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Economia

Ainda minoria, mulheres tentam ampliar presença no segmento imobiliário

Ao todo 40% das 803 mulheres ouvidas relataram episódios de assédio sexual, 28%, de assédio moral e 21%, de machismo

Marcus Eduardo Pereira

27/03/2022 11h33

Formada em Comunicação e atuando como corretora há 1 ano, Gisela Araújo fala sobre o boom do mercado imobiliário

Dois grupos de mulheres do setor de construção comandam iniciativas para mudar a dominância masculina entre as lideranças do segmento.

Fundado em 2019 pela arquiteta Elisa Tawill, autora do livro “Proprietárias –a ascensão da liderança feminina no setor imobiliário” (Maquinaria Editorial, 192 págs., R$ 27,92), o Mulheres no Imobiliário reúne cerca de 700 profissionais.

O grupo debate sua participação no mercado e ajuda outras mulheres a ingressarem no setor, com capacitação gratuita para aquelas que perderam o emprego durante a pandemia e desejam se tornar corretoras de imóveis.

Uma pesquisa realizada pelo grupo em janeiro de 2021, em parceria com a DataStore, constatou que 61% das profissionais do mercado imobiliário já passaram por situações no trabalho em que se sentiram ofendidas ou constrangidas.

Ao todo 40% das 803 mulheres ouvidas relataram episódios de assédio sexual, 28%, de assédio moral e 21%, de machismo.

A pesquisa também mostrou que, entre as profissionais que são mães, 44% relataram dificuldade para retomar o trabalho após a licença-maternidade.

“São ambientes que foram historicamente preenchidos por homens”, diz Tawill, que ressalta a prevalência de profissionais vindos de cursos de engenharia, economia e direito no setor imobiliário.

O GRI, clube do mercado imobiliário que reúne os principais executivos de empresas do setor, também percebeu que tinha pouca representatividade feminina e decidiu agir. No ano passado, foi criado o GRI Women in Real Estate Brazil Committee (Comitê Brasil das Mulheres de Real Estate).

“Em 2019, tínhamos no máximo 30 mulheres em um evento com 450 pessoas, por muito tempo fui uma das poucas mulheres nas reuniões”, afirma Patrícia Frazatto, diretora do GRI e responsável pelo comitê.

O grupo, que hoje reúne 50 executivas, visa aproximar essas mulheres e fomentar novos negócios entre elas.

“O nosso ponto principal é que se conheçam e que possamos dar holofote a elas”, explica Frazatto.

Ela também focou em aumentar o número de mulheres inscritas no clube, mesmo que ainda não façam parte do comitê. Se em 2019 eram 20, no final de 2021 já havia 169 cadastradas.

Na outra ponta do mercado, nas imobiliárias, a presença feminina já é maior. A plataforma de comercialização de imóveis EmCasa, por exemplo, possui 47% do time de vendas formado por mulheres, e elas têm apresentado performance melhor do que a de seus colegas homens –em quatro dos últimos seis meses, o profissional que mais vendeu era uma mulher.

“Isso mostra a capacidade das mulheres de se conectarem mais facilmente com as pessoas, conseguirem transmitir empatia com o cliente, o que faz com que tenham resultados expressivos no nosso mercado”, avalia Amanda Lins, diretora de pessoas da plataforma.

Renée Silveira é uma das poucas mulheres à frente de incorporadoras. Desde o início de 2019, ela é diretora de incorporação da Plano&Plano, uma das maiores do segmento econômico no país.

Há 15 anos na empresa, ela lembra que quando começou havia apenas duas mulheres em cargos de gerência –atualmente são oito, contra 14 homens– e parecia impensável ter uma mulher na função que ocupa.

“Quando assumi o cargo de diretoria, várias mulheres que trabalham aqui na empresa ou no segmento me ligaram para elogiar, vendo o quanto isso era representativo, principalmente para as estagiárias”, diz.

Silveira analisa que, em poucas gerações, as mulheres já avançaram muito em seus direitos e presença no mercado de trabalho, mas que ainda precisam se provar mais do que seus colegas para atingir os mesmos cargos e reconhecimento.

Outra questão evidente é a maternidade, conta Silveira. Decidida desde os 17 anos a não ter filhos, ela diz que sua escolha era recebida com alívio em entrevistas de emprego.

“Existe sempre essa preocupação do quanto uma mulher se dedicaria para estar em cargo de chefia.”

Ela acredita, no entanto, que há hoje uma maior disposição das empresas em promover um equilíbrio entre vida pessoal e profissional e encarar a maternidade de forma mais humanizada, o que pode ajudar mais mulheres a chegarem a posições de liderança.

Tawill lembra que iniciou o primeiro evento do Mulheres no Imobiliário já pensando no fim da iniciativa. “Abri o encontro desejando que em alguns anos o movimento não precisasse existir, que fosse algo natural”, afirma. “

No último dia 17, a fintech de crédito imobiliário Crediall lançou uma linha específica para o público feminino, a Crediall Mulher. O projeto foi feito em parceria com Tawill, e a empresa vai direcionar 2% dos ganhos para iniciativas de combate à violência doméstica.

A linha terá suporte jurídico e financeiro gratuito para as mulheres, e, de acordo com a fintech, contará com taxas abaixo de 8% ao ano.

Segundo Paulo Carrete, fundador da Crediall, a empresa está construindo um sistema de algoritmos para combater o que ele acredita ser um viés negativo na pontuação para as mulheres no mercado de crédito. Os motivos seriam o fato de as mulheres ainda ganharem menos do que os homens.

“Os bancos não falam diretamente, mas a gente percebe que, quando uma mulher compra sozinha, acaba ou tendo dificuldades para aprovar [o crédito] ou aprovando um pouco menos em relação a um homem que compra sozinho.”

Em novembro, a startup chilena Creditú também começou a oferecer crédito imobiliário para mulheres, informais e jovens no Brasil. Na época, o presidente-executivo do negócio, Ignácio Alamos, afirmou que esses grupos enfrentam maior dificuldade para acessar o financiamento por não conseguir estabilidade no trabalho.

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