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Estilo de Vida

Dia dos Finados: escrita terapêutica pode ajudar no luto

Redação Jornal de Brasília

02/11/2022 11h36

Lella Malta. Foto: Divulgação

Lella Malta *

A vida se torna uma morte lenta, um padecimento indizível. O lamento perpétuo de alguém que nada deseja, que pouco sente, que quase tudo negligencia. Assim descrevi o luto de um dos meus personagens, no romance “Qual é o nome da vez?”.

Apresentar uma perda tão significativa sob a lente masculina, foi uma das experiências mais lancinantes do meu processo de escrita. Vivi, de mãos dadas com o meu protagonista, cada resposta emocional ao fato de ver sua esposa inexistir prematuramente.

Se o pesar da ficção grita tamanho desalento, ainda não pode ser comparado ao luto da vida real: um processo natural que ocorre em reação a um rompimento brusco de vínculo e que a grande maioria dos indivíduos terá que lidar mais cedo ou mais tarde no decorrer da vida.

Luto que é a morte de quem se foi, mas também de uma versão – agora inalcançável – da pessoa que ainda vive. Morte de expectativas, de sonhos, de promessas. Sem tempo de duração definido, o processo pode se estender por anos e levar ao adoecimento físico e mental, caso não haja conscientização sobre a importância do acolhimento, da desconstrução da interdição do luto e de sua naturalização.

Esquivar-se da tristeza como mecanismo de fuga não liberta, não salva, não cura.
Durante os tempos pandêmicos, o processo se tornou ainda mais complexo com força de fenômeno coletivo, afinal, a morte se fez próxima e escancarada em uma emergência sanitária global. Ainda choramos por esses mortos. Ainda estamos aprendendo a lidar com tantas perdas.

A escrita terapêutica, cada vez mais utilizada nesse processo, pode auxiliar o enlutado a vivenciar sua dor emocional e adaptar-se gradualmente a um novo contexto de vida de ausência do ente querido. Não substitui o acompanhamento psicoterapêutico ou psiquiátrico, mas é mais uma ferramenta a ser inserida no cotidiano do indivíduo a fim de acalentar o sofrimento diante da perda e equilibrar seu estado emocional.

Um dos exercícios mais recomendados para o luto é o da escrita de uma carta para alguém que já se foi, registrando em um papel suas memórias, agradecimentos, desculpas e qualquer palavra que deseja dizer hoje para a pessoa amada que já não está presente.

As possibilidades das palavras se tornarem ponte para a (re)organização de sentimentos nessa fase tão dolorosa são infinitas. A escrita ressignifica experiências, alcança memórias, é canal de escuta atenta das dores que carregamos no peito.

*Lella Malta é cientista social, escritora, preparadora literária, educadora e terapeuta de escrita expressiva.

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