Cuidar da saúde também significa cuidar da mente. Pensando nisso, a Unidade Básica de Saúde (UBS) 1 de Vicente Pires criou o projeto Mentes em Movimento para os integrantes da Terapia Comunitária Integrativa (TCI). A iniciativa visa promover saúde mental ao ocupar espaços culturais e, nesta última terça-feira, levou um grupo de cerca de 30 idosos que fazem parte da TCI para visitar o Centro Cultural da Caixa, no Setor Bancário Sul.
Segundo Sofia Lisboa, psicóloga da equipe multidisciplinar de Vicente Pires e terapeuta comunitária integrativa, a iniciativa reforça a cultura como pilar central na TCI — não apenas um pano de fundo, mas fonte de cura e resiliência. O Mentes em Movimento incentiva os pacientes a buscarem o cuidado com a saúde mental fora dos muros da UBS, os inserindo no cotidiano da comunidade. “O projeto reforça que as soluções para os desafios da vida estão enraizadas nas tradições, saberes populares, crenças e rituais de cada comunidade”. Para Sofia, isso fortalece a confiança e o sentimento de pertencimento, permitindo que as pessoas se expressem com autenticidade e encontrem em suas raízes culturais ferramentas para enfrentar dificuldades e celebrar a vida.
Carla Rego, terapeuta comunitária integrativa e técnica de enfermagem da UBS de Vicente Pires, contou que a ideia do passeio surgiu durante uma roda temática do grupo, centrada no aniversário de Brasília. Os integrantes comentaram o desejo de conhecer melhor a cidade e compartilharam suas experiências. “Muitos deles vieram muito pequenos ou estão aqui desde a época da construção e não conhecem Brasília direito”. A partir disso, a equipe decidiu promover passeios por pontos culturais da cidade. “A cultura é muito valorizada nos grupos de terapia comunitária, por resgatar a identidade de quem participa. Ao fazer isso, a gente promove saúde também”.
O grupo tem cerca de 30 a 33 pessoas, mas, por ser um espaço aberto, esse número varia. “Sempre estão chegando pessoas novas”, acrescentou Sofia. O único critério para participar é ter mais de 18 anos.
Esse foi o segundo passeio do Mentes em Movimento e a ideia é realizar três atividades culturais do tipo anualmente. “Mais para a frente a gente ainda quer fazer o terceiro. Eles pedem muito para conhecer o Catetinho e nós vamos tentar fazer acontecer”, disse Carla. O primeiro passeio foi no Complexo Cultural da República.
Uma experiência transformadora
O passeio da vez foi no Centro Cultural da Caixa. Para o Jornal de Brasília, o arte-educador Gabriel da Paz explicou que o espaço recebe diversos grupos — desde UBSs até turmas de escolas e centros educacionais. Segundo ele, a visita proporciona aos pacientes da TCI uma mudança de ambiente, ao saírem do local tradicional de terapia. “Esse grupo, em particular, é excepcional, pois muitos participantes já possuem contato com atividades artísticas e manuais no contexto da UBS. Ao trazê-los para a Caixa Cultural, podemos ampliar o repertório cultural deles”, comentou.
Durante a visita, o grupo conheceu a exposição Olhar Negro, Negro Olhar, que aborda religião e outras culturas. “Eles puderam conhecer outras culturas e também entender um outro ponto de vista”, contou. Além da exposição, eles também participaram de uma oficina de colagens. “Temos esse processo pedagógico por trás da exposição, para que eles retornem com uma experiência transformadora”, disse.
Uma das integrantes do grupo de TCI que foi ao passeio, é Sandra Maria de Andrade, 59 anos, servidora pública. Ela frequenta os encontros há dois anos e meio e os considera essenciais para manter a mente tranquila. “Quem frequenta o grupo geralmente são pessoas que chegam lá machucadas, mas que são acolhidas com muito amor, muito exercício e muita música”, afirmou. Agora, com o projeto Mentes em Movimento, Maria já participou dos dois passeios. “Saímos dessas atividades com o coração quentinho. O cuidado das pessoas envolvidas nesses projetos faz com que a gente não se sinta só, que é como nos sentimos quando procuramos a terapia comunitária”, destacou.
Emocionada, Sandra contou que nunca tinha visitado a Caixa Cultural e que amou a mostra exibida. “Eu não conhecia essas histórias. Fiquei encantada com o conhecimento da dupla que apresentou as obras. Conhecer a cultura negra e a história do nosso país é muito importante. Isso faz com que a gente lembre do sofrimento deles, que eles venceram. A vida não é fácil para todo mundo, mas não é impossível”, declarou. Ela acredita na importância de iniciativas que promovam o acesso à arte e à educação. “Quase ninguém tem acesso ou tempo, então é algo muito válido”, completou.
Francisco Amaral Medeiros, 71 anos, aposentado, também participa do grupo há mais de dois anos. Para ele, os encontros da TCI contribuem muito para o dia a dia. “Às vezes até nas adversidades, mas também nas qualidades positivas. E principalmente na parte de alegrar o dia a dia ao conviver com quem frequenta a terapia”, disse. Ele achou fantástico visitar o Centro Cultural, especialmente pela oportunidade de aprender mais sobre a cultura dos povos de origem africana. “Eles foram sempre um povo guerreiro e se organizaram com a sua cultura, que faz parte da cultura do povo brasileiro”, ressaltou. Foi a primeira vez que Francisco esteve no local e considerou a experiência incrível.
Sheila Peres, 70 anos, professora aposentada, atualmente se dedica à pintura, escrita, artesanato e à terapia comunitária. Ela já enfrentou um quadro de depressão e segue em tratamento com a terapia comunitária. Para Sheila, a cultura tem um papel fundamental na saúde mental. “Eu me sinto muito bem acolhida na TCI. A gente vê a dedicação por parte das meninas e o grupo em si é bem especial — acaba que todos nós, um vai ajudando o outro”, disse. Sheila contou que os passeios do projeto a deixam extremamente feliz. “Ainda mais porque eu vejo a alegria nos outros também, e isso faz muito bem”, acrescentou. Para ela, a terapia comunitária é essencial, principalmente para os mais velhos. “Atualmente, com a questão da velhice, na maioria dos lugares a gente não é compreendida. Mas lá na terapia comunitária, você vê pessoas da mesma idade e uma levanta a outra”, finalizou.
Saiba mais:
Se alguma instituição ficou interessada em fazer uma visita ao espaço, basta procurar o Gente Arteira – setor criativo do Caixa Cultural. Gabriel da Paz explicou que o contato é através do Instagram da Caixa as informações , onde todas as informações necessárias para agendar a visita são fornecidas. As exposições e as atividades pedagógicas na Caixa Cultural são gratuitas.