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Brasília

Sentimentos são contraditórios em torno da covid-19

Retorno das creches é exemplo de como as sensações que envolvem a pandemia são diversas. Enquanto algumas famílias mostram-se aliviadas, outras preocupam-se

Pedro Marra

23/09/2020 7h02

Volta das creches é alívio para uns e preocupação para outros

Pais vivem dilema com a autorização do GDF para reabertura das escolas e a segurança dos filhos

Com a autorização do Governo do do Distrito Federal (GDF) para a reabertura de creches em Brasília, responsáveis pelas crianças e especialistas seguem com alerta ligado às regras de segurança sanitária contra o novo coronavírus. O decreto, publicado ontem pelo GDF, possibilita “a oferta da educação infantil, creche, para crianças de 2 e 3 anos de idade, e pré-escola, para crianças de 4 e 5 anos de idade”, diz o documento.

Também “fica autorizado o funcionamento das áreas de recreação e lojas como brinquedotecas, de jogos eletrônicos e congêneres, desde que obedeçam aos protocolos exigidos para parques de diversão e parques temáticos”, descreve o decreto.

O governo estipulou algumas medidas de segurança para esses espaços, como: disponibilizar dispensador com álcool 70% para higienização das mãos, na entrada e saída dos brinquedos; organização dos espaços físicos e assentos, garantindo a distância mínima entre participantes e grupos de participantes, limitados a 6 pessoas; limpar todos os ambientes do parque, a cada duas horas, especialmente banheiros, guarda-volumes, balcões, objetos, escadas, superfícies e utensílios de trabalho; Garantir que, para cada 50 indivíduos presentes no local, haja, no mínimo, 1 profissional capacitado e qualificado para instruir, fiscalizar e fazer cumprir as regras descritas no presente protocolo, por exemplo.

Para a servidora pública Karla Marques, 27 anos, ainda é um risco levar o filho Murilo, 3 anos, para a creche. Segundo ela, não leva o garoto para a instituição onde ele é cadastrado, em Ceilândia, desde 19 de março, quando o GDF suspendeu o funcionamento desses espaços. “É mais por não me sentir segura, pois, mesmo em queda, vemos que o vírus ainda está circulando muito em nosso meio. Para mim, a escola poderá oferecer um risco de contágio maior, fazendo com que os números voltem a crescer. Além disso, não tenho segurança que a instituição conseguirá manter os cuidados necessários com tantas crianças pequenas dentro de uma creche”, comenta.

Ela, que tem diabetes, se diz preocupada porque os pais dela também são do grupo de risco da covid-19: os dois são hipertensos. “Como moramos no mesmo lote dos meus pais, o Murilo tem total convivência e acesso amplo a casa dos avós. E estou trabalhando em home office. O meu esposo trabalha presencialmente todos os dias. Então, os cuidados do Murilo durante o dia ficam exclusivamente sob minha responsabilidade”, conta a mãe, que é moradora de Ceilândia.

Além disso, Karla leva em consideração os cuidados que as crianças precisam tomar para se manterem seguras ao vírus. “Não é fácil você conviver e cuidar de crianças de três anos sem ter contato. E também existe a dificuldade de contê-las, por exemplo, no uso de máscara ou até mesmo no contato com os outros coleguinhas. Tem um que vai querer usar os pertences dos outros, brinquedos, máscara ou um lápis. Por isso que ele está tendo atividades remotas. Tem vídeos e atividades por vídeo com a professora”, afirma.

Sem ter com quem deixar

Mãe de Maria Júlia, 4 anos, Sandra Miranda, 36 anos, vende lanches nas ruas da Estrutural de 7h às 18h, o que a impede de dar total atenção à menina. “Estou com a corda no pescoço, porque tenho uma filha e dependo da creche. Dou total apoio porque eu tenho que trabalhar, sou mãe solteira e não tenho com quem deixar a minha filha. Estou desesperada. Preciso muito que a creche volte, sou autônoma e trabalho na rua. A creche é uma das melhores coisas na minha vida aqui na Estrutural”, relata Sandra.

Diante desse dilema, ela diz que costuma orientar a filha sobre os cuidados de higiene na prevenção ao novo coronavírus. “Converso com ela sempre sobre higienização das mãos, e não ficar abraçando os coleguinhas porque agora não pode”, diz.

Pais serão orientados sobre medidas

Pensando nessa preocupação das mães Karla e Sandra, a pedagoga da Creche Alecrim, Marcelia Deveza, destaca a importância de orientar os pais quanto à esses cuidados de saúde. “Temos o grupo de pais, onde fazemos reunião com eles. Estamos orientando em relação à covid-19, sobre os cuidados de manter distanciamento, usar máscaras, álcool em gel, ir um aluno por vez ao banheiro, fazer a higienização das mãos na entrada e saída da creche, além de limpar também os materiais escolares”, orienta.

Há 11 anos à frente da Creche Alecrim, Maria de Jesus Sousa, reconhece que será um desafio para ela coordenar os cuidados sanitários com as crianças e profissionais da unidade. “Como as nossas crianças são filhas de mães solteiras, sei que vai ser difícil. A gente está vendo a possibilidade de entrar em acordo com as normas de segurança. Estamos tentando nos reinventar para abrigar as crianças novamente. A gente está lidando com algo que a gente não conhece. Estamos falando com a pedagoga para ver como planejar um retorno menos assustador para as crianças”, declara.

Ela, que é ex-catadora de lixo na região, conta que a creche passa por obras, mas que pretende reabrir o espaço na próxima semana. “Devido ao local, vamos ter que voltar com seis pessoas, e no máximo 20 crianças. A questão da adequação de espaço é reduzir o número de pessoas, redobrar a higienização. Os pais até ligaram pedindo para voltarmos. Mas a gente vai ter que reduzir os horários, porque abríamos às 7h e fechávamos às 22h30. Vamos fechar às 16h a partir de agora. Além disso, vamos contratar equipe de dedetização”, informa.

De acordo com a professora de infectologia da UnB, Valéria Paes, é fundamental que tenha um sistema de vigilância epidemiológico. “Desde que seja extremamente eficiente para que não ocorra qualquer tipo de transmissão do vírus em um ambiente como esse. A gente entende a necessidade da reabertura, do funcionamento, ainda mais com os pais voltando a trabalhar, e as crianças precisando de assistência”, diz a especialista.

Saiba Mais

“Como é um risco que se está assumindo, tem que ser um risco calculado. Vai ser uma situação em que vamos ter que nos reinventar, mas precisa-se de muita orientação e paciência”, reforça Valéria Paes.

Valéria pontua que os pais têm papel mais importante ainda nesse aspecto de educação das crianças sobre os cuidados com o novo coronavírus.

“Os pais têm que colaborar com as medidas de higienização, para seguir as normas locais, horários, enfim. Uma colaboração importante também é ter a ciência de que uma criança que venha a apresentar sintomas, não deva ir à creche. Essa medida se torna ainda mais importante, fazer os exames, e não mandar a criança à creche se tiver sintomas. Outra preocupação são as brinquedotecas, porque as crianças gostam de brincar com objetos. Então as creches vão ter que limpar bem o ambiente”, aconselha.

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