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Nem toda vodca russa é russa de fato, muito menos pró-Kremlin

Nos Estados Unidos, consumidores e donos de bares decidiram protestar contra a guerra despejando garrafas de Stolichnaya no chão. No entanto, além de a marca ser fabricada na Letônia, seu fundador é um crítico contumaz de Vladimir Putin

FolhaPress

27/03/2022 11h57

Destilaria brasileira conquista prêmio de melhor gin e vodka do mundo em competição de bebidas mais antiga dos EUA

THIAGO BETHÔNICO

Houve um tempo em que perguntar se determinada vodca vinha da Rússia era sinal de preocupação com a qualidade da bebida. Agora, pode ser o prenúncio de um boicote.

Na onda de cancelamento que arrebata tudo que tenha relação com Moscou, o Ocidente encontrou no destilado um alvo simbólico para se posicionar contra a invasão da Ucrânia. O problema é que nem toda vodca russa é russa de fato –muito menos pró-Kremlin.

Nos Estados Unidos, consumidores e donos de bares decidiram protestar contra a guerra despejando garrafas de Stolichnaya no chão. No entanto, além de a marca ser fabricada na Letônia, seu fundador é um crítico contumaz de Vladimir Putin e diz ter se exilado na Europa para fugir das perseguições do presidente.

Yuri Shefler é um bilionário russo que comprou a empresa de vodca em 1997 e transformou a Stolichnaya num rótulo globalmente conhecido. Segundo o site da companhia, em 2000, Putin começou a travar uma batalha pelo registro da marca no mundo todo –disputa que ainda está em andamento em alguns países.

A briga pela propriedade foi parar na suprema corte russa e, atualmente, as garrafas da bebida não podem ser vendidas dentro das fronteiras do país.

Em 2002, Shefler se exilou em Luxemburgo e não voltou à Rússia desde então. Hoje, ele mora em Genebra, na Suíça.

“Eu pessoalmente experimentei perseguição pelo regime de Putin e compartilho a dor da Ucrânia e seu povo”, disse o fundador em comunicado no site da companhia.

Na tentativa de se distanciar da Rússia neste momento de guerra, o Stoli Group –companhia por trás da marca– decidiu tomar uma série de medidas. A primeira foi mudar o nome da Stolichnaya para Stoli.

Quem acessa a página da marca no Instagram dá de cara com um mosaico de nove fotos que formam uma pomba da paz nas cores da bandeira da Ucrânia.

“O Grupo Stoli defende a paz na Europa e a solidariedade com o povo ucraniano. #LiberateUkraine” é a legenda dos posts.

A mensagem de apoio à Ucrânia também é a primeira coisa que se vê ao acessar o site do grupo. Em um comunicado intitulado “Stoli Group, denuncia agressão russa e compartilha histórico de oposição”, a empresa diz ter uma longa história de luta contra o regime russo.

Segundo o CEO global do grupo, Damian McKinney, a empresa condena inequivocamente a ação militar na Ucrânia. “Durante décadas, o Stoli Group resistiu ao regime de Putin. Estamos agora com todos os ucranianos e russos pedindo paz”, disse.

Novo macartismo Na esteira das sanções econômicas contra Moscou, países como EUA e Reino Unido proibiram a importação de vários produtos russos, inclusive a vodca. No entanto, boa parte do boicote à bebida tem uma conotação mais simbólica do que estratégica.

Na Nova Zelândia, uma grande rede de varejo retirou milhares de garrafas de vodca das prateleiras e substituiu por bandeiras ucranianas. Decisão semelhante foi tomada no Canadá, mais precisamente em Ontário, cujo conselho de controle de bebidas removeu os produtos de suas 679 lojas.

Já nos Estados Unidos, governadores de estados como New Hampshire, Ohio, Pensilvânia e Utah pediram às lojas de bebidas que parassem de vender os rótulos.

“Desfaçam-se de toda a vodca russa e, acompanhadas por munição e mísseis, enviem as garrafas vazias à Ucrânia para que eles as usem para fazer coquetéis molotov”, tuitou o senador Tom Cotton, do Arkansas.

O problema é que menos de 2% da vodca consumida nos EUA vem de fato da Rússia. Marcas como Smirnoff, Ciroc, Absolut, Svedka, Grey Goose e SKYY, por exemplo, são destiladas no Reino Unido, Suécia, França ou nos próprios EUA.

Boicote não pegou no Brasil No Brasil, o cancelamento das vodcas russas até aconteceu, mas foi tímido. Segundo dados da Euromonitor, o país é o 11º maior mercado da bebida no mundo. Os cinco primeiros são Rússia, EUA, Polônia, Ucrânia e Belarus.

Em 2020, os brasileiros consumiram cerca de 43,9 milhões de litros da bebida, números bem abaixo da cerveja, que é preferência nacional com 13 bilhões de litros, cachaça (398 milhões) e vinho (380 milhões).

Ao que tudo indica, a guerra na Ucrânia não afetou esse mercado. De acordo com a Interfood, uma das principais importadoras de bebidas do país, as compras não foram prejudicadas até o momento. O último embarque para o Brasil foi no dia 23 de fevereiro, um dia antes de os primeiros mísseis atingirem o território ucraniano.

A Abrabe (Associação Brasileira de Bebidas) também disse não ter notícias sobre boicotes à vodca russa no mercado brasileiro.

Contudo, alguns cancelamentos pontuais foram registrados. Assim como aconteceu com o estrogonofe, a vodca russa foi retirada do cardápio de alguns restaurantes em São Paulo.

O restaurante japonês Tadashii, por exemplo, optou por trocar a bebida que usava nas bebidas pela Absolut, que é sueca. Além disso, também deu novo nome ao moscow mule, que agora é chamado de ucranian mule. Segundo a casa, o menu antigo retorna quando a guerra acabar.

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