Menu
Brasil

Juízes que barraram demissões na Ford viram risco de violação de direitos

Após liminares vetarem demissões, MPT espera que Ford negocie saída do país

Redação Jornal de Brasília

06/02/2021 16h18

Os dois juízes do Trabalho que suspenderam nesta sexta, 5, a possibilidade de uma demissão coletiva de funcionários da Ford que trabalham nas fábricas de Taubaté (SP) e Camaçari (BA) justificaram a medida como uma maneira de evitar possíveis violações aos direitos dos trabalhadores. A produção em ambas as sedes foi encerrada pela empresa no mês passado após a Ford anunciar o fim da produção no Brasil.

As liminares determinam que a montadora deve se abster de promover dispensa coletiva sem prévia negociação com a entidade sindical dos profissionais. Durante as negociações, a Ford também fica proibida de suspender o pagamento de salário e licenças remuneradas aos seus funcionários. Além disso, a empresa deverá apresentar em 15 dias todas as informações que sejam necessárias às negociações e à tomada de decisões pela categoria profissional.

Segundo a juíza Andréia de Oliveira, titular da 2ª Vara do Trabalho de Taubaté, a dispensa em massa de funcionários sem negociação com o sindicado ‘não contribui para a melhoria da condição social de ninguém, muito menos dos trabalhadores envolvidos’.

“A dimensão da empresa, o número de empregos diretos e indiretos atingidos e o impacto social para o País não comportam uma solução simplista para o caso”, frisou.

O juiz substituto Leonardo de Moura Landulfo Jorge, da 3ª Vara do Trabalho de Camaçari, seguiu o mesmo entendimento para barrar a dispensa coletiva na fábrica baiana. Segundo ele, uma eventual demissão em massa sem a comunicação e negociação com o sindicato ‘estará eivada de vícios intransponíveis, violando direitos constitucionais dos trabalhadores’.

“A conduta da parte ré, em não envidar todos os esforços para a concretização da efetiva negociação coletiva, quando esta se torna imprescindível, seja não fornecendo informações relevantes ou mantendo canal de diálogo de forma individual com os trabalhadores, viola frontalmente o princípio da boa fé objetiva que norteia a relação contratual”, apontou Landulfo Jorge.

Ambas as decisões fixam multa de R$ 1 milhão em caso de descumprimento e são resultado de uma atuação coletiva do Ministério Público do Trabalho (MPT). Após o anúncio da Ford no mês passado, a Promotoria criou um Grupo Especial de Atuação Finalística (Geaf) para monitorar os impactos dos fechamentos das fábricas em Taubaté, Camaçari e Horizonte (CE).

Ao Estadão/Broadcast, o procurador-geral do MPT Alberto Balazeiro afirmou que espera que as duas decisões levem a montadora a ‘sentar na mesa’ para a negociação.

“O que buscamos é a negociação. O que a Ford fez até agora não foi negociar. Uma negociação não pode começar com a demissão de todo mundo”, afirmou Balazeiro. “Não se trata apenas da questão trabalhista daquele grupo de funcionários, mas do dano a toda uma cadeia produtiva e à sociedade. São questões maiores como a preservação da empregabilidade, a utilização de um volume expressivo de recursos públicos e um dano social de grande envergadura”, completou.

A Ford já havia encerrado, em 2019, a produção de caminhões em São Bernardo do Campo (SP), no ABC Paulista. Em Camaçari eram produzidos os modelos EcoSport e Ka; em Taubaté, motores; e em Horizonte eram montados os jipes da marca Troller.

A montadora planeja manter no Brasil somente a sede administrativa, em São Paulo, o centro de desenvolvimento de produto, na Bahia, e o campo de provas de Tatuí (SP). A estimativa da própria empresa é que 5 mil funcionários seriam impactados com a mudança.

MPT espera que Ford negocie saída do país

As duas decisões liminares publicadas na noite desta sexta-feira, 5, que impedem a Ford de demitir seus funcionários nas fábricas de Camaçari (BA) e Taubaté (SP) foram comemoradas pelo Ministério Público do Trabalho (MPT). Autor das duas ações, o órgão espera que a partir de agora a multinacional “sente à mesa” para negociar de fato uma reparação aos danos causados pela sua saída do País.

“O que buscamos é a negociação. O que a Ford fez até agora não foi negociar. Uma negociação não pode começar com a demissão de todo mundo”, afirmou ao Estadão/Broadcast o procurador-geral do MPT, Alberto Balazeiro. “Não se trata apenas da questão trabalhista daquele grupo de funcionários, mas do dano a toda uma cadeia produtiva e à sociedade. São questões maiores como a preservação da empregabilidade, a utilização de um volume expressivo de recursos públicos e um dano social de grande envergadura”, completou.

No dia 11 de janeiro, a montadora americana anunciou o fechamento das fábricas em Camaçari (BA), onde produz os modelos EcoSport e Ka; Taubaté (SP), que produz motores; e Horizonte (CE), onde são montados os jipes da marca Troller. Segundo a Ford, o encerramento da produção nas três cidades afetará cerca de 5 mil funcionários, mas o MPT estima que mais de 122 mil pessoas podem perder o emprego, considerando a cadeia de fornecedores de peças e serviços à companhia.

“Todo mundo foi pego de surpresa, não houve nenhum tipo de aviso da Ford a ninguém. A empresa precisa entender que tem responsabilidade sobre todo o entorno. Camaçari e Taubaté giram em torno da fábrica, há toda uma cadeia de fornecedores. E o Estado brasileiro investiu muito para que essa cadeia existisse, com incentivos tributários – federais, estaduais e municipais – além de empréstimos do BNDES”, afirmou Balazeiro.

Desde o anúncio da Ford no mês passado, o MPT formou um grupo de trabalho para acompanhar os desdobramentos do fechamento das fábricas nos três Estados. Apesar de uma reunião com executivos da empresa no dia 14 de janeiro, o órgão reclama que a Ford não tem sido transparente sobre o encerramento das atividades no Brasil.

“A empresa precisa criar um plano de desmobilização. Falta transparência. Demos dez dias para que apresentassem esse plano e a Ford pediu mais 30 dias. Enquanto isso, demitiriam os funcionários e chegaram a anunciar o encerramento total das atividades em 18 de fevereiro. Deixamos a porta aberta para a Ford e até hoje não recebemos um documento básico. É impossível começar uma negociação coletiva com essa assimetria de informação”, acrescentou o procurador-geral do Trabalho.

Segundo ele, as liminares tratam apenas das fábricas de Camaçari e Taubaté porque a Ford ainda não divulgou uma data para o encerramento das atividades em Horizonte. “Ninguém quer forçar uma empresa a ficar no País, mas a companhia precisa entender que o impacto de sua saída é muito maior. Na França, a Ford pagou 20 milhões de euros como indenização trabalhista ao desmobilizar uma fábrica com 800 funcionários”, citou.

O procurador reclamou ainda do que chamou de “assédio negocial” da empresa, que estaria buscando individualmente os funcionários para oferecer o pagamento de indenizações trabalhistas – por fora da negociação coletiva com os sindicatos. “No meio desta pandemia, é como oferecer um bote para quem está se afogando no meio do mar. Mas o MPT quer mostrar que o papel da Ford vai além de simplesmente pagar as verbas rescisórias aos próprios funcionários. O Estado brasileiro se sentiu violentado”, concluiu Balazeiro.

Estadão Conteúdo

    Você também pode gostar

    Assine nossa newsletter e
    mantenha-se bem informado