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Coreia do Norte afirma que soldado dos EUA desertou para fugir de abusos e racismo

O soldado deveria retornar aos Estados Unidos em julho, mas fugiu do aeroporto, se aproximou de um grupo que visitava a zona desmilitarizada

Redação Jornal de Brasília

16/08/2023 7h50

A imprensa estatal da Coreia do Norte afirmou que o soldado Travis King “entrou ilegalmente” no país para fugir dos maus-tratos e da discriminação racial dentro do Exército americano”, na primeira confirmação oficial de Pyongyang sobre o caso.

O soldado deveria retornar aos Estados Unidos em julho, mas fugiu do aeroporto, se aproximou de um grupo que visitava a zona desmilitarizada que divide a península e atravessou a fronteira para a Coreia do Norte.

King, 23 anos, deveria enfrentar medidas disciplinares nos Estados Unidos, depois de se envolver em uma briga em um bar, protagonizar um incidente com a polícia e passar um breve período detido na Coreia do Sul.

O governo dos Estados Unidos já havia informado que King atravessou a fronteira de forma intencional e sem autorização, mas até o momento Pyongyang não havia confirmado oficialmente a presença do militar.

“Travis King admitiu que entrou ilegalmente no território da RPDC”, afirmou a agência estatal de notícias KCNA, utilizando a sigla do nome oficial do país, República Popular Democrática da Coreia.

“Durante a investigação, Travis King confessou que decidiu vir para a RPDC porque se ressentia dos maus-tratos e da discriminação racial dentro do Exército americano”, acrescenta a nota.

King “chegou a ser mantido sob o controle de soldados do Exército Popular da Coreia”, segundo a agência.

“Também expressou a vontade de buscar refúgio na RPDC ou em um terceiro país, dizendo que estava desiludido com a sociedade americana desigual”, ressaltou a KCNA.

O governo dos Estados Unidos não tem nenhuma ligação diplomática formal com a Coreia do Norte e, desde que este país fechou as fronteiras no início da pandemia, muitas embaixadas com presença em Pyongyang retiraram seus diplomatas do país.

O Comando das Nações Unidas, que supervisiona o armistício que acabou com as hostilidades da guerra da Coreia (1950-1953), informou em julho que havia iniciado discussões com Pyongang sobre o caso.

O secretário de Estado americano, Antony Blinken, afirmou que um contato havia sido estabelecido com os norte-coreanos, mas que não era possível saber a situação do soldado.

Oportunidade de propaganda

Soo Kim, ex-analista da CIA e diretora de práticas políticas de LMI Consulting, declarou à AFP que o anúncio norte-coreano sobre King é pura propaganda.

“A entrada de King na Coreia do Norte ofereceu ao regime de Kim Jong Un uma oportunidade em vários sentidos. A primeira delas é, certamente, a possibilidade de negociar com os Estados Unidos a libertação de King”, disse.

Os norte-coreanos são “negociadores duros”, o que significa que não será fácil para Washington conseguir a libertação, acrescentou a analista.

O país liderado por Kim Jong Un tem uma longa história de detenção de americanos para utilizá-los como moeda de troca em negociações bilaterais.

“Também é uma oportunidade para a propaganda do regime: aproveitar a situação para criticar os Estados Unidos e expressar a profunda hostilidade de Pyongyang em relação a Washington”, acrescentou.

Pouco antes de confirmar a detenção de King, a agência KCNA acusou os Estados Unidos de “impor padrões de direitos humanos pouco éticos a outros países e de fomentar distúrbios e confusão interna”.

Para Vladimir Tikhonov, professor de Estudos Coreanos na Universidade de Oslo, o fato de King ser negro tem um “certo valor de propaganda para os norte-coreanos”.

“O racismo dos brancos e os maus-tratos aos negros é um ponto que a propaganda norte-coreana tende a enfatizar”, disse à AFP.

A detenção acontece em um dos piores momentos nas relações entre as duas Coreias, com o Norte estimulando o desenvolvimento de armas nucleares e o Sul intensificando os exercícios militares com os Estados Unidos na região.

Os dois países permanecem tecnicamente em guerra, depois que o conflito dos anos 1950 terminou com um armistício, e não um tratado de paz.

A maior parte da fronteira é fortemente vigiada, mas na Área de Segurança Conjunta (JSA, sigla em inglês), a fronteira é demarcada apenas por uma divisão de concreto baixa, o que a torna relativamente fácil de atravessar, apesar da presença de soldados dos dois lados.

© Agence France-Presse

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