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Brasil

Indígenas do Amapá e Pará comemoram negativa do Ibama para exploração de petróleo

Para a Apoinp e o CCPIO, a Petrobras não apresentou um estudo de impactos sociais adequado diante do inevitável crescimento populacional que ocorreria em Oiapoque (AP)

FolhaPress

02/06/2023 9h59

JORGE ABREU
MACAPÁ, AP

A negativa do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) para a exploração de petróleo na Foz do Amazonas foi recebida com comemoração por entidades indígenas do Amapá e do Pará, assim como por ONGs internacionais de preservação da natureza que atuam na região.

A Apoinp (Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Amapá e Norte do Pará), o CCPIO (Conselho de Caciques dos Povos Indígenas do Oiapoque), o Greenpeace, o WWF e o Observatório do Clima manifestam preocupação, desde antes da negativa, em relação à falta de informações para as comunidades que podem ser afetadas pelo projeto de perfuração da bacia.

Para a Apoinp e o CCPIO, a Petrobras não apresentou um estudo de impactos sociais adequado diante do inevitável crescimento populacional que ocorreria em Oiapoque (AP), município localizado no extremo norte, na fronteira do Brasil com a Guiana Francesa, onde se concentra a maior parte da população indígena do Amapá.

As entidades lançaram uma nota conjunta “contra projetos de exploração que desrespeitam o direito à consulta livre, prévia e informada, garantido pela Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho) sobre povos indígenas e tribais”.

Em nota, a Petrobras afirmou que a atividade de pesquisa de petróleo, pedida ao Ibama, é temporária, de baixo risco, com duração aproximada de cinco meses. Caso seja confirmado o potencial produtivo, a empresa confeccionará, afirma, um novo procedimento de licenciamento ambiental com a elaboração de estudos e projetos ambientais mais detalhados.

A estatal disse, ainda, que a estrutura de resposta a emergências é a maior já apresentada no país, composta por 12 embarcações, cinco aeronaves, cem profissionais e sistemas de contenção de óleo e bloqueio de poços.

O Amapá possui uma população indígena estimada em 5.802 habitantes em Oiapoque, 3.043 no parque do Tumucumaque (unidade de conservação entre AP e PA) e 1.220 em Pedra Branca do Amapari, totalizando 10.065, segundo dados da Secretaria Extraordinária dos Povos Indígenas, do governo estadual.

A porta-voz da Apoinp, Luene Karipuna, conta que tentou contato com a Petrobras para consulta prévia, mas não obteve retorno. Por este motivo, a organização rejeitou os convites de audiências públicas.

A entidade é composta pelas etnias apalai, akuriyó, galibi-marworno, galibi kali’na, karipuna, katxuyana, palikur-arukwayene, sikyiana, wajãpi, wayana, tiriyó e txikuyana.

“Nós entendemos que eles [da Petrobras] poderiam usar a nossa presença em audiências públicas gerais como justificativa de consulta prévia. Sendo que, na verdade, a consulta prévia segue outro modelo de critério e atende um protocolo diferente, de acordo com as nossas necessidades”, disse Karipuna.

O CCPIO reúne as etnias karipuna, galibi-marworno, galibi kali’na e palikur, que estão divididas em cinco regiões, entre elas as próximas aos rios Curipi, Uaçá, Urucauá, Oiapoque e a BR-156.

As principais atividades econômicas e de subsistência desses povos são a agricultura, a caça e a pesca. Para o Conselho dos Caciques, a exploração na região gera diversos riscos aos indígenas.

Para um dos caciques ouvidos pela reportagem, que pediu anonimato, quando o estudo dizia que a terra indígena estava fora de perigo, a informação não seria a realidade, porque a terra indígena já está sendo impactada de alguma forma.

Segundo ele, os indígenas têm relatado problemas causados pelas aeronaves que passam por cima das aldeias e afugentam animais, além do maior fluxo de pessoas em Oiapoque propiciado pelas atividades de preparação para explorar petróleo na bacia da Foz do Amazonas.

Em maio, a Assembleia Legislativa do Amapá organizou audiência pública para reunir políticos, associações e a sociedade civil para debater a possível exploração de petróleo na região de Oiapoque.

O porta-voz de oceanos do Greenpeace Brasil, Enrico Marone, relata que a região da disputa entre a Petrobras e o Ibama é muito sensível, por abrigar uma faixa contínua de mangues que vai do Amapá até o Maranhão.

O ativista explica que o bioma tem um papel fundamental para o equilíbrio climático do planeta, pois compensa a emissão de gases do efeito estufa, retendo carbono. Outro ponto é a presença dos recifes de corais na foz do Amazonas, descobertos em 2016 e ainda pouco estudados pela ciência.

“Em 2017, a Greenpeace fez uma expedição a bordo do navio Esperanza para vários levantamentos. Mapeamos a presença do grande sistema de recifes de corais ‘da Amazônia’. Nunca tinham sido vistos ou registrados numa região que supostamente não existiriam, por ter muita carga e sedimento do rio Amazonas ali”, conta Marone.

Com base em relatório da ONU (Organizações das Nações Unidas), o WWF, em nota, diz ser “urgente reduzir as emissões de gases de efeito estufa, como os decorrentes da queima de combustíveis fósseis”.

“Seria, portanto, um erro se o Brasil fosse na contramão da ciência e apostasse em novas fronteiras exploratórias de petróleo e gás, que estão entre os mais poluentes”.

O Observatório do Clima, rede de mais de 90 organizações socioambientais, ressaltou que tratados internacionais, como o Acordo de Paris, miram mitigação, adaptação e financiamento para uma transição de energia limpa até 2030.

“O momento é de estabelecer um calendário para a eliminação dos combustíveis fósseis e acelerar a transição justa para os países exportadores de óleo”, diz Suely Araújo, especialista-sênior em políticas públicas do Observatório do Clima e ex-presidente do Ibama.

“Quem dorme hoje sonhando com a riqueza petroleira tende a acordar amanhã com um ativo encalhado, ou um desastre ecológico, ou ambos.”

O projeto Planeta em Transe é apoiado pela Open Society Foundations.

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