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Estilo de Vida

Mãe cria curso profissionalizante de fotografia para jovens com síndrome de Down

Não é cobrada taxa para frequentar o curso, mas devido a dificuldades financeiras pode se instituir um valor mensal de R$ 50 por aluno

Redação Jornal de Brasília

03/03/2023 6h41

Foto: @lucasnave_fotos

Apesar de ter amigos na escola, Felippe Reis sentia-se sozinho. Nascido com síndrome de Down, sentia falta de pertencer a um grupo que realmente o integrasse. Pensando nisso, em 2013, sua mãe, Sandra Reis, o colocou num curso de teatro para pessoas com a mesma condição genética, onde ele fez amigos.

Animada com a situação, Sandra, que é fotógrafa, reuniu Felippe e sua nova turma em seu estúdio para fotografar um calendário virtual. Ela não imaginava, porém, que esse seria o início da Galera do Click, curso de fotografia profissionalizante para jovens com deficiência intelectual pelo qual já passaram mais de 200 alunos.

Sandra explica que a ideia partiu das mães dos colegas do filho, que também queriam que seus filhos criassem mais conexões. “Eles queriam namorar, ir ao cinema, beijar na boca, dormir na casa de alguém.” Assim, a fotógrafa decidiu, no seu tempo livre, reunir, de graça, a trupe de cerca de 20 amigos no seu estúdio, localizado numa casa na zona norte de São Paulo, com o pretexto de ensinar fotografia.

Mesmo já tendo apresentado ao filho algumas noções de fotografia, Sandra não conhecia nenhum método de ensino sobre o tema voltado para pessoas com deficiência intelectual, e foi naturalmente desenvolvendo o seu. “Fui fazendo eles pegarem gosto por imagem com passeios legais e, aos poucos, fui introduzindo a teoria”, conta.

Com o tempo, eles foram aprendendo mais sobre o assunto e, em 2014, Sandra começou a levar alguns alunos para trabalhos fotográficos, como seus assistentes e a compartilhar com eles o pagamento. Foi nesse período que a Galera do Click, que havia começado como ONG, acabou se tornando um negócio social. “Se você quer nos ajudar, nos contrate”, explica a fotógrafa.

Foi o que aconteceu, os clientes da Sandra começaram a chamar a equipe para trabalhos e a notícia foi se espalhando. No começo, a demanda era mais vinculada a eventos corporativos ligados à inclusão, mas com o tempo foi se diversificando, o que, para a fotógrafa, aconteceu devido à qualidade do trabalho dos alunos. “Eu estimulo eles a se desenvolverem cada vez mais para que as pessoas acreditem neles. A fotografia deu a eles a oportunidade de mostrarem para as empresas do que são capazes”, completa. A Galera foi crescendo e chegou a ter mais de 70 alunos num mesmo momento, além de fazer trabalhos para empresas como Microsoft, Astrazeneca e a farmacêutica Roche.

O curso conta com aulas de técnicas e teóricas e não tem duração específica. “A maneira deles aprenderem é muito particular, uns aprendem muito rápido, outros não. Por isso, o meu diferencial é ter paciência para ensinar sem seguir um cronograma fixo e poder ir e voltar nos assuntos”.

Tropa de Elite

Os alunos mais avançados, intitulados por eles mesmos como ‘Tropa de Elite’, acompanham Sandra nos eventos. “Eles sabem a hora de se comportar, comer, ficar no celular, brincar e são cobrados para entregar.” Nesses trabalhos, eles são sempre acompanhados por Sandra ou um monitor, além de contarem com, no mínimo, a companhia de um outro colega.

Além de Felippe, também, Bruno, Rodrigo, Rafael e Welton fazem parte da equipe avançada — que hoje conta com 16 alunos. O clima entre eles é de brincadeira e intimidade típica de melhores amigos. Essas amizades são fonte de orgulho e motivação para Sandra manter o projeto. “Da Galera do Click saem os namorados, os melhores amigos, as paqueras, os perrengues e as disputas”, conta.

Um olhar de especialista

Para Patrícia Salmona, médica especializada em síndrome de Down, é importante que os pais fiquem atentos para identificar durante a vida escolar dos filhos seus gostos e aptidões, para que, no futuro, eles possam se dirigir a esta carreira.

Patrícia destaca, também, que ao incluir pessoas com síndrome de Down no ambiente de trabalho, ajuda-se a quebrar preconceitos sobre esses indivíduos que, segundo ela, em certas funções, são até mais aplicadas que o restante da população. “Eles veem a oportunidade de mostrar seu valor, entendem a responsabilidade e são muito dedicados”, diz.

Em relação às empresas, a especialista vê grandes benefícios na contratação de pessoas com síndrome de Down. “Pela expansibilidade da personalidade dessas pessoas, todos os funcionários acabam tendo uma rotina mais leve. Além de criar-se um ambiente mais tolerante e acolhedor”.

Pandemia

A Galera do Click foi duramente afetada pela pandemia. Além do cancelamento dos eventos, a turma faz parte do grupo de risco para covid-19 e precisou ficar mais tempo isolada. Apesar do número de alunos e de trabalho ter caído, Sandra pretende ampliar cada vez mais a Galera que está aberta a novos membros e oportunidades de trabalho. No momento, devido a um problema de saúde, Sandra suspendeu as aulas, que voltarão em março.

Atualmente, não é cobrada taxa para frequentar o curso, mas devido a dificuldades financeiras, Sandra está planejando instituir um valor mensal de R$ 50 por aluno. Para se juntar à Galera do Click é só entrar em contato por meio das redes sociais (@galeradoclick) ou do telefone de contato (+55 11 98662-4805).

Estadão Conteúdo

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