CAROLINA MORAES
Ainda não se sabe se será possível restaurar todas as obras de arte destruídas na invasão golpista de bolsonaristas às sedes dos Três Poderes. Os conservadores e restauradores vão ter que se esforçar muito para fazer com que os artefatos pareçam que nunca saíram de um cubo branco. Eles, no entanto, nunca mais serão os mesmos, de acordo com especialistas.
A começar pela montagem da equipe. Os técnicos costumam ser especializados em materiais, o que pode demandar uma grande quantidade de profissionais, já que o acervo destruído inclui tapeçarias, mobiliários de madeira, telas de pintura, esculturas de metal, entre outros.
Antes de tudo, os restauradores vão ter que enfrentar a umidade, já que algumas obras foram encontradas boiando na água e, quanto mais tempo um trabalho fica em contato com o líquido, mais se deteriora, de acordo com Karen Barbosa, conservadora e restauradora de bens culturais móveis.
A escultura “A Justiça”, de Alfredo Ceschiatti, que sofreu pichações no Supremo Tribunal Federal, vai ainda ter que passar por um processo de retirada de tinta. Barbosa explica que a superfície da obra não é plana, o que pode dificultar o trabalho, já que o spray deve ter se entranhado na porosidade do granito.
Há ainda o painel de Di Cavalcanti, “Mulatas”, perfurado em seis pontos. A grande estrela entre as obras danificadas teve suas fibras rompidas e os fios retorcidos abruptamente, de maneira não linear, de acordo com Valéria Mendonça, conservadora e restauradora. “O restauro é muito mais complexo do que no caso de um corte reto, onde você tem uma maneira mais fácil de unir os fios”, diz.
A partir do verso da obra, os restauradores poderão juntar e retecer os fios um a um, ou então fazer um processo com sutura cirúrgica. Os rasgos também fizeram o tecido perder sua tensão e seu equilíbrio, que precisam ser reestabelecidos. “Numa tela grande, o linho deve ser grosso. É preciso tanto na trama quanto na urdidura dar sustentação à tela”, diz Mendonça.
Ela pontua, aliás, que outra tapeçaria de Di Cavalcanti desbotada -por descuido da gestão de Jair Bolsonaro, segundo o governo Lula- já havia causado choque entre restauradores. Isso porque a descoloração do tecido, diz, não pode ser recuperada.
“Mulatas” deu mais sorte. Sua pigmentação pode ser tratada, numa reintegração cromática. “Na restauração, o que se usa são pigmentos que não são da tinta do artista”, diz ela. “Você mimetiza as cores iguais, as que são aquelas lacunas, aquelas partes faltantes.”
O importante é que o processo não demore a começar. “Restaurar o mais rápido possível é importante porque às vezes a tela encolhe. Se estiver muito esticava, a tensão solta”, afirma Eneida Parreira, restauradora especializada em pintura.