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Economia

Pequenas empresas fecham as portas sem acesso a crédito

Segundo dados da Serasa, os pedidos de falência chegaram a quase dobrar em março deste ano em comparação com o mesmo período do ano passado

Redação Jornal de Brasília

14/06/2021 13h13

Comércio de rua em Brasília.

Fernanda Brigatti
São Paulo, SP

As dificuldades já comuns às empresas menores foram agravadas pelo prolongamento da pandemia. Para alguns setores, nem mesmo a flexibilização das restrições garantiu algum alívio para a geração de caixa. Para a empresária Alessandra Pedroni, 49, os últimos 15 meses têm sido de sufoco, acúmulo de dívidas, corte de despesas e nenhuma ajuda, seja dos governos, em forma de descontos ou isenções, seja via financiamento bancário.

Dona de dois buffets infantis na capital paulista, ela viu a renda cair a praticamente zero da noite para o dia.
Piscina de bolinha, escorregador, mini-cozinha: os principais atrativos do negócio, afirma Alessandra, estão interditados.

“São 15 meses praticamente sem trabalho. Hoje eu consigo cerca de 20% do que eu faturava”, diz a empresária.
Para manter um nível mínimo de renda, Alessandra passou a administrar as redes sociais de empresas de amigos e mantém um serviço de entrega de refeições, utilizando a cozinha de um dos buffets para a produção. Nesse período, os filhos da empresária deixaram a escola particular em que estudavam e o plano de saúde já foi alterado por duas vezes, na tentativa de reduzir a despesa.

“Nosso setor não teve ajuda nenhuma. Teve o Pronampe [linha de crédito voltada a pequenas empresas] e o governo [de São Paulo] anunciou um programa para o segmento de turismo e eventos, mas não pode ter o nome sujo [para acessar]. Como que eu fico todo esse tempo sem trabalhar e ainda tenho nome limpo?”, questiona.

O Pronampe (Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte) foi lançado o ano passado pelo governo e tornado permanente em 2021. Os bancos emprestam o dinheiro, mas os recursos são garantidos pelo FGO (Fundo Garantidor de Operações), que teve aumentada a participação da União.

Segundo dados da Serasa, analisados pelo especialista em recuperação de crédito Max Mustrangi, os pedidos de falência no setor de serviços chegaram a quase dobrar em março deste ano na comparação com o mesmo período de 2020, início da pandemia no Brasil.

Em abril, a alta observada foi de 5% em relação a igual mês do ano anterior e, em fevereiro, 20,9%, na mesma base de comparação. Somente em janeiro, houve queda de 50% ante o mesmo mês no ano passado. Mustrangi diz que os números do birô de crédito indicam um aumento na participação de empresas médias no total das falências e pedidos de recuperação judicial. De 18,1% no primeiro quadrimestre de 2020, elas hoje respondem por 25,7% do total.

Para o especialista, o resultado vem da ausência de esforço governamental para proteger os negócios nesse período turbulento. O cálculo de risco dos bancos, em situações de crise, também foi para uma calibragem mais alta, o que acaba favorecendo quem, contraditoriamente, precisa menos do dinheiro. “Só vem conseguindo crédito quem já estava bem posicionado na análise dos bancos”, afirma. Além disso, programas como o Pronampe tiveram alcance limitado devido à duração da pandemia. “Quando chegou a hora de as empresas pagarem, estávamos de novo em situação ruim.”

A demanda por crédito, segundo a Serasa, tem oscilado de acordo com as medidas de fechamento ou abertura impostas por governos estaduais e municipais. De abril a novembro de 2020, houve queda na procura. Subiu a partir de novembro e voltou a cair em janeiro. A partir de fevereiro, porém, a demanda por dinheiro voltou a crescer. Na comparação com o ano passado, o aumento foi de 12,7%. Em março, foi de 10,9%, e de 39,3% em abril.

Mesmo quem manteve o nível de faturamento do pré-pandemia viu a disponibilidade de crédito encolher. Um executivo de uma empresa de mineração e beneficiamento de minerais não metálicos, que prefere não se identificar, diz que o custo do dinheiro ficou muito alto.

Segundo ele, mesmo nos bancos que anunciaram facilidades para a concessão de linhas de crédito, o dinheiro não saiu. Sem o mesmo nível de acesso a crédito para capital de giro, as margens começaram a ficar apertadas. Para ele, as instituições financeiras priorizam a avaliação de patrimônio que possa ser usado como garantia dos empréstimos, e não a qualidade da operação comercial.

Uma vez acostumados a certo nível de crédito, diz ele, um corte brusco prejudica a capacidade de manter a operação. Para garantir capital de giro, foi necessário vender patrimônio. A solução tomada no início deste ano foi iniciar uma reestruturação do negócio. O executivo afirma que a empresa passa por mudança em todos os setores (contabilidade, administração e gestão tributária), uma necessidade para seguir em atividade.

Mustrangi diz que a procura de empresas por reestruturação mais do que triplicou. “Em dez anos trabalhando com isso, nunca tive tanta empresa buscando o serviço”, diz. “A situação está tão crítica que muitas estão indo direto para a falência, sem condições de recuperação judicial”, afirma.

De acordo com o especialista, também houve um aumento da participação de empresas consideradas de médio porte, com faturamento anual acima de R$ 50 milhões, entre as que precisam de ajuda para evitar uma recuperação judicial.
“As grandes conseguiram se proteger. Entre as micro e pequenas, os pedidos [de falência e recuperação] explodiram ainda no ano passado. Agora são as médias que começam a entrar em risco de quebrar”, afirma. No último ano, empresas consolidadas no varejo pediram recuperação judicial, como a TNG, a Cavalera e a Le Postiche.

Segundo a Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) Contínua, do IBGE, o Brasil perdeu, no primeiro trimestre deste ano, 489 mil empregadores formalizados em relação ao mesmo período em 2020. A redução percentual é de 13%.

Houve queda também em relação ao último trimestre do ano passado. De 3,2 milhões de empregadores, para 3 milhões até março de 2021.

Na avaliação do presidente do Simpi (Sindicato das Micro e Pequenas Indústrias), Joseph Couri, os dados de falências e recuperação judicial registrados pela Serasa e na Junta Comercial ainda não representam a real situação das empresas, pois muitas estão sem condições até mesmo de encerrar as atividades. “A baixa da empresa é a última fase do fechamento. Leva cinco, seis meses até que o empresário consiga fazer isso. A menos que ele opte pela via rápida, em que ele assume responsabilidades futuras e coloca seus bens como garantia, mas nós desaconselhamos usar esse caminho.”

As informações são da Folhapress

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