo responsável, que pratique de forma ética o direito ao contraditório”.
Katia Brembatti, presidente da Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo), afirmou após a decisão do Supremo que as “organizações de liberdade de imprensa têm motivos para comemorar e lamentar”.
“A gente fez uma longa articulação com o STF para reduzir os danos, para que a decisão de hoje fosse menos ruim”, declarou. “Uma das teses que estava prosperando aumentava e muito a responsabilização da imprensa em situações que não estão no controle da imprensa.”
Segundo ela, caso a tese anterior prosperasse, a população deixaria de ser informada sobre assuntos importantes devido à autocensura que poderia ser praticada pelos profissionais e pelo risco real de responsabilização judicial.
Ela destacou ainda que é preciso buscar o Supremo para que sejam esclarecidos alguns aspectos do entendimento, entre eles o que são os “indícios concretos de falsidade” e como isso vai ser interpretado nas diferentes esferas do Judiciário.
O presidente da ABI (Associação Brasileira de Imprensa), Octávio Costa, disse que pelo menos o STF “teve a responsabilidade de abrandar” a decisão. “De uma forma geral não é bom uma intromissão do STF na nossa atividade profissional e nos limites da liberdade de imprensa”, afirmou.
“O Supremo determinar que nós temos que ter o dever de cuidado é bater no molhado. Evidente que nós jornalistas e os órgãos de imprensa observamos isso, faz parte da nossa atividade profissional”, destacou.
Ele também considerou que é importante que o Supremo detalhe pontos da tese. “Eles vão ter que determinar muito bem o que é esse dever de cuidado.”
Taís Gasparian, advogada da Folha de S.Paulo e cofundadora do Instituto Tornavoz, disse que a decisão da corte “não parece boa”. “Às vezes o fato noticioso é a própria imputação que o entrevistado faz durante a entrevista. A responsabilidade é do entrevistado. Jamais poderia ser do veiculo.”