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Literatura

Especialistas forenses concluem que Pablo Neruda morreu envenenado

Há vários anos, especialistas forenses internacionais rejeitaram a causa oficial da morte como caquexia, ou fraqueza

Redação Jornal de Brasília

14/02/2023 19h53

Foto: Reprodução

Especialistas forenses concluíram que o poeta chileno Pablo Neruda (1904-1973) morreu envenenado há quase 50 anos, disse um membro da família do vencedor do Prêmio Nobel na segunda-feira, 13.

A revelação de Rodolfo Reyes, sobrinho de Neruda, é a última virada em um dos grandes debates do Chile pós-golpe. A posição oficial até aqui sustentada é que Neruda morreu de complicações de câncer de próstata, mas o motorista do poeta argumentou por décadas que ele foi envenenado. Não houve ainda confirmação dos comentários de Reyes por especialistas forenses do Canadá, Dinamarca e Chile, que devem divulgar um relatório sobre o caso nesta quarta-feira.

O anúncio público da descoberta do grupo foi adiado duas vezes este ano – primeiro, devido a problemas de conectividade com a internet de um dos especialistas e depois porque um juiz disse que o painel ainda não havia chegado a um consenso.

Há vários anos, especialistas forenses internacionais rejeitaram a causa oficial da morte como caquexia, ou fraqueza e desgaste do corpo devido a uma doença crônica – neste caso, o câncer. Mas eles disseram também que não haviam determinado o que matou Neruda.

Em entrevista à AP, Reyes afirmou que testes forenses feitos em laboratórios dinamarqueses e canadenses indicaram a presença de “uma grande quantidade de cloristridium botulinum, que é incompatível com a vida humana”. Essa poderosa toxina pode causar paralisia no sistema nervoso e morte. Reyes revelou a informação pela primeira vez à agência de notícias espanhola EFE na segunda-feira.

TOXINA

Como advogado no processo judicial pela morte de seu tio, Reyes disse que tem acesso ao laudo forense, realizado depois que o mesmo grupo de especialistas disse em 2017 que havia indícios de uma toxina nos ossos e em um molar do falecido poeta. Os testes de laboratório concluíram que a toxina foi administrada enquanto Neruda ainda estava vivo, argumentou Reyes.

O relatório será divulgado quase 50 anos após a morte do poeta e membro do Partido Comunista e 12 anos após o início da investigação sobre possível envenenamento. À AP, seu motorista Manuel Araya disse, no início deste mês, confiar em que as descobertas forenses apoiariam sua afirmação de que o poeta morreu após receber “uma injeção no estômago” na clínica onde estava hospitalizado. E explicou ter ouvido essa versão de uma enfermeira.

EXUMADO

O corpo de Neruda foi exumado em 2013, mas os testes não mostraram agentes tóxicos ou veneno em seu corpo. Sua família e o motorista exigiram uma investigação mais aprofundada.

Em 2015, o governo do Chile disse que era “altamente provável que um terceiro” fosse o responsável pela morte de Neruda. O poeta foi enterrado novamente, no ano passado, em sua casa favorita com vista para a costa do Pacífico.

Em 2017, uma equipe de cientistas internacionais determinou que Neruda não morreu de câncer ou desnutrição, rejeitando a causa oficial da morte, mas sem apontar o que o matou. “As conclusões são pela invalidade do atestado de óbito quando se trata de caquexia como causa da morte”, disse na época Aurelio Luna, um dos especialistas do painel.

Neruda, um poeta festejado por seus poemas de amor, era amigo do presidente Allende – que preferiu se matar, no palácio presidencial, a se render às tropas do general Pinochet. Traumatizado pelo golpe e pela perseguição e assassinato de seus amigos, planejava ir para o exílio, de onde poderia lutar contra a ditadura. Um dia antes de sua partida, no entanto, ele foi levado de ambulância a uma clínica na capital do Chile, Santiago, onde havia sido tratado de câncer e outras doenças. Morreu oficialmente lá em 23 de setembro de 1973, de causas naturais.

As suspeitas de que a ditadura teve participação na morte permaneceram muito tempo depois de o Chile voltar à democracia em 1990. O então embaixador do México no Chile, Gonzalo Martínez Corbalá, disse à AP em duas ocasiões que viu Neruda um dia antes de sua morte e que devia estar pesando cerca de 100 quilos.

O motorista Araya disse no mês passado à AP que, “se Neruda não tivesse sido deixado sozinho na clínica, eles não o teriam matado”. Ele lembrou que, por ordem de Neruda, no domingo, 23 de setembro, ele e a esposa do poeta, Matilde Urrutia, foram à mansão pegar as malas que seriam levadas para o México no dia seguinte. No meio da tarde, Neruda pediu que voltassem rápido. Ele morreu naquela mesma noite.l AP

Estadão Conteúdo

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