Menu
Brasil

Pesquisador estuda impacto da pandemia em médicos residentes

A pesquisa Narrativas dos Impactos da Pandemia de Covid-19 na Vida de Residentes de Saúde encontra-se na fase de análise prévia dos depoimentos coletados

Redação Jornal de Brasília

26/04/2021 18h28

Foto: Rovena Rosa/ Agência Brasil

Rodrigo Haddad / Agência UNICEUB

O pesquisador Ricardo Massuda Oyama, que estuda a Saúde Coletiva pela Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP, iniciou um estudo para compreender de que forma os residentes estão absorvendo as experiências de trabalho durante a crise sanitária atual.

Oyama é formado em psicologia com residência em Saúde da Família. Ele atuou como psicólogo social e coordenador no Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) e também em atuação clínica na Rede de Reabilitação Lucy Montoro. Atualmente, o pesquisador equilibra o mestrado com atendimentos no Centro de Atenção Psicossocial (Caps) e em consultório particular.

A maioria das pesquisas mostraram um cenário preocupante nos níveis de estresse entre os profissionais de saúde, mas não abordam de que maneira o trabalho extenuante física e emocionalmente impacta a vida dentro e fora dos hospitais. Por isso, Oyama quer saber “quais sentidos estão sendo atribuídos pelos residentes através da experiência em se trabalhar e estudar durante o período de pandemia e também as implicações em sua vida no geral.”

A pesquisa Narrativas dos Impactos da Pandemia de Covid-19 na Vida de Residentes de Saúde encontra-se na fase de análise prévia dos depoimentos coletados. No entanto, é possível apontar um grau de frustração dos residentes nos resultados parciais.

“Os impactos da pandemia se dão tanto em relação às expectativas que tinham ao ingressar nos programas de residência, onde os residentes foram pegos desprevenidos e não tiveram tempo para se preparar emocionalmente para o que estavam prestes a enfrentar em sua formação devido ao medo gerado na atuação da linha de frente no combate à pandemia, quanto às diferentes formas de enfrentamento por cada profissional de saúde residente”, afirma Ricardo Oyama.

Apesar do maior risco de infecção e adaptações aos programas de residência, o pesquisador enxerga na pandemia uma oportunidade de crescimento pessoal e profissional dos médicos residentes e fortalecimento do SUS.

“Acredito que a situação atual de emergência em saúde pública vai contribuir e muito na formação dos profissionais de saúde, uma vez que os Programas de Residência surgiram com o propósito de formar profissionais para o SUS, preparados para atuar nas mais diversas situações, proporcionando um cuidado integral, universal e equânime. A pandemia está ensinando a todos nós que o SUS é essencial e precisa ser valorizado e é preciso investir nele.”

Enfrentamento

Aumento no número de mortes, falta de equipamentos e de insumos, ausência de estrutura adequada, fluxo intenso de internações e longas jornadas de trabalho contribuíram para a insegurança e o estresse dos profissionais de saúde no Brasil em 2020. Os médicos residentes, mesmo com pouca experiência, precisam lidar com as condições adversas impostas pela pandemia de Covid-19 durante a formação profissional.

As dificuldades foram listadas na ampla pesquisa Condições de Trabalho dos Profissionais de Saúde no Contexto da Covid-19, realizada pela Fiocruz em todo o território nacional. É quase unânime o entendimento que a pandemia afetou de modo significativo o trabalho de profissionais de saúde e metade dos entrevistados indicaram excesso de trabalho.

As alterações mais citadas no levantamento foram insônia (15,8%), irritabilidade (13,6%), estresse (11,7%), dificuldade de concentração (9,2%), perda de satisfação na carreira (9,1%), pessimismo em relação ao futuro (8,3%) e falta de apetite (8,1%).

O medo de se infectar com o novo coronavírus é relatado por 43,2% dos entrevistados. O principal motivo apontado por 23% dos profissionais é a escassez ou inadequação de equipamentos de proteção individual (EPIs). Cerca de 64% das pessoas envolvidas diretamente no combate à Covid-19 precisaram improvisar equipamentos.

A pesquisa teve 25 mil participantes, dos quais 16 mil são ligados à área de saúde. As outras categorias ouvidas incluem técnicos, auxiliares e trabalhadores de nível médio.

O medo é justificado e traduzido em número de mortes no Brasil. Em 2020, foram no total mais de 1,4 milhão de mortes no país, o maior número registrado ao longo de um ano pela Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen-Brasil), entidade que representa os cartórios. A diferença em relação ao ano anterior é de aproximadamente 190 mil óbitos, similar ao número de mortes por Covid em 2020. Segundo o ministério da Saúde, a doença matou 195,4 mil pessoas até o dia 1º de janeiro de 2021.

Os profissionais de saúde, na linha de frente de combate ao coronavírus, também são vítimas da doença. Segundo dados da Arpen-Brasil, de março de 2020 à fevereiro de 2021, morreram no país 1.411 profissionais de saúde por Covid. O levantamento inclui profissionais da área de biomedicina, educação física, enfermagem, farmácia, fisioterapia, odontologia, psicologia, radiologia, nutrição, gestão hospitalar, estética e cosmética e ciências biológicas.

Residentes no Brasil

Na formação médica, é recorrente o profissional recém-formado iniciar uma residência logo após a graduação, por meio de processo seletivo e chamamento público. Os programas de residência visam tanto a qualificação quanto o desenvolvimento do sistema de saúde e possuem duração entre 2 e 5 anos.

Em 2019, havia 53.776 residentes entre os 502.475 médicos do país. Ou seja, praticamente um a cada dez médicos estava em um programa de especialização. Do total de residentes em 2019, mais de um terço dos médicos estavam no 1° ano do programa de especialização. Os dados detalhados estão na pesquisa Demografia Médica no Brasil 2020, publicada em dezembro de 2020 pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) e a Universidade de São Paulo (USP).

Mas não há vagas em programas de residência para todos que se formam em medicina. Em 2019, havia oportunidade de especialização para 79% dos novos CRMs registrados no ano. A taxa de 100% de vagas para recém-formados chegou a ser estabelecida pelo Programa Mais Médicos em 2013, mas foi revogada pelo novo Programa Médicos pelo Brasil, de 2019. Ainda que a universalização de vagas não tenha ocorrido, o número de residentes aumentou em 81% em dez anos, passando de 9,5 mil novos inscritos em 2009 para 17,3 mil em 2019.

A quantidade de médicos não é o maior problema para o atendimento médico no país. Com 2,4 médicos a cada mil habitantes em 2020, o Brasil possui números semelhantes aos da Coréia do Sul, Japão, México e Polônia. A taxa ainda é inferior aos 36 países que compõem a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), que possuem em média 3,5 médicos por mil habitantes.

O grande desafio do Brasil é a distribuição desigual de profissionais de saúde pelo país, provocada pela falta de infraestrutura e de centros de formação. Na região Norte do país, que sofreu colapsos no sistema de saúde, a taxa de médicos por mil habitantes cai para 1,3, muito inferior à média nacional.

O número de residentes acompanha a desigualdade. Em 2019, a região Sudeste concentrou 57,3% dos médicos residentes e o Norte do país registrou apenas 3,7% do total. Enquanto São Paulo somou 33,9% dos residentes, outras 12 unidades federativas contaram com menos de 1%. Na comparação entre zona rural e zona urbana, a diferença é enorme: 97,5% dos médicos estavam em áreas urbanas.

Distribuição de médicos cursando Residência Médica em 2019 segundo densidade por 100 mil habitantes e unidades da Federação.

Gráfico extraído da pesquisa Demografia Médica do Brasil 2020

Distribuição de médicos que cursaram Residência Médica em 2019, segundo unidades da Federação:

Gráfico extraído da pesquisa Demografia Médica do Brasil 2020

A maior parte dos programas são financiados com verba pública e as bolsas mensais são no valor bruto de R$3.330,43 para 60 horas semanais, com um dia de descanso por semana. O principal financiador é ministério da Saúde, que aloca recursos em bolsas vinculadas ao SUS. O ministério da Educação, secretarias estaduais e municipais de saúde, hospitais filantrópicos e privados também financiam programas de residência. Algumas instituições oferecem um valor extra como incentivo, mas não é comum.

Em março de 2020, o ministério da Saúde criou a Ação Estratégica “O Brasil Conta Comigo – Residentes na área de Saúde”. A intenção da medida foi ampliar a assistência médica no SUS e reduzir o tempo de espera no atendimento de pacientes infectados por Covid-19 em unidades de pronto socorro e emergências hospitalares.

No documento, o ministério da Saúde estabelece uma bonificação de R$667 aos residentes em programas financiados por órgãos públicos e entidades sem fins lucrativos enquanto permanecer a situação de emergência de saúde pública. O órgão também reforça a importância do fornecimento de equipamentos de proteção individual (EPI) e a atualização de conhecimento científico sobre a contenção da Covid-19 aos residentes.

Em portarias subsequentes, os órgãos responsáveis¹ estabeleceram carga horária de 20% do total para atividades teóricas e a adequação de recursos humanos à demanda em regiões de maior incidência da doença.

A regulação, supervisão e avaliação dos programas de residência é de responsabilidade da Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM), um colegiado vinculado ao ministério da Educação. Para cumprir suas funções, de acordo com o decreto 7.562 publicado no Diário Oficial da União (DOU) em 2011, o CNRM deve “considerar a necessidade de médicos especialistas indicada pelo perfil socioepidemiológico da população, em consonância com os princípios e as diretrizes do Sistema Único de Saúde – SUS.”

    Você também pode gostar

    Assine nossa newsletter e
    mantenha-se bem informado