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Coluna Léo Dias

Trinta anos após Cristo censurado, Mangueira levará negro favelado na cruz para a Sapucaí

Léo Dias

21/02/2020 5h55

Mangueira

Três décadas após o público acompanhar a passagem censurada de um “Cristo Mendigo” pela Sapucaí, a Mangueira repetirá, aos seus moldes, a tentativa de retratar Jesus Cristo como uma pessoa desfavorecida pela sociedade. Em seu desfile sobre a vida do símbolo religioso, a Verde e Rosa incluiu um Cristo com dez metros de altura na qual mostrará a crucificação de um homem negro, pobre e favelado. Trata-se, no contexto do enredo da agremiação, de um paralelo entre a morte de Jesus e a execução da população negra, a principal vítima de homicídios no Brasil – foram 255 mil pretos e pardos mortos intencionalmente entre 2012 e 2017, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Para garantir que a iniciativa não fosse barrada pela censura, a diretoria da Mangueira e o carnavalesco Leandro Vieira guardam o segredo com cuidado até a hora do desfile. Há uma preocupação inclusive com uma eventual tentativa de judicializar a questão por parte de grupos religiosos: eles já vêm fazendo abaixo-assinados contra o desfile (o mais aderido tem 114 mil signatários), mas podem procurar a Justiça para tentar barrar o homem crucificado da escola de samba. Precavida, a Mangueira mobilizou uma equipe de advogados que estão de plantão para o caso de precisarem defender nos tribunais a liberdade de expressão do artista e da comunidade.

Há três anos, a escola do Morro da Mangueira, na Zona Norte do Rio, foi alvo de uma proibição: em um desfile sobre o sincretismo religioso que guia a fé do brasileiro, levou para a Avenida um elemento alegórico em exibia as imagens de Cristo e de Oxalá (ambos são vistos como um só em vertentes de religiões afro-brasileiras). A ideia, também mantida em segredo, chegou a ser vista no desfile oficial, mas acabou fora do Desfile das Campeãs após ter sido vetada pela Liga das Escolas de Samba do Rio (Liesa), em acordo com a própria agremiação, a pedido da Arquidiocese do Rio.

Desta vez, no Domingo de Carnaval, a expectativa é de que – sem os plásticos pretos da censura que esconderam o “Cristo Mendigo” de Joãozinho Trinta, pensado para a Beija-Flor — a Sapucaí finalmente ganhe um Cristo para chamar de seu, fiel à identidade da maioria das pessoas que fazem o espetáculo das escolas de samba acontecer.

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