Menu
Economia

A nova era de inflação e juros elevados

A ideia básica é que os países em desenvolvimento iniciam seu crescimento transferindo mão de obra de setores de baixa produtividade para indústria

Redação Jornal de Brasília

16/05/2022 5h47

Foto: Agência Brasil/ EBC

Claudio Adilson Gonçalez*

Em 1954, o economista William Arthur Lewis publicou um modelo de crescimento econômico para as economias emergentes que se tornou célebre. Em 1979, esse trabalho lhe garantiu o Prêmio Nobel de Economia. A ideia básica é que os países em desenvolvimento iniciam seu crescimento transferindo mão de obra de setores de baixa produtividade, em geral rurais, para atividades industriais, comumente exportadoras, onde a produtividade pode ser até quatro vezes maior. Enquanto houver essa abundância de mão de obra, forma-se um círculo virtuoso de aumento de lucros no setor moderno, estímulo ao investimento e elevadas taxas de crescimento econômico, que podem perdurar por décadas.

Quando o excedente de mão de obra no setor tradicional é eliminado, a transferência de trabalhadores para a indústria e serviços começa a ficar mais cara. Essa fase é chamada de “ponto de inflexão de Lewis”, que pode frear o crescimento e provocar inflação. Esse modelo se ajustou de maneira quase profética à China. Acredita-se que o gigante asiático chegou no ponto de inflexão de Lewis há cerca de 15 anos. Mas, antes disso, a importação de produtos industriais baratos foi uma das principais causas das diminutas taxas de inflação nos países desenvolvidos até anos recentes.

A grande recessão financeira global iniciada em 2008 contribuiu para manter as taxas internacionais de inflação muito baixas. Mas a era de oferta de mão de obra abundante nas economias desenvolvidas estava terminando, não só pelas mudanças estruturais da Ásia, como também pela queda da taxa de crescimento da população em idade ativa.

A ruptura das cadeias globais de valor provocada pela covid, e mais recentemente, o lockdown na China e a guerra na Ucrânia turvaram a visão dos bancos centrais, especialmente o norte-americano (Fed), que demoraram para perceber que o espetacular crescimento da inflação não era apenas decorrente de choques de oferta. O aperto no mercado de trabalho contava parte importante dessa história. Atualmente, nos Estados Unidos, há duas vagas para cada trabalhador à procura de emprego. É difícil que isso não esteja provocando por lá a conhecida espiral preços-salários.

Fenômeno semelhante, em menor intensidade, está ocorrendo em vários países europeus. Os bancos centrais responderão com aperto monetário. Por fim, a inflação poderá voltar às metas, mas esse processo não será rápido, tampouco indolor, sendo alto o risco de estagnação ou recessão em várias economias desenvolvidas.

O efeito disso para os países emergentes é perverso, principalmente pela desvalorização de suas moedas e pelo aperto das condições financeiras. O Brasil, com seu baixo potencial de crescimento, sua elevada relação dívida/PIB, com tendência de crescimento, e incertezas políticas preocupantes, é extremamente vulnerável a essas adversidades externas.

*Economista e diretor-presidente da MCM Consultores, foi consultor do Banco Mundial, subsecretário do Tesouro Nacional e chefe da Assessoria Econômica do Ministério da Fazenda

Estadão Conteúdo

    Você também pode gostar

    Assine nossa newsletter e
    mantenha-se bem informado