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Música

Jovem Dionísio: existe vida após o hit ‘Acorda Pedrinho’?

Banda curitibana emplacou outro sucesso

Redação Jornal de Brasília

03/06/2024 17h39

Foto: Reprodução

Os integrantes do Jovem Dionísio pensaram, debateram, conversaram. Não conseguiram decidir a palavra certa para a música na qual trabalhavam incessantemente. O personagem da canção vestia o quê? Uma jaqueta? Uma calça? “Foi então que eu falei: ‘Já vesti não sei o quê’”, conta Bernardo Hey, ao Estadão. Todos da banda se entreolharam. Era isso.

Uma solução com a cara do quinteto curitibano: algo entre o jocoso e o indiferente. Propositalmente descolado – hipsters podem pensar por horas no look, mas nunca vão admitir isso. Estava pronto o hit. Mais um.

“Cê reparou que eu me arrumei? Ah, tô bonitinho. Já vesti não sei o quê. E botei meu cabelinho de frente, tô bonitinho. De lado, tô bonitinho.” Esses versos, mais gritados do que cantados na música, foram responsáveis por dar tração, mais uma vez, na escalada da banda nas paradas de sucesso da música atual: as plataformas digitais (como Spotify) e as redes sociais (no Instagram Reels e TikTok).

To Bem, a música, embala vídeos de anônimos, de gatinhos e de famosos, também, como Flávia Alessandra, Fabiana Justus, Eliana, Bruno Gagliasso e Rafa Kalimann. Na sexta-feira, 1º de junho, a música chegou à 24ª posição na parada diária de músicas virais no Spotify global, um feito enorme para o trabalho lançado duas semanas antes no segundo álbum do grupo, Ontem Eu Tinha Certeza (Hoje Eu Tenho Mais).

O fato é que poucas pessoas acreditavam na possibilidade do Jovem Dionísio emplacar uma segunda música nas paradas depois do sucesso retumbante de Acorda Pedrinho, lançada em 2022, no primeiro disco dos rapazes.

“Conversamos sobre isso”, diz Bernardo Pasquali, vocalista e compositor do grupo, a respeito da pressão por repetir o sucesso do primeiro álbum. Havia um receio, é claro, diante das comparações. “Mas por sorte vivemos em uma época em que podemos pesquisar e entender onde as outras bandas que fizeram um sucesso só erraram”, avalia.

“A única responsabilidade que temos com a nossa carreira é a de fazer música e criar a nossa arte de forma que a gente possa gostar. Para além disso, não temos qualquer controle”, reflete Pasquali. “Não temos como saber se algum dia criaremos uma música maior do que Acorda Pedrinho. Talvez a gente nunca tenha, sabe? Talvez Acorda Pedrinho seja a nossa maior música até o fim das nossas vidas e, cara, está tudo bem. A nossa função aqui não é fazer uma música maior do que a outra”, completa a voz da banda curitibana.

O que é fazer sucesso nos anos 2020?

Métricas de popularidade, afinal, são injustas. Talvez a maior música de Los Hermanos, por exemplo, seja Anna Júlia. Em termos de alcance, na época em que foi lançada, sim, mas está longe de ser a melhor música do quarteto carioca.

O mesmo se dá com Jovem Dionísio e Acorda Pedrinho: a música sobre um amigo do bar que eles frequentavam não representava o máximo do potencial dos rapazes – das músicas mais sérias, como a dilacerante Pontos de Exclamação e Amigos Até Certa Instância, lançadas ainda antes do primeiro álbum, à contemplativa Cê Me Viu Ontem e à agridoce Não Foi Por Mal, ambas presentes no trabalho de estreia.

Ontem Eu Tinha Certeza (Hoje Eu Tenho Mais) é um álbum não convencional e não linear de pós-canções – é como se o grupo paranaense revirasse do avesso o conceito de “canção”. Fazem da canção um elástico para a prática de pilates: estica, puxa, retorce. Mastigam harmonias e, quando as cospem de volta, apresentam um misto de música concreta, coros de vozes, bossa nova, batidas eletrônicas, bom humor da Blitz (sim, há algo de Evandro Mesquita em uma das músicas) e desamores, é claro.

Nesta mistura, ainda se juntam Arnaldo Antunes e Paulo Leminski (em um sample de uma poema narrado pelo ex-Titãs em Passeando no Seu Jeito), o Grupo Menos É Mais (em Sinto Muito (Demo)) e a Dupla 02 (em Nem F*dendo).

Em vez de ser ainda mais pop e seguir a fórmula que funcionou no primeiro álbum, o Jovem Dionísio escolheu caminhos alternativos. Mesmo assim, parte da dançabilidade e o humor são inerentes. A ideia de criar narrativas em poucos versos, também. Cada uma das músicas do álbum é um universo em si, com texturas e personagens diferentes.

“Não nos preocupamos em conectar essas músicas. A nossa missão era singular em cada canção”, explica Pasquali. Dois anos de uma turnê intensa também expandiu a ideia do grupo no que criar para funcionar no palco, explica o também integrante Bernardo Hey. “Conseguimos espremer toda essa carga, toda essa cancha de fazer shows, para descobrir o que conseguiríamos mais. Onde mais poderíamos mergulhar.”

Este resultado, de tantas colagens e ideias, foi erguido entre janeiro e dezembro de 2023. Nos intervalos das turnês, a banda embarcava para retiros em cidades como Morretes, localizada a uma hora de carro de Curitiba, para criar as músicas. Também viajaram a São Paulo, quando o processo estava mais avançado, para trabalhar com quatro músicas com o cantor, compositor e produtor Tó Brandileone. Neste meio tempo, também mexiam em cada música em um estúdio próprio.

“Separamos mais tempo para trabalhar em cada uma das músicas”, comenta o baixista Gustavo Karam. “Deu para sentir que mesmo sendo um processo mais lento, desgastante, valeu a pena. Tivemos tempo de descobrir como finalizar cada uma das músicas.” Desta vez, o processo do Jovem Dionísio desbravou qual o momento de parar e deixar a música por finalizada.

O que o sucesso de Acorda Pedrinho fez foi dar ao grupo uma liberdade para experimentar. “A gente meio que perdeu a vergonha”, admite Gustavo. “Nos deu coragem.”

Feito para TikTok?

Ontem Eu Tinha Certeza (Hoje Eu Tenho Mais) é, principalmente, uma continuação destemida que olha em frente. Se o primeiro disco soava como pós-cervejada, com um gostinho amargo de ressaca na boca e memórias confusas, o segundo trabalho encara a vida adulta, pré-30 anos, como um anti-pop-do-retorno-de-saturno: quando as dores de amor machucam, mas nem tanto, ainda é socialmente permitido ser irresponsável (caso seja capaz de acordar cedo no dia seguinte), e rebelde quanto às fórmulas estabelecidas pela geração anterior

“A gente não faz músicas para bombar no TikTok, até porque a gente quase não usa o TikTok”, explica Gustavo, cuja própria presença em redes sociais, aliás, é bastante limitada.

Desde o lançamento de To Bem, contudo, e a música passou a ganhar tração nas paradas, o grupo foi questionado sobre criar faixas especificamente para a linguagem do TikTok, como algo pejorativo. “Ficamos felizes que nossa música seja usada lá porque é mais uma ferramenta”, conclui Gustavo.

“O que eu acho engraçado isso”, diz o vocalista Bernardo Pasquali, sobre a comparação entre as duas músicas virais da carreira, “porque se você for ver, ritmicamente, melodicamente, o registro da voz, a To Bem, não tem absolutamente nada a ver com Acorda Pedrinho.”

E mesmo que você veja semelhanças entre as duas músicas, a banda está em paz com a comparação. “Vi alguém dizendo: ‘Nossa, que saco, essa música é uma espécie de Acorda Pedrinho 2“, conclui Pasquali. “E eu penso que se isso for verdade, é ótimo, porque a gente que fez Acorda Pedrinho. É nossa música. Minha comparação é com Star Wars. Os caras vão lançar o segundo filme e aí aparece alguém que reclama. Ué, você não quer uma continuação na história?”.

Estadão Conteúdo

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