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Mundo

Milhares de cubanos migram para os EUA no maior êxodo da história da ilha

Cubano estava cansado de “sobreviver em vez de viver” em Cuba

Redação Jornal de Brasília

28/12/2022 10h53

Foto: AFP

David González estava cansado de “sobreviver em vez de viver” em Cuba. Assim, no início de 2022, empreendeu uma longa viagem aos Estados Unidos, juntando-se aos milhares de cubanos que este ano realizaram o maior êxodo da história da ilha caribenha.

Este barbeiro de 34 anos já não aguentava mais as adversidades de um país que atravessa sua pior crise econômica desde os anos 1990, nem um regime comunista que nunca aceitou. Ele estava farto de sentir que não tinha futuro.

Em Cuba, “perde-se a esperança”, diz ele de Miami, na Flórida, o destino final de sua viagem.

Esse desespero, compartilhado por muitos jovens em Cuba, fez a emigração para os Estados Unidos disparar e alcançar os níveis mais altos já registrados. Entre dezembro de 2021 e dezembro de 2022, as autoridades de fronteira interceptaram em 277.594 ocasiões cubanos que haviam entrado ilegalmente no território americano, segundo dados oficiais.

Esse número supera a soma dos dois grandes movimentos migratórios anteriores: os cerca de 125.000 cubanos que partiram para os EUA no êxodo de Mariel, em 1980, e os mais de 34.000 que foram embora na crise dos balseiros de 1994, lembra Jorge Duany, especialista em Cuba da Universidade Internacional da Flórida.

González começou sua odisseia com um voo para a Nicarágua. O governo do país centro-americano, aliado do regime de Havana, retirou em novembro de 2021 a necessidade de visto para os cubanos, tornando Manágua a primeira etapa do trajeto aos Estados Unidos para a maioria dos migrantes da ilha.

A viagem inteira custou a González cerca de 7.000 dólares: 3.500 pela passagem aérea e outros 3.500 para os traficantes de pessoas que o levaram por terra da Nicarágua aos EUA. Uma quantia enorme para o salário médio cubano de 3.768 pesos mensais, aproximadamente 157 dólares.

O barbeiro conseguiu metade do dinheiro vendendo sua motocicleta e alguns outros pertences. Um amigo enviou o resto de Miami.

De sua jornada de 30 dias pela América Central e México, ele se lembra sobretudo das longas viagens com dezenas de pessoas amontoadas em um ônibus ou na caçamba de um caminhão. Recorda-se da sede, da falta de ar, do calor insuportável durante o dia e do frio terrível à noite.

Mas não era isso que mais o assustava. “Meu maior medo era que me deportassem para Cuba”, conta.

“Enxergar um futuro”

Outros cubanos partem em embarcações precárias, arriscando a vida para percorrer os 145 quilômetros que separam a ilha do território americano.

No dia de Natal, 15 dessas balsas foram interceptadas no arquipélago de Florida Keys, onde dezenas de cubanos chegam todas as semanas.

Mariana de la Caridad Fernández fez essa travessia em novembro. Esta jovem de 20 anos e sua irmã Yaneris, de 31, foram condenadas em Cuba a quatro anos de prisão domiciliar e sete de prisão, respectivamente, por participarem das manifestações de 11 de julho de 2021.

Depois dessa sentença, elas se esconderam por um mês e decidiram ir para Miami, onde mora a mãe, para evitar a detenção.

Sua viagem entre Cojimar, nos arredores de Havana, e Marquesas Keys, na Flórida, durou 16 horas. Estavam com seu cachorro, Toby, e outras 40 pessoas. O mar estava calmo.

“Entramos um pouco em pânico quando chegamos de madrugada e tivemos que descer do barco e nadar para chegar à terra”, relata Fernández.

Uma patrulha de fronteira deteve imediatamente as irmãs, mas as libertou logo depois com a palavra de que compareceriam perante um juiz, e agora elas querem pedir asilo político. Após um ano e um dia nos EUA, poderão legalizar sua situação graças à Lei de Ajuste Cubano, um benefício que permite aos cubanos solicitar residência legal.

Outros não têm tanta sorte. Balsas interceptadas no mar pela Guarda Costeira americana são rapidamente repatriadas a Cuba, a menos que as pessoas provem que suas vidas correm perigo.

Desde 1º de outubro, a Guarda Costeira deteve 3.724 cubanos, mais da metade de todos os presos entre outubro de 2021 e o mesmo mês de 2022.

E há também os migrantes cubanos que morrem no mar, cujo número é desconhecido.

Em abril, um barco com 14 homens virou três dias depois de deixar Playa Jibacoa, a cerca de 60 quilômetros de Havana. Apenas cinco conseguiram nadar de volta para Cuba.

O sobrinho de Miriela, uma cubana que prefere não revelar seu sobrenome, desapareceu nesse naufrágio. “Não ter notícias do paradeiro dele nos causa sofrimento”, diz.

Em Miami, González, em liberdade condicional, espera poder se beneficiar da Lei de Ajuste Cubano.

“Em oito meses já tenho o que não tinha em Cuba”, afirma. “Não é apenas o conforto material, é que você pode enxergar um futuro.”

Agence France-Presse

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