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Mundo

‘Colocam preço em tudo’: crime organizado ataca o bolso dos mexicanos

A ameaça é tal que os carregamentos de limão saem escoltados pela polícia até diferentes locais do país

Redação Jornal de Brasília

27/09/2023 12h29

Foto: ALFREDO ESTRELLA / AFP

Dois lotes abandonados se destacam entre imensas plantações de limão e banana em Apatzingán, México. Seus proprietários preparavam a terra para semear, mas preferiram fugir quando o crime organizado chegou para extorqui-los.

Neste município agrícola do estado de Michoacán (oeste), como em muitos outros do México, os criminosos atuam como verdadeiras forças de mercado, ao impor cotas a produtores e intermediários que afetam os bolsos de milhões de consumidores.

A ameaça é tal que os carregamentos de limão saem escoltados pela polícia até diferentes locais do país, observou a AFP. A situação fez os preços dispararem.

Apesar do aumento da produção nacional e da desaceleração da inflação até 4,44% em setembro, o preço da fruta subiu 58,5% no último ano, segundo o Grupo Consultor de Mercados Agrícolas (GCMA).

“Está nas nuvens. Compro apenas a quantidade que vou consumir na semana, quatro ou cinco unidades, e só”, disse Gabriela Jacobo, de 53 anos, em Morelia, capital de Michoacán.

O sacrifício é grande em um país onde o limão reina em sua gastronomia.

A alta é percebida na Cidade do México, que costuma ficar longe da violência do narcotráfico e recebe produtos de várias regiões. O preço duplicou a quase 4,5 dólares por quilo em agosto (cerca de 22 reais).

“Não é uma questão de oferta”, mas de extorsões, explica Juan Carlos Anaya, analista da consultoria GCMA, que monitora o setor.

Desabastecimento

Michoacán vive sob a ameaça do cartel Jalisco Nueva Generación (CJNG) – principal máfia mexicana – e grupos como Los Viagras e La Familia Michoacana. Além do narcotráfico, eles são financiados com extorsões.

Os produtores devem pagar o equivalente a 11 centavos de dólar por quilo (54 centavos de real) que vendem às empacotadeiras. Seria irrisório, mas a região é capaz de produzir diariamente cerca de 900 toneladas do fruto.

Produtores de tomate, banana e manga, além de transportadores e distribuidores, também são afetados. “Colocam preço em tudo”, afirma um empresário sob anonimato.

A extorsão e o roubo custam às empresas do país cerca de 120 bilhões de pesos (6,8 bilhões de dólares, 33 bilhões de reais) ao ano, equivalente a 0,67% do PIB de México, segundo dados oficiais.

Em Chiapas (sul), onde no fim de semana um inédito desfile de membros do Sinaloa foi aplaudido por moradores, as extorsões e a violência provocaram desabastecimento na fronteira com a Guatemala.

“Faltam luz, Internet, alimentos, água e gás”, declarou um morador à AFP.

O Sinaloa e o CJNG estão em guerra na região, o que motivou o fechamento de dezenas de estabelecimentos comerciais e obriga a população a se abastecer na Guatemala, com preços maiores.

“Estamos no fundo do poço”

Uma ameaça contra um inspetor sanitário americano em Michoacán levou à suspensão temporária de exportações de abacate dos Estados Unidos no ano passado. Os produtores também sofreram extorsões.

Para enfrentar a criminalidade, produtores de limão, como Hipólito Mora, fundaram em 2013 grupos de autodefesa que acabaram acusados de vínculos com criminosos.

Seu grupo foi dissolvido, mas Mora continuou denunciando os traficantes, até que em junho foi morto a tiros em La Ruana (Michoacán), recentemente atacada com drones.

“Estamos no fundo do poço com o cartel que está lá. Nos cobram cotas para tudo: para a cesta básica, refrigerantes, cervejas, frango. Tudo está muito caro por causa deles”, disse Guadalupe Mora, irmão de Hipólito, escoltado por guarda-costas.

O promotor Rodrigo González, titular de uma unidade que investiga estes crimes em Michoacán, pede aos “cidadãos que se aproximem” para denunciar. Porém, muitos temem ter o mesmo destino de Hipólito.

© Agence France-Presse

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