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Brasil

Agentes buscam em casa quem resiste à 2ª dose da vacina da Covid

Os agentes têm um papel importante no conhecimento da realidade das famílias e no desenvolvimento das ações da unidade, principalmente na promoção, prevenção e educação em saúde

Redação Jornal de Brasília

14/08/2021 13h21

Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Patricia Pasquim
Folhapress

Preguiça e falta de tempo por excesso de trabalho foram as razões do autônomo Ronoel Acácio, 76, para não ter tomado a segunda dose da Coronavac na data certa.


Ele recebeu a primeira em 23 de março e deveria ter procurado a AMA/UBS Integrada Jardim Brasil, na zona norte, em 12 de abril para a segunda.


Acácio mora e tem uma pequena oficina de bicicletas a dois minutos da unidade de saúde, que fica aberta para vacinação de segunda a sábado, das 7h às 19h, e em feriados.


Após várias tentativas de conduzi-lo ao posto, na quarta-feira (11) as agentes comunitárias de saúde Karla Farias Atílio, 33, e Letícia Aparecida Nunes da Silva, 26, o convenceram. Na ocasião, a reportagem acompanhava o trabalho delas de buscar quem está com a segunda dose atrasada.


“Já foi? Achei que fosse doer. Vamos ver como vou acordar amanhã”, disse Acácio após tomar o imunizante.


Nas unidades ESF (Estratégia Saúde da Família) da capital, a missão de quebrar resistências em relação à vacinação contra a Covid-19 é dos 9.500 agentes comunitários de saúde distribuídos em 1.625 equipes de ESF. Nas demais UBS, o trabalho é feito pelos profissionais de enfermagem.


Os agentes têm um papel importante no conhecimento da realidade das famílias e no desenvolvimento das ações da unidade, principalmente na promoção, prevenção e educação em saúde.


A partir das visitas às casas, eles identificam situações que precisam do atendimento da equipe e também acompanham os pacientes.


“O agente tinha que ser a espinha dorsal da resposta à pandemia, porque ele trabalha e mora na comunidade. É a pessoa que tem a confiança da população que serve. Ele sabe onde estão as pessoas com comorbidades, quem mora em casa onde não há ventilação nem condições de isolar o familiar que se torna um caso suspeito, por exemplo”, diz Marcia Castro, cientista, professora de demografia da Faculdade de Saúde Pública de Harvard e membro do Observatório Covid-19 BR.


Para a pesquisadora, o agente comunitário de saúde é peça fundamental no trabalho de combate à pandemia.


O trabalho de convencimento é árduo, baseado na conquista da confiança. Acácio, por exemplo, havia recusado todas as abordagens anteriores dos agentes.


Na mesma tarde, Karla e Letícia procuraram por Erli Aparecida, 63, mas não a encontraram em casa. Hipertensa, ela deveria ter tomado a segunda dose da AstraZeneca em 29 de julho, mas não compareceu. Ela recebeu a primeira em 6 de maio.


A filha, Reny Aparecida, 34, disse que a mãe não procurou a AMA/UBS porque sente dores nas pernas. Segundo as agentes, Erli tem condições de ir à unidade, pois não tem problemas de mobilidade.


A reportagem ainda acompanhou a visita a Catarina Ferreira dos Santos, 62. Assim como Erli, ela tomou a primeira dose da AstraZeneca em 6 de maio e deveria ter recebido a segunda no último dia 29.


As agentes de saúde já haviam tentado levá-la ao posto anteriormente, sem sucesso.


Na quarta, ela foi surpreendida na rua, em frente à casa onde mora, sem máscara. Desta vez, a idosa alegou sintomas gripais –na data da abordagem, já haviam desaparecido havia três dias, segundo as agentes.


Ela prometeu que procuraria a AMA/UBS para receber a vacina na quinta-feira (12), o que não ocorreu.


O trabalho de busca ativa começou em meados de maio, quando a Secretaria Municipal de Saúde da capital identificou que algumas pessoas não haviam voltado para tomar a segunda dose.


“O VaciVida nos dá os relatórios das vacinas atrasadas. Assim que vence a data da segunda dose, que consta no cartão de vacina, no dia seguinte a pessoa já entra no sistema como faltosa. Semanalmente, essa lista é extraída do sistema e enviada às UBS”, disse Sandra Sabino, secretária-executiva de Atenção Básica, Especialidades e Vigilância em Saúde da pasta.


Com a lista dos faltosos em mãos, a unidade de saúde distribui aos agentes comunitários para que iniciem a busca ativa. Na AMA/UBS Integrada Jardim Brasil, o percentual de faltosos não chega a 5%, segundo o gerente da unidade Ivan Lima Santana.


“O que mais perguntam para nós é sobre a eficácia da vacina. Precisamos explicar a eles que, independentemente da eficácia, nós estudamos para que essa vacina viesse. Eles também têm dúvidas se é possível pegar a doença vacinado”, relata a agente Karla.


Até esta sexta (13) de manhã, 211.228 pessoas ainda não tinham tomado a segunda dose da vacina contra a Covid-19 na capital paulista.


Na maioria dos casos, de acordo com Sabino, a vacina venceu há um ou dois dias e ao longo da semana essas pessoas procurarão as unidades para receberem o imunizante.


“Nos casos em que há resistência precisamos trabalhar. Às vezes, chegamos até a entrar em contato com familiares para pedir ajuda no convencimento. É uma batalha diária”, afirma Sabino.


O primeiro contato para a busca ativa é telefônico. Nele, o paciente é questionado sobre o motivo do atraso.


Na conversa, se a equipe perceber que a pessoa ficou doente e está acamada, morava com alguém e agora vive sozinha, por exemplo, e por isso não consegue se deslocar até a UBS, é programada uma visita domiciliar para a vacinação.


Com a circulação da variante delta, a secretaria também distribui máscaras N95 aos pacientes sintomáticos respiratórios e às pessoas que moram na mesma casa.


Os argumentos mais utilizados por quem atrasou a vacina incluem cisma, sem motivo aparente, esquecimento e medo de ter reações adversas. “Elas são comuns, passam em 24 horas e não é porque o paciente teve reações na primeira dose que terá na segunda.”


“Só vamos conseguir controlar a pandemia quando pelo menos 70% da população estiver imunizada com as duas doses. Pedimos a todos que completem a imunização. É uma proteção individual, da família e da coletividade”, afirma Sabino.


Juarez Cunha, presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações, reforça que é fundamental tomar as duas doses, exceto no caso da Janssen, que é única. “Isso se torna mais importante ainda com a variante delta em circulação.”
De acordo com Cunha, a primeira dose da vacina já leva à produção de anticorpos e oferece uma certa proteção. A segunda é essencial para completar e prolongar essa proteção contra a doença.


No caso dos três pacientes citados no texto, o atraso não implicará na perda da proteção da primeira dose ou na redução da resposta vacinal.


“O principal recado é: tenha a segunda dose, mesmo que aplicada com atraso, para se proteger contra as formas graves da doença e também contra a variante delta.”


Segundo ele, além do esquecimento e dos eventos adversos na primeira dose, há pessoas que têm uma tendência a acreditar que, se tiveram mais reações, significa que responderam melhor à vacina. “É um mito.”


Para o especialista, a desinformação, as fake news e os maus exemplos também impactam negativamente para que aconteçam atrasos na busca pela segunda dose por parte da população.

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