O preço do arroz e do feijão aumentou mais do que o da cerveja e do cigarro nos últimos anos, segundo estudo do economista e professor da Strong Business School, Valter Palmieri Júnior. A tributação desses produtos será alterada pela reforma tributária proposta pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, atualmente em discussão no Congresso Nacional.
O estudo, realizado para a ACT Promoção de Saúde, organização que defende a saúde e a alimentação saudável, comparou os custos desses produtos para o consumidor final, é o que informa o jornal O Estado de São Paulo.
Os dados mostram que o cigarro teve um aumento de preço maior que os alimentos até 2016. Após esse ano, no entanto, o preço do cigarro estabilizou, enquanto o dos alimentos continuou a subir. Desde 2017, o preço mínimo do cigarro, estabelecido em R$ 5,00 por maço, não foi mais ajustado. Em contrapartida, os alimentos passaram a ter aumentos maiores para o consumidor brasileiro.
Entre janeiro de 2017 e maio de 2024, o preço do arroz quase dobrou (aumento de 99,5%), enquanto o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) geral subiu 45% no período. A cerveja teve um aumento menor, de 36,3%, e o cigarro subiu apenas 28,8%.
“O aumento no preço do arroz e do feijão é preocupante, pois são alimentos essenciais e não possuem substitutos baratos. Isso afeta diretamente o poder de compra das famílias mais pobres”, explica o economista. “Já a cerveja e o cigarro, produtos cujos tributos não cobrem os custos sociais que geram para a saúde pública, não sofreram aumentos tão expressivos.”
Em 2016, com o valor de 30 maços de cigarro (R$ 150), era possível comprar 57,4 quilos de arroz. Hoje, esse valor compra apenas 32,5 quilos. O preço do arroz, em comparação ao tabaco, pesa mais no bolso do consumidor do que no passado.
A proposta de reforma do governo inclui arroz e feijão na cesta básica, isentos de impostos. Já bebidas alcoólicas e cigarro foram incluídos no Imposto Seletivo, apelidado de “imposto do pecado”, com maior tributação. O objetivo é desonerar alimentos básicos e tributar mais itens prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, para reduzir o consumo.
A Câmara deve votar o primeiro projeto de regulamentação da reforma tributária, que define os produtos taxados pelo Seletivo, em julho, antes do recesso parlamentar. As alíquotas desse tributo serão definidas posteriormente, em outro projeto de lei.
Entre 2017 e 2023, o preço da cerveja consumida em domicílio aumentou 32,8%, enquanto o preço da alimentação em domicílio subiu 54,4%. Essa diferença sugere um aumento maior no custo-benefício da cerveja, um produto nocivo à saúde, em comparação aos alimentos essenciais.
Em abril de 2024, um pacote de 5 quilos de arroz custava R$ 35, enquanto uma caixa de 12 latas de cerveja era vendida por R$ 41,88. Se os preços tivessem variado de forma inversa, o arroz custaria R$ 16,57 e a cerveja R$ 88,41. O preço de 1 quilo de feijão cairia de R$ 10,29 para R$ 7,73.
“As pessoas têm o direito de consumir o que desejam, mas os preços devem refletir os custos sociais e ambientais gerados em termos de saúde pública”, afirma Valter Palmieri Júnior.
O presidente-executivo do Sindicato Nacional da Indústria da Cerveja (Sindicerv), Márcio Maciel, argumenta que a cerveja brasileira já enfrenta a maior carga tributária da América Latina e que o setor não pode absorver novos aumentos sem impactar a produção.
“É crucial, em um cenário de inflação crescente, manter a carga tributária atual, por meio da tributação progressiva por teor alcoólico. Isso permite previsibilidade ao setor produtivo, promovendo novos investimentos que ampliam a oferta de produtos, reduzem a inflação e geram emprego e renda no país”, afirma Maciel.
A proposta enviada pela equipe econômica prevê a taxação proporcional à quantidade de álcool na bebida, o que desagrada o setor de destilados.
A Associação Brasileira da Indústria do Fumo (Abifumo) não quis se manifestar.
Por que o arroz e o feijão subiram mais do que a cerveja e o cigarro?
Segundo o economista, a evolução dos preços está diretamente ligada às condições de produção no Brasil. Os produtos rurais passaram a ter mais incentivos e lucratividade para produzir grãos como soja e milho, em detrimento do feijão e do arroz. Além disso, os custos de produção de tabaco e cerveja foram menores, mesmo com tributação mais alta em comparação com outros países.
Entre 2016 e 2024, o custo de fabricação de alimentos aumentou 80,3%, enquanto o custo de produção de cigarros subiu 24,1%. “A produção de tabaco no Brasil é a mais barata do mundo. Sem tributação, o cigarro brasileiro seria o mais barato do mundo. A indústria da cerveja também consegue ajustar a composição do produto conforme os custos”, diz Palmieri Júnior.
Para o pesquisador, a reforma tributária proposta no Congresso minimiza esses problemas, mas não é suficiente. É necessário alterar as condições de produção para que alimentos saudáveis sejam mais vantajosos para agricultores e consumidores. “A tributação é apenas um componente do preço. É preciso incentivar a produção e ajustar esses incentivos para os produtores rurais. É necessário tornar esses produtos mais baratos, mas sem reduzir a lucratividade dos produtores.”
Estadão Conteúdo