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Brasília

Uma em cada 11 armas de fogo apreendidas na capital federal é artesanal

Arquivo Geral

27/08/2018 7h00

PMDF/Divulgação

Raphaella Sconetto
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Até onde vai a criatividade dos bandidos na hora de fabricar um revólver? Uma em cada 11 armas apreendidas no Distrito Federal é caseira. A produção artesanal é utilizada, principalmente, em roubos e furtos por criminosos que não conseguem ter acesso às armas industriais e que praticam os crimes a uma curta distância da vítima. Nesta reportagem, o JBr. mostra que apesar de a confecção de uma arma caseira ser simples, pode ser fatal. “Não tem a mesma efetividade de uma arma industrial, mas a letalidade pode ser a mesma se for bem confeccionada”, diz o major Genilson Duarte, comandante do 14º Batalhão da PM (Planaltina).

De acordo com a Polícia Militar, ao menos 1.213 armas de fogo foram apreendidas na capital este ano. Destas, 110 são consideradas artesanais. O Batalhão de Rondas Ostensivas Táticas Metropolitanas (Rotam) é o campeão de apreensões de armas de fogo. O segundo é o de Planaltina e o terceiro, o 8º Batalhão, em Ceilândia. Quando se trata de região administrativa, Ceilândia é a que mais tem apreensões de armas de fogo – já que existem dois batalhões na área. Só neste ano foram ao menos 116 retiradas das ruas da região administrativa.

O Batalhão de Planaltina apreendeu cerca de 20 armas caseiras em todo o ano. Segundo o major Genilson Duarte, as armas artesanais são de fabricação simples. “Tendo qualquer estrutura, seja um cano simples de PVC ou metálico, que faça o direcionamento da munição, já é uma arma. Não precisa de todo aquele desenho de punhadura, cano, tambor para girar. Nada disso. É muito simples”. “O equipamento só tem que direcionar o disparo, tem que ter uma estrutura mínima para não estourar na mão. Mas é só repercutir, direcionar e pronto”, completa.

Apesar da simplicidade, a arma artesanal fere e mata como uma industrial. “O que determina é a munição e quantidade de pólvora”, alerta.

No quesito criatividade, a arma caseira mais diferente apreendida pelo batalhão de Planaltina foi uma submetralhadora. “O que chamou a atenção foi a qualidade, é muito difícil de se encontrar. O homem que a fez é da região da Estância, mas ele já está preso”.

Para a confecção, Duarte reconhece que há casos em que os criminosos contam com a ajuda de militares. “Temos nosso serviço militar obrigatório, no qual se aprende o básico. Alguns policiais que foram expulsos da corporação repassam o conhecimento mínimo ou até mesmo fabricam a arma. O marginal, teoricamente, não sabe nada. Ele sabe apertar o gatilho com muita coragem e frieza”.

Major Genilson Duarte do 14º BPM de Sobradinho entende que mais importante que o combate as armas caseiras é o combate a munição, sem essa a arma não funciona. Foto: Myke Sena/Jornal de Brasília.

Perfil

Para traçar um perfil de quem usa a arma caseira, é possível dizer que são criminosos entre 15 e 25 anos que utilizam o armamento para crimes à queima-roupa. “Não são pessoas que têm grandes crimes no currículo. (As armas) São usadas para assaltos simples, como a pedestres, pequenos comércios ou em ônibus. A arma caseira depende de um contato mais próximo para ter uma efetividade. Em um assalto, o contato é mínimo”, afirma o major.

No entanto, “as ocorrências não especificam qual arma de fogo foi utilizada. Se especificassem, poderíamos fazer uma repreensão mais focada”, pondera o comandante.

A falta de segurança contribui para o êxito nos crimes com armas artesanais. “A insegurança faz com que qualquer objeto se passe por arma. Por isso, temos poucos casos de disparos de arma de fogo caseira ou relatos de alguém que tenha sofrido de fato com um disparo. Ou seja, temos poucas consequências da arma caseira”, observa Duarte.

Ainda conforme o major da Polícia Militar, há ainda a preocupação com as divisas de Planaltina com Goiás e Minas Gerais. “A criminalidade de lá reflete aqui. A entrada é muito permeável. Criminosos saem de lá para assaltar aqui, matar aqui. Por isso, acredito que somos um dos batalhões com mais apreensões”.

Letalidade indicará agravante

Secretário-geral adjunto da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-DF), Cleber Lopes, explica que a arma artesanal é considerada agravante a depender da sua letalidade. “O critério é a capacidade em causar danos à vida ou à integridade de uma pessoa. Se tiver potencialidade lesiva, pode agravar a pena. Se não tiver, não agrava”, explica. “Cada caso é avaliado após as investigações”, completa.

Já o presidente do Sindicato dos Delegados da Polícia Civil (Sindepo), Rafael Sampaio, pondera dizendo que não há diferenças no tratamento nos crimes que são realizados com arma de fogo industrial ou caseira. Além disso, completa, o formato da artesanal também pode ser visto como agravante. “O que pode determinar ou não o agravamento da pena são as características de ocultação da arma. Tivemos um caso em que a arma simulava uma caneta. A essas chamamos dissimuladas”, destaca.

Sampaio afirma que apreensões também são comuns na Polícia Civil. “O que nos leva a conclusão de que o criminoso não tem dificuldade alguma para obter uma arma”, admite.
Ainda segundo o presidente do Sindepo, quem for pego com uma arma caseira é autuado pelo crime de porte e posse ilegal de arma de fogo irrestrita. A pena varia de 3 a 6 anos e é inafiançável.

Mais riscos

Por sua facilidade e falta de engenharia, as armas artesanais podem causar mais danos, tanto para quem vai utilizá-la como para quem está a sua volta. É o que afirma o consultor de segurança Leonardo Sant’Anna. “A arma depende da munição. Se utilizar, por exemplo, uma arma com carga de pólvora maior em um cano que não aguenta a pressão, no momento que a munição for acionada, oferecerá risco”, aponta. “Pode provocar uma explosão e ter estilhaços do cano, que podem atingir quem estiver em volta”, completa.

Ainda segundo o consultor, as armas artesanais podem representar um problema às autoridades. “É algo que não conseguem controlar. Sempre vai depender da criatividade de quem as constrói, da necessidade do bandido em ter algo para usar nos crimes”, opina.

Para Sant’Anna, há ainda mais problemas quando o assunto é analisado mais profundamente. “Faz parte de um fenômeno que permeia os grupos criminosos: eles estão sempre alugando armas para cometer crimes. Quando as polícias apreendem o armamento, eles ficam sem opção e partem para a (arma) caseira”, finaliza.


Ponto de Vista

O comandante do 14º Batalhão da PM, major Genilson Duarte, admite que o controle na fabricação de armas caseiras é difícil. Por isso, uma das frentes de combate poderia ser o impedimento do comércio de munições. “O armamento não é farto, principalmente por conta do Estatuto do Desarmamento. A grande dificuldade está em saber quem fornece as munições”, indica. “Mesmo em uma arma caseira, as munições são industriais, porque produzi-las é mais complicado. Isso nos mostra que o problema não são as armas, mas as munições. Se atacarmos as munições, a arma passa a não ter valor algum”, completa.

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