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Brasil

Empresa de obra do metrô repudia vídeo sexista que culpa funcionárias por acidente

“A companhia considera o conteúdo misógino e extremamente desrespeitoso com nossas colaboradoras”, afirmou a Acciona em nota

FolhaPress

04/02/2022 18h40

Foto: Reprodução

Mônica Bergamo
São Paulo, SP

A empresa espanhola Acciona, responsável pela construção da linha 6-laranja do metrô, repudiou um vídeo de teor sexista, espalhado em redes sociais, que atribui à participação de mulheres na obra o acidente que abriu uma cratera na marginal Tietê e interditou a via.

“A companhia considera o conteúdo misógino e extremamente desrespeitoso com nossas colaboradoras”, afirmou a Acciona em nota enviada à reportagem.

Um dos que compartilharam o vídeo é o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP). Perfis bolsonaristas usaram o material para atacar o governo João Doria (PSDB), que concedeu à construtora a obra e a operação da linha 6-laranja do metrô.

A montagem utilizou trechos de um filme institucional publicado no YouTube pela Acciona em dezembro de 2020. O material original exaltava a participação de mulheres no empreendimento, destacando a contratação de engenheiras para o canteiro de obras e de outras profissionais envolvidas diretamente nos trabalhos.

Na versão feita agora, para relacionar o rompimento na pista à participação feminina e questionar a competência das profissionais unicamente por causa do gênero delas, imagens e falas de entrevistadas foram tiradas de contexto e ridicularizadas.

A Acciona disse que “lamenta profundamente o teor dessa videomensagem que circula em redes sociais” e que “estuda as medidas judiciais cabíveis ao caso”.

O Crea-SP (Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Estado de São Paulo) também emitiu nota em que repudia o ataque e afirma que “atos como esse não serão tolerados”.

Com a edição, cenas do desabamento parcial da pista da marginal e do vazamento de esgoto foram inseridas entre depoimentos de empregadas da Acciona. Nas falas de 2020, elas destacavam o fato de a construção ser “um projeto grandioso, a maior obra de infraestrutura do Brasil no momento” e uma obra que “vai beneficiar muita gente em São Paulo”.

A versão compartilhada por Eduardo Bolsonaro, semelhante ao vídeo que já estava circulando em redes sociais e grupos de WhatsApp, foi ainda acompanhada de uma trilha sonora que busca dar viés humorístico ao material.

O filme divulgado pelo deputado no Twitter incluiu ainda trecho de uma entrevista do governador Doria e imagens do tucano dançando em eventos públicos -a família Bolsonaro rivaliza com Doria na arena eleitoral e endossa ataques de cunho pessoal contra ele.

O parlamentar escreveu na postagem: “‘Procuro sempre contratar mulheres’, mas por qual motivo? Homem é pior engenheiro? Quando a meritocracia dá espaço para uma ideologia sem comprovação científica o resultado não costuma ser o melhor. Escolha sempre o melhor profissional, independente da sua cor, sexo, etnia e etc”.

Em resposta ao post de Eduardo, o secretário nacional de Fomento e Incentivo à Cultura, André Porciuncula, escreveu: “Brincar de lacração colocando vidas em jogo, que absurdo!”.

Outras edições semelhantes que passaram a circular depois do acidente, na terça-feira (1º), e foram compartilhadas por perfis alinhados ao bolsonarismo e críticos a Doria continham ainda expressões em texto na tela, em tom de ironia e preconceito.

Sobre a fala de uma das funcionárias da Acciona de que era “uma das várias mulheres que compõem o time da Acciona”, apareceu a pergunta: “PQP tem mais ainda (sic)?”.

Também na montagem, uma foto de três profissionais mulheres diante de uma placa com o nome da empresa foi acompanhada da legenda: “As grandes guerreiras!”. E, quando uma entrevistada diz que “a maioria das mulheres hoje está na obra de infraestrutura”, é inserida a frase: “Tá explicado (sic)…”.

No momento em que outra contratada, uma engenheira agrimensora, afirma que “tem uma barreira na engenharia em relação às mulheres”, aparece a questão: “Por que será, né?”.

Efeitos de imagem e som usados com fim de ironia também foram aplicados no momento em que uma engenheira de planejamento ressalta, na gravação de 2020, “o impacto que ela [a obra] vai ter na cidade”. A frase dita pela mulher na sequência, de que “é um sonho” participar de algo grandioso, é replicada com a frase na tela: “Não, amiga. É um pesadelo”, com novas imagens do acidente.

“Obrigado, meninas. A população de São Paulo agradece” é a frase que encerra a montagem.

As falas, originalmente, celebravam a presença feminina na construção do metrô. Uma das entrevistadas que tiveram a imagem usada na montagem, do setor de recursos humanos, disse que procurava contratar mulheres para obras de infraestrutura. Outras participantes também tiveram rosto e nome expostos.

Em redes sociais, comentários criticaram a política de contratação de mulheres, vinculando o programa de igualdade de gênero ao acidente ocorrido nesta semana. A cratera se abriu na pista local da marginal Tietê em decorrência do rompimento de um coletor de esgoto que passa ao lado do local.

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