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Idosos morrem desidratados em asilo português afetado por vírus

As conclusões são de um relatório elaborado pela Ordem dos Médicos de Portugal, que apontou uma sucessão de problemas na condução da situação na Fundação Maria Inácia Vogado Perdigão Silva

Marcus Eduardo Pereira

12/08/2020 21h34

GIULIANA MIRANDA
LISBOA, PORTUGAL

Uma auditoria feita em um asilo de idosos afetado por um surto de Covid-19 em Reguengos de Monsaraz, no Alentejo, região mais pobre de Portugal, revelou que a maioria das 18 mortes não foram causadas pela doença, mas sim por negligência.

Em meio a uma das piores ondas de calor do ano, alguns dos moradores morreram desidratados. Outros, porque não tiveram quem lhes entregasse a medicação.

Com o organismo fragilizado por essas condições, chegaram aos hospitais com poucas chances de recuperação.
As conclusões são de um relatório elaborado pela Ordem dos Médicos de Portugal, que apontou uma sucessão de problemas na condução da situação na Fundação Maria Inácia Vogado Perdigão Silva.

Além de 80 moradores, o surto atingiu 26 trabalhadores do asilo e se espalhou pela comunidade, com mais de 50 infectados também na cidade.

Os funcionários foram mandados para casa, em isolamento, mas não houve pessoal suficiente para substituí-los. Resultado: os idosos passaram a viver em um estado próximo ao do abandono, muitas vezes sem acesso a medicação e sem cuidados básicos como alimentação e higiene.

“Logo nos primeiros três dias em que se percebeu que a maioria dos idosos estava infectada e que não havia nem recursos humanos nem condições logísticas para garantir o distanciamento, deveriam ter procedido à transferência dos doentes”, afirma a médica Filipa Lança, coordenadora da comissão responsável pelo documento, em entrevista ao jornal Expresso.

“Foi-se deixando protelar a situação por uma tentativa de, administrativamente ou politicamente, resolver o problema. Mas o problema arrastou-se e os doentes só foram transferidos duas semanas depois, quando a infecção já estava quase completamente disseminada”, completou.

Segundo ela, a falta de recursos humanos foi decisiva para agravar o quadro já fragilizado de pessoas idosas e ainda contaminadas pelo coronavírus. “[Os idosos] chegaram ao hospital com valores das análises agravados e, seguramente, se tivessem chegado antes, teriam mais hipótese de ter um desfecho diferente.”

O documento chama a atenção ainda pela ausência de um plano de contenção para o caso de um surto de Covid-19 nas instalações, mesmo após quatro meses do início da pandemia. A auditoria também salienta a falta de profissionais de médicos e enfermeiros, descumprindo regras da Direção-Geral da Saúde.

O caso tem gerado comoção em Portugal, onde a pandemia expõe um problema sério de precariedade nas instalações para idosos. Cerca de 40% das 1.763 mortes por Covid-19 no país aconteceram em asilos.

Há mais de 70 surtos ativos em asilos, que em muitos casos não dispõem de pessoal médico e nem de condições para distanciamento social.

Em carta aberta ao primeiro-ministro António Costa, o Sindicato Independente dos Médicos classifica a situação dos asilos e a falta de fiscalização das condições como criminosa. “Como é que foi possível o Estado Português, através do ministério que tutela lares e outras estruturas de apoio a idosos [Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social], não exercer a sua função fiscalizadora, alegando falta de pessoal?”

Em nota, a direção do asilo da Fundação Maria Inácia Vogado Perdigão Silva garante ter feito “tudo o que estava ao seu alcance e dentro das suas competências, com a ajuda de várias dezenas de instituições e pessoas” para “salvar vidas humanas, numa crise de saúde pública que assumiu contornos absolutamente dramáticos”.

A instituição afirma ainda que, após a comunicação do início do surto, as autoridades de saúde ficaram responsáveis pela condução da situação.

Deputados dos partidos de oposição estão se organizando para cobrar uma resposta oficial do governo e do Ministério da Saúde. Já o Ministério Público disse que está avaliando se há base para responsabilização criminal.

As informações são da FolhaPress

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