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Coronel de SP pivô de crise no 7/9 ganha superpoderes na PM de Tarcísio

A imagem que eternizará esse encontro é também uma demonstração pública do status alcançado por Lacerda na gestão de Tarcísio de Freitas (Republicanos).

Redação Jornal de Brasília

11/09/2023 17h02

Foto: Agência Brasil

ROGÉRIO PAGNAN
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)

Integrantes das cúpulas do Ministério Público e da Polícia Militar de São Paulo se reuniram, no início de agosto, para tratar de “diversos temas de interesse institucional”. No registro oficial do encontro, o procurador-geral Mario Sarrubbo aparece ladeado por dois coronéis: à esquerda está o comandante-geral, Cássio Araújo de Freitas, e, à direita, Aleksander Toaldo Lacerda, subchefe do Estado Maior.

A imagem que eternizará esse encontro é também uma demonstração pública do status alcançado por Lacerda na gestão de Tarcísio de Freitas (Republicanos).

Em agosto de 2021, esse coronel foi pivô de uma grave crise institucional entre a PM e o governo paulista ao convocar pelas redes sociais participação dos atos em apoio ao então presidente Jair Bolsonaro (PL) na “guerra” contra o STF (Supremo Tribunal Federal).

O envolvimento de um oficial da ativa da maior PM do país, com cerca de 80 mil homens, aumentou o clima de tensão daquele 7 de Setembro em razão de rumores da possibilidade de um golpe de Estado com apoio de policiais militares.

A adesão de Lacerda sinalizava a possibilidade de rompimento de PMs paulistas com a gestão João Doria (então no PSDB) e, com ele, fim do Estado democrático de Direito.

O envolvimento do coronel com o bolsonarismo foi revelado pelo jornal O Estado de S. Paulo. O material mostrava o teor das publicações do oficial nas redes sociais que, além da convocação de atos pró-Bolsonaro no 7 de Setembro, fazia graves críticas ao governador Doria e aos ministros do STF, em especial ao ex-secretário da Segurança de SP, Alexandre de Moraes.

Após a reportagem, Lacerda foi afastado do comando da região de Sorocaba e virou alvo de investigação interna. O então comandante-geral Fernando Alencar Medeiros ainda determinou que policiais militares de folga não participassem de manifestações políticas naquele feriado, algo inédito na corporação. A ordem foi cumprida, mas a imagem da contaminação política da tropa permaneceu.

Com o início da gestão Tarcísio, Lacerda foi nomeado subchefe do Estado Maior -uma das funções mais importantes da PM por ser o responsável pela condução de todos os estudos estratégicos da corporação e pela materialização das decisões tomadas pelo comando.

Para coronéis ouvidos pela reportagem, a eficiência do trabalho de um subchefe do Estado Maior é o que determina o sucesso ou não de um comandante-geral.

Além de ser nomeado ao Estado Maior, Lacerda também aparece no site da PM como um dos editores da revista A Força Policial, publicação trimestral da corporação destinada ao público interno e externo.

No mês de junho, o policial foi um dos agraciados pelo governo paulista com a medalha Valor Militar, em grau Ouro, em “reconhecimento aos bons, leais e relevantes serviços prestados ao estado de São Paulo, por mais de 30 anos nas fileiras da corporação”.

Para o diretor do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Renato Sérgio de Lima, a presença de Lacerda na cúpula da PM transmite uma mensagem que contrasta com a imagem sustentada pela instituição ao longo de anos, de sempre primar pelo profissionalismo em detrimento de questões político-partidárias.

“A mensagem que eu entendo é que política na tropa pode, desde que alinhada com aquilo que o secretário e governador acreditam. Ela não só pode, mas deve ser incentivada. Quando, na verdade, a força policial precisaria estar blindada dos interesses partidários, dos interesses políticos ideológicos.”

Ainda segundo Lima, o Ministério Público deve ficar atento aos movimentos políticos na PM paulista para que não seja guiada por interesses partidários e não ocorra em São Paulo o mesmo verificado no Distrito Federal, onde a cúpula da instituição estava “radicalizada por posições antidemocráticas” no 8 de janeiro.

“Então, eu vejo com preocupação porque a sinalização à tropa é a de que há uma mudança radical em curso, que há um realinhamento político partidário muito claro”, afirmou o especialista em segurança.

A diretora do Instituto Sou da Paz, Carolina Ricardo, diz que as publicações feitas pelo coronel em 2021 foram muito graves, “extremamente politizadas”, e o então comandante da PM, coronel Alencar, e o governador Doria agiram corretamente ao afastarem o coronel do comando de Sorocaba e abrirem investigação.

“Então, eu não acho que é defender que ele caia no ostracismo. Ele precisa continuar até em sua trajetória na Polícia Militar, mas me parece que estar onde está hoje talvez acenda uma luzinha amarela e traga o questionamento de que, talvez, posicionamentos políticos radicais não incomodem tanto é a gestão atual”, afirmou ela.

O coronel veterano José Vicente da Silva, ex-secretário nacional de Segurança Pública, diz não ver problemas na indicação de Lacerda para cargo tão importante da PM paulista porque o coronel é considerado pelos colegas com um policial competente, que cometeu um erro.

“A informação que eu tenho que é um oficial extremamente competente, corretíssimo, qualidades que o credenciam para a função. Eu não vejo problema nisso. Ele fez uma manifestação privada, mas indevida no meu entendimento, naquela ocasião, ele recebeu alguma punição. Ele não levantou bandeira política depois disso daí. Ele quase que se desculpou por ter feito isso”, afirmou ele.

Procurado pela reportagem, o Ministério Público, que na época anunciou uma série de medidas para investigar o caso, enviou uma resposta lacônica. “O MPSP ofereceu denúncia”, diz toda a nota.

Já Secretaria da Segurança Pública, afirma que o inquérito contra o coronel foi concluído e remetido à Justiça Militar, se informar qual o resultado da apuração.

“A Polícia Militar informa que o IPM (Inquérito Policial Militar) relativo aos fatos ocorridos em 2021 foi concluído e remetido à Justiça Militar. A instituição reitera que as medidas administrativas disciplinares adotadas à época foram integralmente cumpridas. Portanto, não há impedimento para que o oficial exerça as funções inerentes ao seu posto hierárquico”, diz a nota.

Questionada por duas vezes, a SSP não informou quais seriam essas “medidas administrativas disciplinares”. As punições administrativas são divorciadas das questões criminais ou civis.

Segundo a reportagem apurou, há um processo (96.734/21) em andamento contra o coronel Lacerda em trâmite na 3ª Auditoria do Tribunal de Justiça Militar paulista, pelo artigo 166 do CPM (Código Penal Militar), que prevê punição de dois meses a um ano de detenção a militar que publicar ou criticar publicamente atos de superiores.

Ainda segundo a reportagem apurou, as testemunhas do caso foram ouvidas, o réu foi interrogado e, agora, o processo está na fase de diligências e deverá ser julgado em cerca de dois meses.

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